Folha de S. Paulo


Vilarejo no Líbano festeja ascensão do 'filho Michel Temer'

Quando visitou o vilarejo libanês de Btaaboura em 2011, o vice-presidente Michel Temer discursou à população e aventou uma possibilidade: se sua família não tivesse migrado ao Brasil, ele gostaria de ter sido o prefeito local.

O prefeito Bassam Barbar, 65, ainda se lembra daquela tarde. "Eu disse que era sorte a minha, então, ele estar no Brasil", diz à Folha durante visita ao povoado, quase 70 km ao norte de Beirute.

Nesta quarta-feira (11), a 10 mil km de distância, Temer pode galgar os degraus rumo a um cargo mais alto: a Presidência brasileira.

Seu pai e três de seus irmãos nasceram nesse vilarejo. A ascensão do vice-presidente é acompanhada ali como uma conquista familiar.

Caso de fato retire o "vice" do título, ele será celebrado com um banquete de cordeiros, mil bandeirolas brasileiras compradas em Trípoli e danças típicas libanesas.

Os Temer formam um pequeno núcleo em Btaaboura. Proprietários de 200 oliveiras, são conhecidos, dizem moradores, pelo bom caráter. O primo Nizar Temer, 65, é hoje o membro mais próximo do político brasileiro. Seus pais eram irmãos.

Quando ele recebe a Folha em sua casa, em um salão de pé-direito alto, corta a conversa a pergunta: "Ele vai ser presidente? Qual é a probabilidade? Uns 70%?".

Estão sentadas ao redor suas irmãs Saidi, 82, e Soumaya, 72. Mais tarde, outro irmão, Nabi, 79, junta-se ao grupo de primos de Temer.

A família acompanha as notícias por meio do estudante de medicina Jad, 19, filho de Nizar. O garoto e seu irmão, Alain, 21, são afilhados de Temer, segundo o vilarejo. Os jovens compartilham informações sobre o padrinho no Facebook, e Alain recentemente mudou sua foto de perfil para um retrato com o vice-presidente.

É Jad quem traduz as reportagens da Folha via Google e informa a sua família.

A intermediação levou a um pequeno desentendimento em 17 de abril, quando a Câmara dos Deputados aprovou a abertura do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. A família pensou que Temer tivesse se tornado presidente. Pouco depois, entenderam que carecia votar no Senado.

CELEIRO

O trajeto entre Beirute e Btaaboura leva em torno de 1h30. A estrada, a partir do mar, serpenteia pelas montanhas, com vistas da paisagem abismal. Chuvisca durante todo o caminho, respingado pelas mesquitas e igrejas de outras vilas.

Segundo a população local, o nome Btaaboura é uma redução de "beit aboura". Essa expressão dialetal poderia ser traduzida ao português para "casa de estoque", uma espécie de celeiro.

Os pais de Temer deixaram o vilarejo em 1925, entre as agruras causadas pela Primeira Guerra Mundial. Três de seus irmãos, nascidos no Líbano, fizeram a viagem. Caçula, o vice-presidente nasceu em 1940, brasileiro pela diferença de 15 anos.

A família encontrou em Tietê (SP) um ambiente mais propício do que o de sua terra natal. Ali, trabalharam com arroz e café. Soumaya, irmã de Temer, manteve uma relação estreita com Btaaboura, e visitou a vila diversas vezes.

Hoje a casa da família, uma elegante construção de pedras, com arcos desmoronando, está em ruínas atrás da casa de Nizar. O primo diz que, se o vice-presidente quisesse e contribuísse, reformaria o local com esmero.

A Prefeitura estima cerca de 400 moradores em Btaaboura. Desses, boa parte, incluindo o próprio prefeito, passam a semana em Beirute. A região é conhecida pelas azeitonas, mas a juventude estuda e trabalha nos arredores, e não se vê muita movimentação no campo.

Temer esteve ali em 1997, quando presidia a Câmara dos Deputados, e em 2011, já como vice-presidente. A rua principal leva seu nome.

Em ambas as ocasiões, reuniu-se com os primos. Nabi se recorda de que Temer sabia dizer "obrigado" e "azeitona" em língua árabe.

Ao entrar na casa de Nizar e deparar-se com um retrato em branco e preto, teria exclamado: "meu pai!" A foto de Nakhoul, que mudou seu nome para Miguel no Brasil, está em uma das paredes.

Como lembrancinha do vilarejo, Temer recebeu uma caixa com figos, azeite e áraque, uma típica bebida alcoólica com sabor de anis.

TELEFONEMAS

Nizar visitou o político no Brasil, também. Eles trocaram contatos, e Nizar conta ter recebido um cartão com um número para discar quando quisesse conversar. Ele se refere a Temer como "primo".

Nas vezes em tentou ligar, no entanto, quem atendeu não falava árabe e desligou.

Nizar agora espera que, uma vez declarado presidente, Temer volte à vila para inaugurar a praça recém-erguida em sua homenagem. "Ele disse que, se um dia fosse presidente, retornaria."

O prefeito Barbar, ligado à família da mãe de Temer, enviou um convite há duas semanas à equipe do brasileiro. Ainda não teve resposta.

Quem conheceu Temer, durante suas visitas à vila, guarda lembranças de um homem cordial e atencioso.

O eletricista Elias Suaid, 70, também tem para si uma boa opinião do político brasileiro. Suaid cresceu em Tietê, onde conviveu com Temer, até migrar ao Líbano de seu pai em 1962. "Todos na família dele eram inteligentes, bons estudantes", diz.

"Quem diria que um filho de Btaaboura seria presidente do Brasil?", pergunta-se.


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