Folha de S. Paulo


Militar foi infiltrado em ato por causa de revezamento da tocha, diz Exército

Marlene Bergamo/Folhapress
Gabriel Cunha Risaffi abraça a mãe, Rosana Cunha, após ser solto; prisões foram considerados ilegais
Manifestantes são soltos após terem sido detidos em ato contra Michel Temer no dia 4 de setembro

O Ministério da Defesa e o Exército afirmaram que a infiltração do capitão Willian Pina Botelho em um grupo de manifestantes que terminou detido antes de manifestação contrária ao governo de Michel Temer em 4 de setembro se deu por causa do revezamento da tocha paralímpica, que passou pela avenida Paulista no mesmo dia, na parte da manhã.

"Considerando que o revezamento da tocha paraolímpica estava previsto para ocorrer na avenida Paulista no dia 4 de setembro de 16, mesmo local para onde estavam se dirigindo diversos grupos que planejavam realizar manifestações, buscou-se acompanhar as possíveis ameaças à sua realização", afirma documento assinado pelo general Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva, chefe de gabinete do comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas.

O texto é uma resposta a requerimento protocolado pelo deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) em 13 de setembro. O documento, com nove perguntas, questiona se o Ministério da Defesa confirma a existência da suposta infiltração, que vinha sendo denunciada na mídia por membros do grupo detido.

Na resposta, assinada em 25 de novembro, Paiva confirma a ação, mas diz não se tratar de uma "infiltração", mas de "monitoramento". "Não há que se falar em infiltração, uma vez que o grupo que foi preso, naquela data, não era uma organização criminosa, mas sim de livre adesão. Manifestava-se de maneira ostensiva no ambiente cibernético e nas ruas, podendo receber tantos e quantos fossem os interessados em participar."

O militar negou que tenha havido uma ação conjunta com a Secretaria de Estado da Segurança Pública. Segundo o documento, ainda, a operação se deu de maneira legítima, "dentro dos limites de extensão da atividade de inteligência".

De acordo com ele, não há violação de direitos "ao dar a aparência de aderir à conduta do grupo, nem observar suas ações em tudo aquilo que faz de maneira ostensiva" e não foram implantadas escutas clandestinas ou grampos telefônicos.

Segundo Ivan Valente, as respostas apresentadas pelo general "não são satisfatórias". "Dizem que é um 'monitoramento', mas é muito mais sério do que isso, há relatos desse mesmo militar participando de reuniões da Mídia Ninja e dos movimentos sem-teto", afirmou à Folha nesta quarta-feira (21).

"Eles só 'monitoram' movimentos sociais, quero saber se faziam isso com o MBL [Movimento Brasil Livre, um dos principais organizadores de protestos contra Dilma Rousseff] também."

O deputado afirmou que deve protocolar novo requerimento ou solicitar que o ministro da Defesa, Raul Jungmann, dê esclarecimentos a respeito do tema na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara.

INFILTRADO

O caso do suposto militar infiltrado no grupo de manifestantes que foi detido no dia 4 de setembro, antes de um protesto contra o governo de Michel Temer, ganhou destaque nas redes sociais e chamou a atenção do Gecep (Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial) do Ministério Público de São Paulo, que afirmou que investigará o caso.

O homem, que foi identificado como o capitão Willian Pina Botelho, usaria o nome "Baltazar Nunes" e perfis falsos nas redes sociais para conseguir se misturar a militantes de esquerda.

Segundo os manifestantes, ele teria chegado ao grupo por meio do aplicativo de relacionamentos Tinder. Eles afirmam que, durante a detenção no Centro Cultural São Paulo, na rua Vergueiro, Nunes/Botelho foi levado separadamente pela polícia e nunca chegou ao Deic, como o resto dos presos.

"Aparentemente, essa informação procede", afirmou no dia 13 de setembro, à Folha, a procuradora Luciana Frugiuele, do Gecep.

Foram detidos 18 maiores de idade e apreendidos oito menores. Todos foram liberados no dia seguinte, após o juiz Rodrigo Tellini, do Fórum Criminal da Barra Funda, considerar ilegais as prisões.

Na ocasião, o Exército confirmou à Folha que o capitão Botelho é lotado no Comando Militar do Sudeste, e disse ter aberto procedimento para investigar o caso. A Secretaria do Estado da Segurança Pública, por meio de nota, negou qualquer operação conjunta com as Forças Armadas e disse que todos os presos foram registrados no boletim de ocorrência.


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