Folha de S. Paulo


Em CPI da Merenda, ex-membros da Coaf acusam investigadores de coação

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14.04.2016 - Mafia da merenda - Carlos Luciano Lopes, alvo da operacao Alba Branca, aparece em foto com dinheiro que teria recebido do esquema de fraude. Foto divulgacao ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
O ex-vendedor da Coaf Carlos Luciano Lopes, que depôs nesta terça (16) na CPI da Merenda

Dois ex-integrantes da cooperativa suspeita de fraudar a merenda escolar em São Paulo prestaram depoimento, nesta terça (16), à CPI que apura o caso na Assembleia Legislativa. Eles isentaram políticos e servidores estaduais de participação no esquema e acusaram um promotor e três delegados de polícia de ameaça e coação.

Foram ouvidos Carlos Alberto Santana da Silva, ex-vice-presidente da Coaf, e Carlos Luciano Lopes, ex-vendedor da entidade. A Coaf firmou contratos com prefeituras e com a Secretaria Estadual da Educação do governo Geraldo Alckmin (PSDB).

Ao final da sessão, o deputado Barros Munhoz (PSDB) afirmou que houve um "complô" entre delegados de polícia e promotores com o objetivo de desgastar o governo. O tucano também criticou a cobertura da imprensa.

Silva, ex-vice-presidente da Coaf, confirmou que ouvia o ex-presidente Cássio Chebabi e o lobista Marcel Ferreira Julio dizerem que parte da propina dos contratos com o Estado era repassada ao deputado estadual Fernando Capez (PSDB).

Silva também relatou que Chebabi e Marcel diziam que outros políticos ganhavam "comissão", como os deputados federais Baleia Rossi (PMDB-SP) e Nelson Marquezelli (PTB-SP). Todos negam envolvimento no caso.

Na opinião de Silva, porém, o dinheiro não chegava até os agentes públicos. "Não havia esse tipo de repasse [para políticos]. Para mim, [Chebabi e Marcel] ficaram com o dinheiro para eles", disse.

O depoimento foi diferente do concedido ao Ministério Público e à Polícia Civil em janeiro, quando foi deflagrada a operação Alba Branca. Naquela ocasião, Silva havia dito, conforme os registros, que podia afirmar que parte do dinheiro ia para Capez.

Questionado sobre a aparente contradição, Silva respondeu que, em janeiro, estava sob ameaça do promotor Leonardo Romanelli, que investigou o caso em Bebedouro (SP), onde a Coaf tem sede.

"O doutor Romanelli foi claro: ou assina [o depoimento] do jeito que está ou continua preso", disse o advogado de Silva, Rogério Valverde, que o acompanhou na CPI.

Procurado, o promotor negou a acusação. "O depoimento dele foi todo gravado. Ele está mentindo e serão adotadas as providências contra ele", disse Romanelli.

EX-VENDEDOR

O depoimento Lopes foi na mesma direção do de Silva, mas com alvos diferentes. Lopes atacou os delegados de polícia que iniciaram a investigação.

Segundo o ex-vendedor, os delegados de Bebedouro o coagiram para que ele incriminasse políticos em seu depoimento. Lopes é o ex-funcionário da cooperativa que foi fotografado sorrindo com maços de dinheiro na mão –a imagem veio a público em abril.

"O senhor acha que eles [delegados] quiseram ser um Sergio Moro [juiz responsável pela Lava Jato]?", perguntou o deputado Delegado Olim, integrante da CPI. "Eles queriam aparecer?"

"Eu senti que, para que esse caso tivesse notoriedade, eles precisavam fazer algo assim, e fizeram. A Polícia Civil não podia ter aberto esse inquérito, porque desde o início eles sabiam que as verbas eram federais", respondeu Lopes, repetindo uma das críticas recorrentes que deputados da base de Alckmin têm feito à operação Alba Branca.

Em junho, a apuração referente às prefeituras paulistas passou da esfera estadual para a federal, porque, segundo as autoridades, descobriu-se que 92% do dinheiro pago à Coaf veio do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), um fundo federal.

Lopes afirmou que prestou queixa à Corregedoria da Polícia Civil contra os delegados que o investigaram. A Folha não conseguiu localizar os policiais até a publicação desta reportagem. Na semana passada, em depoimento à CPI, eles negaram irregularidades na investigação.

Questionado sobre um carro da Coaf que, conforme depoimentos, foi cedido para a campanha de Capez em 2014, Lopes afirmou que o veículo saiu da cooperativa em junho daquele ano e só foi devolvido em dezembro.

Ainda segundo Lopes, o lobista Marcel lhe disse que o carro era para Jéter Rodrigues Pereira, assessor do gabinete de Capez à época. O tucano nega que o carro tenha sido usado em sua campanha.

Ex-membros da Coaf estão divididos sobre a participação de políticos no suposto esquema. A CPI ainda não ouviu o ex-presidente da Coaf Cássio Chebabi e o lobista Marcel, que acusaram políticos em seus acordos de delação premiada já homologados pela Justiça.

'COMPLÔ'

Para o tucano Barros Munhoz, os depoimentos desta terça deixaram evidente que houve um "complô" entre promotores e delegados para atingir o governo do Estado.

"Ficou totalmente desmascarada a tese da máfia da merenda do governo do Estado. Indiscutivelmente [houve um complô entre policiais e promotores]. Acho que qualquer pessoa de bom senso chega a essa conclusão", declarou.

Questionado sobre o carro da Coaf supostamente emprestado à campanha de Capez, Barros Munhoz irritou-se. "Isso é uma questiúncula tão minúscula que não tem sentido alguém fazer uma pergunta dessa. Não é essa a discussão num país onde se roubam milhões", respondeu.


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