Folha de S. Paulo


Crítica

Em livro, jornalista reconta Lava Jato sem esclarecer seus mistérios

Pedro Serapio/Gazeta do Povo
O lançamento do livro da Lava Jato, nesta terça à noite. É a partir das 19h30, nas Livrarias Curitiba, do Park Shopping Barigui. Sergio Moro com Vladimir Netto. *** PARCEIRO FOLHAPRESS - FOTO COM CUSTO EXTRA E CRÉDITOS OBRIGATÓRIOS ***
O juiz Sergio Moro e o jornalista Vladimir Netto no lançamento do livro, em Curitiba

Para quem já perdeu o fio da meada e desistiu de acompanhar o noticiário trepidante da Operação Lava Jato, o livro lançado na semana passada pelo jornalista Vladimir Netto oferece uma boa reconstituição dos primeiros dois anos da investigação.

"Lava Jato" mostra como as autoridades avançaram rápido, começando pelos negócios de uma rede de doleiros, até a descoberta de um vasto esquema de corrupção em que políticos e empreiteiras se uniram para desviar recursos da Petrobras e de outras estatais.

Repórter da TV Globo que participa da cobertura do caso desde o início, Netto recheia a narrativa com detalhes saborosos que ajudam a manter o interesse do leitor.

Ele descreve de forma eletrizante cada operação policial, mostra a tensão do dia em que os agentes entraram na casa do empresário Marcelo Odebrecht para prendê-lo e flagra o deputado Eduardo Cunha tentando esconder um celular no bolso enquanto a polícia vasculhava sua casa.

Mas o livro não traz novidade para quem continua seguindo a história nos jornais ou na TV. Quem estiver em busca de respostas para os muitos mistérios que os investigadores ainda não esclareceram ficará decepcionado.

Netto não esconde sua admiração pelo juiz Sergio Moro, que conduz os processos da Lava Jato em Curitiba, e pelos procuradores e policiais federais que estão na linha de frente da investigação.

Moro exibe "rigor e coragem" ao conduzir o caso "com maestria", diz o jornalista, que o descreve no livro como integrante de uma geração "que trabalha com afinco em busca de resultados".

O ministro Teori Zavascki, responsável pelos inquéritos no STF (Supremo Tribunal Federal), é apresentado como um ser infalível: "Busca sempre a razão, pesa prós e contras e estuda os detalhes de cada processo para tomar decisões bem fundamentadas".

Há várias razões para aplaudir as autoridades da Lava Jato, mas o jeito como o livro as enaltece apaga fatores históricos e institucionais que contribuíram para o êxito da operação, como se tudo fosse resultado só das virtudes de pessoas como Moro e Teori.

Além disso, há omissões difíceis de entender. Contradições entre delatores sobre episódios obscuros, como o que associa o ex-ministro Antonio Palocci ao desvio de dinheiro sujo para a campanha de Dilma Rousseff em 2010, foram desprezadas pelo livro.

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Netto ignora contribuições que a Folha e o jornal "O Globo" fizeram para ligar Eduardo Cunha a requerimentos usados para intimidar um lobista. O livro dá a entender que tudo nesse caso foi descoberto pelos procuradores.

Também fica sem explicação convincente a decisão de Moro de divulgar as gravações das conversas que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve com Dilma e outros aliados em março, e que Netto reconhece ter sido "a mais polêmica de suas decisões".

Com a Lava Jato ainda longe do fim, talvez seja cedo para cobrar respostas para essas dúvidas. Ou talvez o jeito seja esperar pela minissérie que a Netflix encomendou ao cineasta José Padilha, que comprou os direitos do livro. A estreia está prevista para 2017.

LAVA JATO
QUANTO: R$ 39,90 (416 PÁGS.)
AUTOR: VLADIMIR NETTO
EDITORA: PRIMEIRA PESSOA


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