Folha de S. Paulo


análise

Com economia próspera, Senado livrou Clinton do impeachment

Daniel Marenco-9.dez.2013/Folhapress
Foto de 2013 mostra a presidente Dilma Rousseff em encontro com Bill Clinton no Rio
Foto de 2013 mostra a presidente Dilma Rousseff em encontro com Bill Clinton no Rio

O Senado dos EUA absolveu o presidente Bill Clinton em 12 de fevereiro de 1999 no processo de impeachment a que havia sido condenado pela Câmara sete semanas antes.

Um dos argumentos da defesa de Clinton lembra um pouco a da presidente Dilma Rousseff: as acusações contra ele não eram razão suficiente para retirá-lo do cargo.

A concisa Carta Magna americana determina na seção 4 do artigo 2º que "o presidente [...] deve ser removido do cargo [...] quando condenado por traição, suborno ou outros crimes e contravenções graves". Clinton foi acusado de falso testemunho e obstrução da Justiça no caso de assédio sexual movido contra ele por Paula Jones, que também envolveu alegações de que ele teria feito sexo com a estagiária Monica Lewinsky na Casa Branca.

A defesa de Clinton argumentou: "supondo que as acusações procedam, elas não constituem suficiente motivo para condenação e remoção do cargo".

Eram precisos dois terços dos cem senadores (67) para Clinton ser condenado; apenas 50 o consideraram culpado de obstrução da Justiça e 45 de falso testemunho.

Na Câmara, em 19 de dezembro de 1998, 228 deputados haviam votado pelo impeachment por falso testemunho (206 votaram contra) e 221 por obstrução da justiça (212 contra). Nos EUA, a decisão de impeachment pela Câmara é tomada por maioria simples, e o presidente só deixa a função após o final do processo no Senado.

Frank Leonhardt-29.mar.1999/AFP
A ex-estagiária da Casa Branca Monica Lewinsky em lançamento de livro na Alemanha
A ex-estagiária da Casa Branca Monica Lewinsky em lançamento de livro na Alemanha

A absolvição de Clinton se deu muito mais porque o país vivia grande prosperidade econômica quando o caso foi julgado do que por falta de provas contra ele.

Clinton havia conseguido em seis anos manter crescimento sustentado da economia sem inflação nem desemprego, realizar o primeiro Orçamento com superavit em 30 anos, sancionar importantes leis sociais e coordenar esforços de paz no exterior.

Havia pouca dúvida sobre a culpa de Clinton no caso específico.

O país todo viu ele mentir em juízo ao negar ter praticado sexo com Lewinsky. E Clinton pagou a Jones US$ 850 mil em 1999 num acordo para encerrar a ação dela, em admissão implícita de culpa. Além disso, ele foi suspenso por cinco anos da Ordem dos Advogados.

O julgamento de Clinton pelo Senado, portanto, foi político, não jurídico. A Justiça foi quem resolveu se o presidente cometeu crimes. Coube ao Senado decidir se o seu comportamento lhe permitia continuar no cargo ou não. O êxito da economia foi fundamental para orientar a decisão.

Como disse Gerald Ford, quando ainda era deputado (depois se tornaria presidente com a renúncia de Richard Nixon em 1974), "a infração que justifica um impeachment é qualquer uma que a maioria da Câmara assim o decida num específico momento da história".

Em 227 anos, só duas vezes a Câmara dos EUA decidiu haver razão para o impeachment de um presidente. Nos dois casos, o Senado absolveu o presidente –Andrew Johnson, em 1868, e Clinton, 130 anos depois.

O único presidente dos EUA alvo de impeachment a deixar o governo foi Nixon, que renunciou dez dias depois de comissão da Câmara ter recomendado a aprovação de seu impeachment por obstrução da Justiça e abuso de poder no caso Watergate, mas antes que a votação no plenário ocorresse.

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA é editor da revista "Política Externa". Foi correspondente da Folha em Washington


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