Folha de S. Paulo


Suíça sequestra US$ 100 milhões das contas da Odebrecht

Pedro Ladeira/Folhapress
O ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa contou que recebeu US$ 23 milhões da Odebrecht na Suíça
O ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa contou que recebeu US$ 23 mi da Odebrecht na Suíça

A Suíça sempre teve a fama de lavar mais branco o dinheiro sujo da corrupção. Agora o país quer trocar o estigma de complacente com criminosos com o de implacável com desvios. O Ministério Público de lá sequestrou cerca de US$ 100 milhões (R$ 327 milhões) que a Odebrecht tinha em contas secretas usadas para pagar propina no Brasil e em 11 países.

O valor será usado para abater a multa de cerca de R$ 700 milhões que a empreiteira e a Braskem, o braço petroquímico do grupo, se comprometeram a pagar no país europeu para encerrar cerca de 60 processos criminais.

A Odebrecht movimentou US$ 212 milhões na Suíça por meio de empresas de fachada entre 2008 e 2014, segundo documentos suíços.

Os US$ 100 milhões que ficarão na Suíça superam os US$ 80 milhões bloqueados no escândalo da Fifa.

A Odebrecht reconheceu para as autoridades suíças que lavou dinheiro e não tomou as medidas para evitar que recursos que estavam no sistema bancário de lá fossem usados para pagar propina.

A legislação daquele país obriga toda empresa que abre conta a se comprometer que tomará as medidas para evitar o pagamento de suborno.

O acordo com as autoridades suíças foi assinado na quarta (21), mesmo dia em que o grupo selou negociação com autoridades dos EUA.

O acerto com a Suíça fala em compensação de fundos, mas não cita o valor de cerca de US$ 100 milhões, apurado pela Folha com pessoas que participaram da negociação.

O acordo da Odebrecht e da Braskem com Brasil, EUA e Suíça é considerado o maior do mundo, ao estipular uma multa de R$ 6,9 bilhões a ser paga em 23 anos. No final desse período, com a inclusão de juros, o valor deve chegar a R$ 11,4 bilhões (ou US$ 3,5 bilhões).

Até então o maior acerto desse tipo havia sido selado pela Siemens com autoridades americanas e europeias, com multa de US$ 1,6 bilhão.

Enquanto a Odebrecht conseguiu um prazo de 23 anos para pagar a indenização ao governo dos EUA, para evitar que o grupo quebre, a Suíça receberá praticamente a metade da multa em uma parcela. Os valores estavam bloqueados pelos procuradores suíços desde 2014, quando as autoridades de lá passaram a cooperar com a Lava Jato.

DERROCADA

A Suíça foi para a Odebrecht o que a batalha de Waterloo significou para Napoleão Bonaparte (1769-1821): o maior marco na derrocada.

A estratégia da empreiteira de negar o pagamento de suborno e acusar a Lava Jato de cometer abusos e acusações infundadas foi minada com a delação do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, em meados de 2014. Ele contou que recebera US$ 23 milhões da Odebrecht na Suíça para beneficiar a empresa em contratos com a Petrobras e Braskem. Costa foi o primeiro delator da Lava Jato.

Com a vinda da documentação suíça ao Brasil, por meio de um acordo de cooperação internacional, os procuradores da Lava Jato descobriram que a Odebrecht mantinha uma rede de empresas fantasmas em paraísos fiscais que usavam contas na Suíça para pagar propina a políticos e funcionários públicos.

Com o acúmulo de provas, Odebrecht e Braskem começaram em março deste ano a negociar acordos de delação, concluídos em 1º de dezembro.

A teia de contas e a cascata de delações mostraram que a Odebrecht usava a Suíça para pagar suborno a políticos e outros diretores da Petrobras, como Renato Duque, Jorge Zelada e o ex-gerente Pedro Barusco.

Um dos políticos acusados de receber recursos na Suíça é o chanceler José Serra (PSDB-SP), o que ele nega. Segundo delatores, a Odebrecht depositou R$ 23 milhões em contas de amigos dele na Suíça, entre eles o ex-banqueiro Ronaldo Cesar Coelho, que chegou a atuar como tesoureiro de campanhas do PSDB.

Mesmo para os padrões suíços, a Lava Jato é considerada o maior escândalo já ocorrido em bancos de lá.

Autoridades bloquearam US$ 800 milhões ligados à apuração brasileira. É um recorde mesmo para os padrões de ditadores, como Ferdinando Marcos, das Filipinas (US$ 650 milhões em valores atuais) e Sani Abacha da Nigéria (US$ 620 milhões).

OUTRO LADO

A Odebrecht não quis comentar a decisão suíça.

Em comunicado enviado na última quarta (21), quando assinou os acordos com os EUA e Suíça, a empresa afirmou: "A Odebrecht se arrepende profundamente da sua participação nas condutas que levaram a este acordo e pede desculpas por violar os seus próprios princípios de honestidade e ética".

A empresa disse que assume "o compromisso com práticas empresariais éticas e de promoção da transparência em todas as suas ações".

No mesmo dia, a Braskem afirmou que "reconhece a sua responsabilidade pelos atos de seus ex-integrantes e agentes e lamenta quaisquer condutas passadas".


Endereço da página:

Links no texto: