Folha de S. Paulo


João Santana reclama a Moro do rigor com o crime de caixa dois

O marqueteiro João Santana disse ao juiz Sergio Moro nesta quinta-feira (21) que recebia dinheiro de caixa dois por "circunstâncias do mercado" e pediu "proporcionalidade" na análise de seu processo na Justiça.

Santana disse que "98% das campanhas eleitorais" do país trabalham com caixa dois e que adotou uma conduta "pragmática". Reclamou de ser tratado como um criminoso "perigoso" e que ele e a mulher, Mônica Moura, são os únicos presos no Brasil hoje por pagamentos de campanha ilegais.

Disse ainda que o caixa dois já remunerou "milhões" de pessoas pelo país e é fruto de um sistema corrompido.

"Se tivesse o mesmo rigor [na Justiça] que está havendo comigo, sairia uma fila atrás de mim que iria ininterruptamente bater em Brasília e Manaus, poderia ser fotografada de satélite."

Ao longo de cerca de uma hora de depoimento, em diversas ocasiões ele afirmou que o recebimento de dinheiro dessa forma é uma "cultura" recorrente na política não só no Brasil. Santana foi o responsável pelo marketing de três campanhas presidenciais do PT, de 2006 a 2014, e está preso na Operação Lava Jato desde fevereiro.

Como disse não ter os detalhes sobre a negociação para o recebimento de dinheiro, seu depoimento se concentrou em detalhes da dinâmica das campanhas eleitorais e em uma espécie de explicação sobre o funcionamento da remuneração nas campanhas.

O marqueteiro disse que se sentia incomodado por receber dinheiro dessa maneira, que chamou de "nefasta", mas sustentou que não há como permanecer na profissão de outra forma.

Moro chegou a repreendê-lo em vários momentos. Perguntou se o modelo não configura uma trapaça e disse que a prática acaba criando um ambiente em que empresários, políticos e agentes públicos aceitam atos ilegais como a regra do jogo.

"Convenhamos, não dá para ser meio legal, meio lícito. 'Eu faço meio licitamente meus trabalhos'", disse o juiz.

Santana também disse que jamais pensou que seria preso e falou sobre sua relação com o PT. Disse que simpatizava com as propostas do partido, embora fosse visto como um "corpo estranho" dentro da estrutura partidária e sofresse muitas críticas.

Disse ainda que sua figura era superestimada na política nacional. "Se agigantou muito o grau de influência. Virei uma lenda para o bem e para o mal."


Endereço da página:

Links no texto: