Folha de S. Paulo


Delcídio retorna ao Senado e pede desculpas ao país por erros cometidos

Cinco meses após ter se afastado de seus trabalhos no Senado por ter sido preso na Operação Lava Jato, o senador Delcídio do Amaral (ex-PT-MS) retornou à Casa nesta segunda-feira (9) para apresentar sua defesa no processo de cassação a que responde por quebra de decoro parlamentar.

Por cerca de 15 minutos, o senador falou à Comissão de Constituição e Justiça onde pediu desculpas pelos "constrangimentos" que causou, segundo ele, não só ao Senado mas a todos os brasileiros, especialmente aos cidadãos do Mato Grosso do Sul. Ele também agradeceu ao apoio de sua família e de sua equipe de gabinete. "O que passei, eu não desejaria a nenhum dos meus inimigos", disse com a voz embargada.

Delcídio sustentou que não cometeu crimes que possam levar à sua cassação e afirmou que agiu a mando do governo da presidente Dilma Rousseff. "Eu não roubei, não desviei dinheiro, não tenho conta no exterior. Estou sendo acusado de obstrução de Justiça. E isso quando eu, como líder do governo, inadvertidamente errei mas agi a mando. Eu errei mas vou perder o mandato?", afirmou aos colegas.

O senador criticou o andamento do processo que, em sua avaliação, foi o "mais célere" que já viu na Casa e reclamou que a comissão negligenciou documentos importantes do caso. "Estão queimando etapas de forma inacreditável. Estou aqui há 13 anos e nunca vi tanta celeridade. Estava aqui quando tentaram cassar os ex-presidentes José Sarney e Renan Calheiros. Ninguém precisa me contar como as coisas aconteceram porque eu vi", disse.

Aos colegas, Delcídio disse que a forma como seu processo está tramitando pode abrir precedentes para que outros casos também sejam analisados rapidamente. De acordo com ele, houve restrição de sua defesa porque seus advogados não obtiveram documentos integrantes do processo e a íntegra da gravação em que foi flagrado tentando negociar a fuga do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró não foi anexada aos autos do caso.

"Esse processo pode virar padrão para outros casos. Basta ler jornal e acompanhar o que está acontecendo no Brasil para saber que outros processos virão", disse.

ASSESSORES

Delcídio também dedicou parte de sua defesa a elogios ao seu ex-chefe de gabinete, Diogo Ferreira Rodrigues, que também foi preso em novembro do ano passado sob a acusação de ter ajudado o senador nas tentativas de evitar uma delação premiada do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró.

"Se ele agiu de forma inadequada, agiu porque eu determinei. E hoje estamos pagando, assumindo o ônus por tudo o que cometemos", disse, após ter feito elogios à competência e lealdade do antigo subordinado.

Em sua fala, Delcídio criticou a decisão do Senado, tomada a mando do presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), de exonerar Diogo e também o assessor de imprensa do senador, Eduardo Marzagão, em março.

Ele foi o autor das gravações que mostraram o ministro Aloizio Mercadante (Educação) em conversas com o assessor para evitar uma delação premiada de Delcídio. Na época, Marzagão acusou a Casa de ter tomado uma decisão política.

"Eu ouvi em algumas situações que eu, Delcídio, havia mandado gravar as conversas. Não é verdade. Eu não mandei isso. Eu soube a posteriori. E eu entendi porque ele fez. Não fui contra. Aí, ele foi demitido por quebra de confiança. Que quebra de confiança? Eu nem fui consultado. Colocaram na rua dois pais de família", disse aos colegas.

O parecer que recomenda a perda do mandato do senador já foi aprovado no Conselho de Ética da Casa na semana passada. O colegiado tentou ouvir o senador por cinco vezes mas Delcídio não compareceu em nenhum momento. Agora, a CCJ precisa apenas confirmar se o processo não incorreu em erros jurídicos. Se for aprovado, o caso seguirá para votação no plenário do Senado.

Na semana passada, o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), afirmou que a votação aconteceria nesta terça (10). Se o plenário do Senado referendar a decisão do Conselho de Ética, Delcídio terá seu mandato cassado e ficará oito anos inelegível.

PRESSÃO

Como revelou a Folha, a presidente Dilma Rousseff tem pressionado Renan a pautar a votação da cassação de Delcídio no plenário da Casa antes da apreciação da admissibilidade do impeachment da petista porque ela não quer ter entre seus algozes alguém que foi líder do seu governo no ano passado. Delcídio já declarou publicamente sua intenção de votar pelo impeachment.

O senador ocupou o posto até ser preso em 25 de novembro. Após o episódio, ele relatou a interlocutores ter se sentido abandonado pelo pelo PT e pelo governo, que condenaram suas atitudes.

Uma conversa sua com Bernardo Cerveró, filho do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró foi gravada e entregue à Justiça. Nela, Delcídio oferecia ajuda à família e traçava um plano de fuga para o pai de Bernardo como forma de convencê-lo a não contar o que sabia sobre os esquemas de corrupção da Petrobras.

Após a prisão, Delcídio admitiu envolvimento no petrolão e fechou acordo de delação premiada, implicando 74 pessoas no esquema.

Solto em 19 de fevereiro, ele pediu seguidas licenças médicas. Na semana passada, ele fez um novo pedido de licença, desta vez por cem dias, para tratar de "assuntos pessoais".


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