Folha de S. Paulo


31ª fase da Lava Jato mira fraude em licitação para centro da Petrobras

A Polícia Federal de Curitiba deflagrou nesta segunda-feira (4) a 31ª fase da Operação Lava Jato, batizada de "Abismo".

Foram expedidos um mandado de prisão preventiva, quatro de prisões temporárias, sete de condução coercitiva e 23 de busca e apreensão.

Um dos principais alvos é o ex-tesoureiro do PT Paulo Ferreira, que foi preso no último dia 24, dia seguinte da Operação Custo Brasil, que investiga desvios do Ministério do Planejamento. O mandado dele é de prisão preventiva –ele deve permanecer detido em São Paulo.

Ferreira foi deputado federal pelo PT do Rio Grande do Sul de 2012 a 2014. Ele é casado com Tereza Campello, ex-ministra de Desenvolvimento Social e Combate à Fome do governo Dilma.

A Polícia Federal e o Ministério Público Federal identificaram o pagamento de R$ 39 milhões em propina entre 2007 e 2012, como parte do contrato de construção do Cenpes (Centro de Pesquisas da Petrobras), na Ilha do Fundão, zona norte do Rio de Janeiro.

Do total, R$ 1 milhão teria beneficiado diretamente o ex-tesoureiro Paulo Ferreira.

Os pagamentos a Ferreira foram realizados por contas de familiares, empresas e até por um blog e uma escola de samba de Porto Alegre, que receberam transferências do esquema por indicação do ex-tesoureiro, segundo a investigação.

"Ele buscava apoio político nas mais variadas frentes", comentou o procurador Roberson Pozzobon. Um dos operadores, Alexandre Romano, funcionava como o "caixa" do ex-tesoureiro, e repassava os valores a quem ele indicava.

"Os pagamentos não revertiam às contas do partido exclusivamente, mas havia benefícios pessoais." Parentes e empresas ligadas ao ex-tesoureiro também receberam parte das transferências.

A operação acontece nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e no Distrito Federal.

31ª Fase da Lava Jato - Operação "Abismo"

ABISMO

As investigações da "Abismo" apuram fraude à licitação, lavagem de dinheiro, cartel e pagamento de valores indevidos a servidores da Petrobras e membros do PT, "num contexto amplo de sistemático prejuízo financeiro imposto à Petrobras", segundo a PF.

"Há uma conexão entre as operações recentes", disse o procurador da República Roberson Pozzobon, destacando o fato de os nomes de investigados se repetirem nas últimas semanas em diversas operações contra a corrupção –como o próprio Ferreira, preso no mês passado na Operação Custo Brasil.

"Não há como enfrentar o crime organizado de maneira desorganizada. A corrupção está efetivamente alastrada no nosso país", afirmou Pozzobon.

O nome da operação é uma referência às tecnologias de exploração de petróleo em águas profundas desenvolvidas no Cenpes –e também à profundidade do esquema de corrupção na estatal. De acordo com a força-tarefa da Lava Jato, o esquema "levou a empresa aos recantos mais profundos da corrupção e da malversação do dinheiro público".

As investigações desta fase foram corroboradas pelo acordo de leniência e acordos de colaboração com a empresa Carioca Engenharia e seus executivos. Elas indicaram a formação de um cartel na disputa por três obras da Petrobras em 2007: uma sede administrativa em Vitória, o CIPD (Centro Integrado de Processamento de Dados), no Rio, e o Cenpes.

A obra do Cenpes ficou com um consórcio formado, além da Carioca Engenharia, pela OAS, Construbase, Construcap e Schahin Engenharia. Todas foram alvos de mandados de busca e apreensão nesta manhã.

CORRUPÇÃO PRIVADA

Apesar do combinado, a construtora WTorre, que não havia participado dos ajustes, apresentou proposta de preço inferior para a obra do Cenpes, segundo o MPF.

As empresas, então, teriam pagado R$ 18 milhões para que a empreiteira saísse do certame, permitindo que o consórcio renegociasse o preço com a Petrobras. A WTorre também está sendo investigada por fraude à licitação.

"Ou seja, a corrupção não está restrita ao setor público, mas se alastrou no setor privado", comentou o procurador Júlio Noronha. "É uma cultura que precisa ser mudada."

O contrato do Cenpes foi fechado em R$ 850 milhões, e chegou a R$ 1 bilhão por causa de aditivos.

Além da fraude na licitação, a obra gerou pagamento de propina a funcionários da diretoria de Serviços da Petrobras e a Paulo Ferreira.

Foram identificados pagamentos ilícitos a diversos operadores, sendo: R$ 16 milhões ao empresário Adir Assad, condenado na Lava Jato e preso na operação Saqueador; R$ 3 milhões para Roberto Trombeta e Rodrigo Morales, delatores na operação e ligados à empreiteira OAS; US$ 711 mil para Mario Goes, também delator; e R$ 1 milhão para Alexandre Romano, ex-vereador do PT cuja delação baseou a Operação Custo Brasil.

Romano relatou aos investigadores ter intermediado propinas em favor de Paulo Ferreira, que seria o agente do esquema no PT. O pagamento, de acordo com ele, foi feito por meio de contratos forjados entre suas empresas e pessoas físicas e jurídicas relacionadas ao ex-tesoureiro –entre elas um blog e uma escola de samba.

Pedro Barusco, ex-gerente da Petrobras, afirmou que a obra ganhada pelo consórcio rendeu propinas de 2% do valor do contrato. Segundo ele, os recursos também foram destinados ao ex-diretor da estatal Renato Duque e a agentes do PT.

ALVOS

Com exceção de Ferreira, que já está detido na Superintendência da Polícia Federal em São Paulo, os presos serão levados à sede da PF em Curitiba.

Foram presos temporariamente Edson Coutinho, ex-funcionário da Schahin Engenharia, no Rio, e Roberto Capobianco, um dos donos da Construcap, em São Paulo.

Outros dois alvos de pedidos de prisão temporária são Genésio Schiavinato Júnior, diretor da Construbase, e Erasto Messias da Silva Junior, da construtora Ferreira Guedes. Eles ainda não foram localizados.

Convocado para depor, o presidente do grupo WTorre, Walter Torre Júnior, não foi conduzido pela PF por estar de férias fora do Brasil. A construtora é responsável por obras como o Allianz Parque, que sedia os jogos do Palmeiras. O grupo é o administrador do estádio.

OUTRO LADO

Em nota, a WTorre afirmou que a empresa "não teve participação na obra de expansão do Centro de Pesquisas da Petrobras" e que "não recebeu ou pagou a agente público ou privado nenhum valor referente a esta ou a qualquer outra obra pública".

"O Grupo WTorre forneceu a documentação referente ao orçamento desta licitação que ainda se encontrava na empresa e segue à disposição das autoridades", diz o comunicado.

Também em nota, o grupo Schahin declarou que "compreende os trabalhos de investigação em curso e prosseguirá colaborando com as autoridades, como tem feito até agora".

Procuradas, as empresas Carioca Engenharia, OAS, Construcap, Construbase e Ferreira Guedes informaram que não iriam se manifestar.


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