Folha de S. Paulo


Votação no Senado para cassar Dilma foi fatiada; entenda

O plenário do Senado aprovou o impeachment de Dilma Rousseff (PT) por 61 votos a 20 nesta quarta-feira (31).

Com a decisão, Dilma teve o cargo de presidente da República cassado. Michel Temer (PMDB) deve ser empossado ainda nesta quarta.

A votação no Senado, no entanto, foi "fatiada". Em um segundo momento, os senadores votaram sobre manter ou não a habilitação de Dilma para funções públicas.

Foram 42 votos pela perda do direito de exercer funções públicas, 12 a menos do que seria necessário. Votaram contra 36 senadores e houve 3 abstenções.

Em ambas as votações, era necessário a aprovação de dois terços dos senadores, ou seja 54.

Veja as questões levantadas com a aprovação do impeachment.

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O que o Senado decidiu sobre o futuro de Dilma Rousseff?
Os senadores consideraram Dilma culpada pelo crime de responsabilidade, cassando seu mandato como presidente. No entanto, mantiveram seu direito de exercer funções públicas.

Qual é a polêmica em torno da votação "fatiada?"
A lei de 1950, que trata do processo de impeachment, e a Constituição Federal de 1988 trazem entendimentos diferentes sobre se a cassação e a habilitação para função pública devem ser votadas em conjunto ou separadas (veja abaixo).

Durante o julgamento, o presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski, que presidiu a sessão do impeachment, decidiu acatar um destaque do PT para separar a votação. Segundo Lewandowski, seguindo o regimento do Senado, os partidos tinham o direito de propor destaques e, então, ele resolveu deferir o pedido.

Porém, é possível que a votação fatiada de Dilma ainda seja questionada no STF, que, no caso, então daria a palavra final.

DEM e PSDB chegaram a cogitar questionar o fatiamento no Supremo, mas desistiram.

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O QUE DIZ A CONSTITUIÇÃO

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles
Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.

O QUE DIZ A LEI 1.079 DE 1950

Art. 33. No caso de condenação, o Senado por iniciativa do presidente fixará o prazo de inabilitação do condenado para o exercício de qualquer função pública; e no caso de haver crime comum deliberará ainda sobre se o Presidente o deverá submeter à justiça ordinária, independentemente da ação de qualquer interessado.

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Como a questão foi tratada no impeachment de Fernando Collor em 1992?
Como Collor renunciou ao cargo de presidente antes do julgamento, coube ao Senado decidir apenas por suspender seus direitos políticos ou não.

Na época, o Supremo entendeu que as duas penas (cassação e habilitação) deveriam ser tratadas de forma conjunta.

Collor acabou inabilitado para exercer funções públicas por oito anos.

Como esse "fatiamento" pode influenciar daqui para frente?
A votação separada pode abrir precedentes para votações semelhantes. Processos de cassação de prefeitos pelas Câmaras Municipais, por exemplo, podem adotar duas votações: uma sobre perda de mandato e outra sobre perda de direitos políticos.

O mesmo pode acontecer em processos de cassação de parlamentares, como o do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que deve ser votado a partir do mês que vem.

Dilma poderá ser candidata em 2018 e em outras eleições futuras?
O Senado manteve a habilitação de Dilma para ocupar funções públicas, o que engloba cargos de nomeação ou eletivos.

A possibilidade de Dilma concorrer em eleições, no entanto, deve ser alvo de discussão judicial caso ela venha de fato a ser candidata.

Seu registro de candidatura pode sofrer um pedido de impugnação, e a Justiça Eleitoral determinará se ela está apta a concorrer ou não.

Como fica a aplicação da Lei da Ficha Limpa?
Apesar de condenada por crime de responsabilidade, há o entendimento de que a Lei da Ficha Limpa não impede Dilma de disputar eleições porque não se refere, especificamente, ao cargo de presidente da República.

No entanto, prefeitos cassados, mesmo que mantenham sua habilitação para função pública, seriam barrados em eleições pela Ficha Limpa.

O mesmo aconteceria com o deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), caso seja cassado pela Câmara.

O que acontece com o processo de cassação da chapa Dilma/Temer que tramita no TSE?
O impeachment não influencia o processo de cassação, que está em fase de coleta de provas e depoimento de testemunhas.

Caso o TSE encontre irregularidades na eleição de Dilma e Temer, ele também poderá perder o cargo de presidente.

Por isso, Temer tenta separar sua responsabilização e de Dilma, para tentar escapar caso ela seja cassada pelo TSE.

Além de Dilma, quais outros presidentes do Brasil perderam o cargo?
Contando Dilma, seis presidentes não concluíram seus mandatos: Affonso Pena (morreu) e Washington Luis (deposto), na República Velha, Getúlio Vargas (se matou em 1954), Jânio Quadros (renunciou) e Fernando Collor de Mello (renunciou, mas o processo de impeachment prosseguiu e ele foi condenado por crime de responsabilidade).

Quais benefícios Dilma perde e mantém?
Dilma perde direito ao salário, residência oficial e avião presidencial, mas mantém benefícios dados a ex-presidentes como dois veículos oficiais, segurança pessoal e seis servidores.

Quando Dilma terá que deixar o Palácio da Alvorada?
A mudança dos objetos pessoais do Alvorada para a residência da petista em Porto Alegre será paga pela Presidência da República. A intenção de Dilma é viajar já no final desta semana, mas será solicitado um prazo de 30 dias para fazer o transporte dos bens privados, o que deve ser concedido pelo novo governo.

Michel Temer pode sofrer impeachment?
Como presidente, Temer também pode sofrer um processo de impeachment.

Para isso, é preciso que um pedido seja aceito pelo presidente da Câmara dos Deputados e avance todas as etapas de tramitação, como aconteceu com Dilma.


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