Folha de S. Paulo


Cota não basta para diminuir desnível de gênero, diz única eleita no 2º turno

Reprodução/Facebook
A prefeita eleita de Caruaru, Raquel Lyra (PSDB)
A prefeita eleita de Caruaru, Raquel Lyra (PSDB)

Única mulher a vencer a disputa no segundo turno em 2016, a pernambucana Raquel Lyra (PSDB), prefeita eleita de Caruaru, quarto município mais populoso do Estado, afirma que as cotas destinadas às candidaturas femininas nos partidos são insuficientes para equalizar a presença dos gêneros no cenário político nacional.

"Elas não são suficientes para garantir a efetiva participação da mulher, porque os partidos são absolutamente machistas, quem manda neles são homens", diz a tucana. "É muito difícil para as mulheres ocupar espaço dentro dos partidos."

A lei eleitoral prevê que um mínimo de 30% das candidaturas de cada partido seja de mulheres. Nos resultados, o número de eleitas, porém, não chega à metade disso: no Brasil todo, foram 641 prefeitas, ou 11,5% do total.

No segundo turno, apenas seis candidatas disputaram –5% do total– e só Lyra foi eleita, contra 56 homens. Ela derrotou o peemedebista Tony Gel, ex-prefeito do município, com 53% dos votos, contra 46% do adversário.

Nas últimas eleições, em 2012, o quadro havia sido levemente mais equânime, com 659 prefeitas eleitas.

De acordo com ela, que é uma das cinco deputadas estaduais de Pernambuco, essa disparidade se dá porque os partidos apenas cumprem as cotas femininas, sem dar real apoio para as candidatas.

"Quem faz a partilha dos recursos partidários são os homens, quem faz doações eleitorais também", diz. "São várias portas que têm que ser arrombadas para que as mulheres ganhem espaço."

Para além da questão do financiamento, Lyra –que é membro do grupo Mulheres do Brasil, organização de executivas liderada pela dona do Magazine Luiza, Luiza Trajano– afirma que a desigualdade de gêneros na política brasileira ­está relacionada à visão da mulher na sociedade.

"Ainda acham que a gente tem que cuidar das crianças, dos idosos", afirma ela, mãe de João, 6, e Francisco, 4. O primeiro filho, conta, veio na época da pré-campanha da disputa para deputada federal, em 2010.

"Eu lembro que quando descobri a gravidez, alguns amigos homens me ligaram: 'Será que você vai conseguir? Não é melhor adiar os planos para 2014?'", conta ela.

Ex-delegada da Polícia Federal, Lyra é herdeira de uma linhagem política de Pernambuco –tanto seu pai, João Lyra Neto, como seu avô, João Lyra Filho, também ocuparam a Prefeitura de Caruaru, por dois mandatos cada. O tio, Fernando Lyra (1938-2013), foi deputado federal.

Das três filhas de Lyra Neto, ex-governador do Estado –foi vice de Eduardo Campos e assumiu o cargo quando este saiu para disputar a Presidência em 2014–, Raquel foi a única a seguir a carreira familiar. Uma de suas irmãs virou pediatra e a outra analista de sistemas.

"Quando eu era pequena e ia acompanhar o meu pai, sempre diziam: 'mas não vai ter ninguém na política, não? Não tem nenhum, homem, um primo?'", relembra. "Eu acabei fazendo minha carreira como servidora pública e política, mas sempre tem uma interrogação a mais por ser mulher."

DISPUTA INTERNA

Aliada de Campos, em cujo governo trabalhou de 2011 a 2013 como titular da Secretaria da Criança e da Juventude a deputada foi filiada ao PSB, partido pelo qual disputou as eleições de 2010 e 2014 até o início deste ano.

O rompimento se deu, porém, após a sinalização de que a sigla e o governador do Estado, Paulo Câmara, não apoiariam sua candidatura à prefeitura. Após sua ida para o PSDB, o PSB apoiou oficialmente o adversário de Lyra no segundo turno.

Apesar disso, ela afirma que pretende manter diálogo com o governo do Estado.

"A gente precisa em Caruaru de um investimento forte, principalmente na área de segurança pública, e eu não acredito que ele vá se furtar a isso", afirma a prefeita eleita.


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