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Regra fiscal do governo Temer reforça defesa de Dilma, diz Nelson Barbosa

Pedro Ladeira/Folhapress
O ex-ministro Nelson Barbosa (à esq.) e o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) na comissão do impeachment
Nelson Barbosa (à esq.) e o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) na comissão do impeachment

O ex-ministro da Fazenda Nelson Barbosa afirmou na manhã desta sexta-feira (17) à comissão especial que analisa o impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff, que o governo de Michel Temer se vale justamente de normas fiscais que reforçam a defesa da petista.

"O governo do vice-presidente em exercício ao propor seu limite de gastos escolheu o critério financeiro. Isso para mim demonstra mais do que qualquer coisa a corretude da tese da defesa da presidente", afirmou Barbosa.

O ex-ministro de Dilma citou a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que limita os gastos públicos para afirmar que, conforme a defesa tem procurado apontar, o que vale é a execução das despesas, e não a dotação orçamentária.

Para ele, isso demonstra que os decretos editados, um dos alvos do processo de impeachment, não afetaram a meta fiscal.

A afirmação ocorreu em resposta aos questionamentos do relator do processo de Dilma no Senado, Antonio Anastasia (PSDB-MG). Barbosa presta depoimento como testemunha de defesa nesta sexta.

Ao responder o senador, Barbosa reiterou, como já havia destacado em outros momentos nos quais compareceu à comissão, que a edição de crédito suplementar não causa impactos sobre a meta fiscal.

ALERTA

Interpelado pelo senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), ele ressaltou que os decretos de edição de crédito suplementar deixaram de ser editados quando o Ministério Público deu um alerta.

"A partir da representação do MP, o governo interrompeu a edição de decretos até que essa questão fosse decidida pelo TCU, o que só ocorreu em outubro. No momento do alerta, essa era uma questão que ainda estava em contestação. A presidente apresentou justificativas. Fica clara a boa fé e a corretude dos atos praticados", frisou.

"Fica patente e evidente o dolo. O governo tentou limpar a evidência do crime", afirmou Ferraço, que foi rebatido pelo ex-ministro da Fazenda, segundo quem, 2015 foi o ano "de arrumação das contas".

"Foi o ano em que o governo deixou de praticar as práticas que o TCU considerou irregulares. A partir da decisão final do TCU, modificou o pagamento de equalização das taxas de juros, alterou pagamento de contratos de prestação de serviços com a Caixa, pediu autorização do Congresso e obteve. Todas decisões legais, amparadas em decisões em vigor".

LEI ORÇAMENTÁRIA

Ele disse ainda que a limitação prevista na Lei Orçamentária de 2015 que só permitia a edição de decretos de créditos desde que a meta fiscal estivesse sendo cumprida visava dar "flexibilidade limitada" para a administração.

De acordo com Barbosa, o deficit fiscal de 2015 não se deu devido a uma má gestão fiscal, mas sim à queda de receita. Segundo ele, no ano passado houve o maior contingenciamento da história desde a vigência da Lei de Responsabilidade Fiscal.

"Não há que se falar de falta de esforço fiscal por parte do governo. O que houve, na verdade, no ano passado, foi uma grande queda de receita. Uma queda de receita de 180 bilhões, em relação ao que estava previsto na LOA [Lei Orçamentária Anual]. Não fosse essa queda de receita, o resultado do ano passado teria sido um superávit de 63 bilhões. Então, o principal fator que determinou a queda do resultado foi uma frustração de receita, não um excesso de gasto".

Para o ex-ministro, o processo de impeachment com base na edição de decretos suplementares com extrapolação da meta fiscal vai levar a uma mudança de comportamento do Executivo ao fixar a meta daqui pra frente.

"De agora em diante, os governantes vão colocar a meta o mínimo possível, vão começar a trabalhar com um piso".

Barbosa disse ainda que houve uma criminalização da política fiscal que culminou no impeachment, para ele, sem justificativa, mas que tem prejudicado a população.

"O movimento de criminalização da política fiscal, além de levar a um fato grave, que é o impeachment sem base, prejudica a população brasileira. O governo fica impedido de atuar devido à criminalização da política fiscal que vem sendo realizada nos últimos anos".

Barbosa foi a primeira testemunha da defesa ouvida nesta sexta. Também houve oitivas do ex-ministro da Educação José Henrique Paim; de Zarak de Oliveira Ferreira, diretor do departamento de programas de infraestrutura da Secretaria de Orçamento Federal; Antonio José Chatack Carmelo, analista do Ministério do Planejamento; Georgimar Martiniano, analista de planejamento e orçamento da Secretaria de Orçamento Federal e Gerente de Projeto do Departamento de Programas Especiais.

Todos afirmaram a legalidade e compatibilidade da edição de decretos de crédito com a meta fiscal vigente.

Depois de mais de dez horas de sessão, os ânimos começaram a se exaltar. A senadora Ana Amélia chegou a se referir à presidente Dilma como "rainha da Inglaterra". Ataídes Oliveira (PSDB-TO) desabafou e disse que estava cansado dos debates que giravam sempre em torno das mesmas coisas. "Não sei se vou aguentar esse blablablá", afirmou.

ESVAZIAMENTO

Após mais de três horas do início da sessão da comissão do impeachment, com o fim do depoimento de Nelson Barbosa, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) pediu a suspensão dos trabalhos e a transferência das demais oitivas para a próxima semana, alegando baixo quórum.

Às 14h24, estavam apenas ela, Lindbergh Farias (PT-RJ), Vanessa Grazziotin (PcdoB-AM), José Medeiros (PSD-MT), Waldemir Moka (PMDB-MS), além do presidente da comissão, Raimundo Lira (PMDB-PB), e do relator, Anastasia.

"A base do governo golpista não vem aqui para ouvir as testemunhas, vai embora, fica nos gabinetes. Quando acontece uma situação como essa, vem correndo. É lamentável o que está ocorrendo aqui. Essa não é uma comissão ordinária do Senado. Ou se tem seriedade, ou acaba", afirmou Gleisi após ter seu requerimento de encerramento rejeitado pelo presidente do colegiado.

Lira negou colocar o pedido em votação. Enquanto ocorria um bate-boca entre os presentes sobre o encerramento dos trabalhos, senadores governistas começaram a voltar ao plenário.

Segundo senadores que defendem a presidente Dilma na comissão do impeachment, documentos que começaram a chegar em resposta a requerimentos comprovam que não houve participação da presidente afastada, Dilma Rousseff, nas liberações de pagamentos ao Plano Safra, outro dos argumentos do processo de impeachment.

"Começamos a receber respostas a alguns requerimentos de informações. Um deles, por exemplo, chega do Banco do Brasil, dizendo que não há atos praticados diretamente pela presidenta afastada, Dilma Rousseff, na liberação dos pagamentos para o Plano Safra", afirmou Vanessa.

Em referência ao mesmo documento, ainda não divulgado, Gleisi Hoffmann afirmou que ele comprova que não há dolo. "Se não há dolo, não há crime. Por que estamos então julgando a presidenta por esse fato?".


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