Folha de S. Paulo


Viagem à China em 2009 aproximou Sérgio Cabral e Eike Batista

Divulgação - 5.dez.2011/Governo do RJ
Sergio Cabral e Adriana Ancelmo em lancamento de livro do empresario Eike Batista, em 2011
Sergio Cabral e Adriana Ancelmo em lancamento de livro do empresario Eike Batista, em 2011

Não havia passado sequer dois dias do último encontro e o empresário Eike Batista decidiu externar a falta que o ex-governador do Rio Sérgio Cabral lhe fazia.

Em 4 de julho de 2009, em conversa com Paulo Fernando Magalhães Pinto, apontado como "testa de ferro" de Cabral, o empresário afirmou que via o peemedebista como "verdadeiro amigo".

"Essa viagem os aproximou muito e ele já está [com] saudades", diz e-mail de Paulo Fernando a Cabral, relatando a conversa com Eike.

"O Eike me pede para te dizer que, independente da parceria de vocês profissional, hoje ele te vê como um verdadeiro amigo", dizia o e-mail.

O último encontro dos dois havia sido no dia 2 de julho, na China. No dia 19, a amizade seria selada com mais um gesto: o empréstimo pela primeira vez do jato do empresário ao governador.

Cabral foi à China assinar contratos de fornecimento de composições chinesas para o sistema ferroviário do Estado. Além disso, o ex-governador buscava também "atrair investimentos para o Estado do Rio de Janeiro, notadamente para o empreendimento do Porto do Açu", conforme relata o posto de Pequim do Itamaraty em documento obtido pela Folha via Lei de Acesso à Informação.

Eike integrara a missão oficial do peemedebista à China, junto com secretários, representantes de associações de classe como Firjan e Associação Comercial do Rio e membros das concessionárias de Metrô e Supervia –as duas foram assinar contratos para seus sistemas.

De Pequim, Cabral seguiu para Cingapura, enquanto Eike voltou para o Brasil. Ainda do outro lado do mundo, o peemedebista respondeu à declaração do novo amigo.

"E ele é, acima de tudo, bom ser humano!!", disse.

No dia 30 de junho, Cabral visitou com Eike o Banco de Desenvolvimento da China (CDB), onde encontrou o então diretor-geral adjunto para cooperação internacional, Tian Yunhai, e sua equipe.

"O representante do CDB confirmou na ocasião que o banco abrirá escritório no Rio de Janeiro, o que foi comemorado pela delegação. Houve plena concordância com o potencial para maior envolvimento do CDB nos projetos em gestão no Estado do Rio, inclusive no porto de Açu", descreve o despacho de Pequim, assinado pelo embaixador Clodoaldo Hugueney.

No mesmo dia, o então governador encontrou com representantes do fundo soberano chinês, "onde sua equipe fez exposição sobre o potencial da economia fluminense e o porto do Açu". "Note-se que a CIC já possui participação na OGX, empresa da área de óleo e gás do grupo EBX", diz o documento.

A última reunião do peemedebista na cidade foi com representantes da empresa JAC, que à época estava interessada em investir no Brasil.

"Houve grande interesse pela proposta de instalação no Estado do Rio de Janeiro, talvez no porto de Açu", descreveu o embaixador.

Eike e Cabral agora são réus em ação penal, ambos presos em Bangu. O Ministério Público Federal acusa o empresário de ter pago propina ao ex-governador de US$ 16,5 milhões e R$ 1 mi.

A procuradoria cita os interesses do empresário em licenças, desapropriações e outros atos do governo para o porto do Açu para configurar o caso como corrupção.

Quinze dias depois da declaração de amizade, ela mais uma vez se transformou em gestos. Eike emprestaria pela primeira vez o seu jato Legacy para que o ex-governador e sua mulher retornassem de uma viagem a lazer dos EUA. O gesto se repetiu por mais 12 vezes. "Sou livre para selecionar minhas amizades", declarou Eike quando o empréstimo foi descoberto.

A Procuradoria afirma não ter identificado o ato específico praticado por Cabral para receber a propina. Mas diz que isso não é necessário para que o repasse de dinheiro seja configurado corrupção.

"Eike Batista tinha diversos interesses no Estado do Rio. Diversos atos dependiam da atuação do governo", disse o procurador Leonardo Freitas. Os empréstimos do jato não foram incluídos na denúncia como propina.


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