Folha de S. Paulo


Políticos aderem à moda sem gravata para se aproximar do povo

Quando Michel Temer (PMDB), Renan Calheiros (PMDB) e Rodrigo Maia (DEM) convocaram uma coletiva, num domingo do ano passado, para anunciar que propostas de anistia ao caixa 2 de campanhas políticas não vingariam, eles decidiram que era hora de tirar a corda do pescoço.

A promessa de barrar a anistia ainda não se confirmou, já que o debate ronda os corredores de Brasília, mas os presidentes da República, do Senado e da Câmara acabaram vingando no meio político a nova moda de libertar o pescoço das gravatas.

Garoto-propaganda dessa tendência, João Doria (PSDB) mandou, assim que pisou na Prefeitura de São Paulo, que todos seus secretários deixassem o acessório em casa. A cartilha do novo prefeito, com seu gosto particular por costumes bem cortados, ecoou para além das paredes do Matarazzo.

Chegou ao Paraná, com o governador Beto Richa (PSDB) e o prefeito de Curitiba, Rafael Greca, (PMN) na dianteira do estilo. Também foi parar no Rio Grande do Sul, que viu outro tucano neófito, o prefeito de Porto Alegre Nelson Marchezan Jr., aderindo ao visual.

O goiano Jovair Arantes (PTB) e o correligionário gaúcho Maurício Dziedrick até já combinaram, em um encontro, o tom claro de suas blusas azuis devidamente abertas no pescoço, como manda o "new look" de Brasília.

ENROLADOS

A questão sobre o banimento da gravata do pescoço dos políticos divide opiniões de parlamentares, consultores de moda e estilistas.

"Tomara que essa tendência pegue. Não gosto de gravatas", confessa o presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, o deputado Cauê Macris (PSDB). "É uma questão de usos e costumes. O tempo vai moldando esses códigos, que começam a ficar ultrapassados. Há dez anos [os políticos] usavam suspensórios, hoje não."

Suspensórios como os do deputado federal Heráclito Fortes (PSB-PI), que ainda os usa e, muito antes do visual desenrolado virar moda, já transitava nos bastidores só de calça e camisa social.

Macris, que recentemente fez "questão de visitar Doria sem a gravata, para prestigiar o prefeito", afirma que apenas seguiria o regimento interno se visse um colega sem o acessório. "Mandaria sair e colocar a gravata. É regra".

A qual não cogita mudar, aliás. "Na Assembleia há pessoas mais conservadoras, [a sugestão de mudança] geraria muita polêmica."

Uma polêmica que Alberto Hiar, dono da grife Cavalera, ex-vereador e ex-deputado, comprou no final dos anos 1990, quando iniciou a carreira política. As gravatas com desenhos dos Três Patetas, do Pernalonga e da língua solta dos Rolling Stones ornavam seus trajes usados com tênis.

"Era uma forma de dizer que eu era diferente e não concordava com a maioria das opiniões deles", explica o empresário, que, apesar do passado "rebelde", diz ser a favor das gravatas por questões estéticas e de respeito ao poder público.

"Os políticos são muito xingados. O uso da gravata, apesar de não mostrar nada do caráter de alguém, transmite a importância do que eles representam", diz.

APROXIMAÇÃO

Do ponto de vista semiótico, a gravata é um signo de poder. Sua origem remonta à Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), quando o exército croata chamou a atenção da corte do rei fashionista Luís 14 devido a um laço enrolado elegantemente no pescoço.

Os franceses adaptaram a peça do regimento croata """cravate", em francês"", que logo caiu nas graças de homens e mulheres por ajudar a limpar o suor. Elas usaram o lenço até o final do século 19 e, depois da década de 1930, o acessório voltou reeditado no guarda-roupa dos poderosos.

"Mas a partir do momento em que muitas pessoas passaram a usar a gravata, seu significado de poder se dissolveu. Quem tem poder quer se diferenciar, ao passo que, para os políticos, eles precisam estar mais próximos do povo. Abolir [o acessório] também é um reforço na imagem pública", explica o estilista e doutor em semiótica Mario Queiroz.

A consultora de imagem e professora do Centro Universitário Belas Artes, Jô Souza, faz coro: "Para um político, tirar a gravata transmite uma aproximação afetiva com o povo. Ele passa a compactuar com os interesses das pessoas não apenas no discurso, mas também na aparência".

O estilista Ricardo Almeida, que já vendeu roupas para todos os armários de Brasília, do ex-presidente Lula (PT) ao senador Aécio Neves (PSDB), vai além.

"Quem sabe uma imagem simplificada não fará o eleitor achar que você vai resolver o problema dele?."


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