Folha de S. Paulo


'Rala Cunha', espumante e forró: veja como foi o domingo de votação em SP

As reações dos paulistanos à votação deste domingo (17) na Câmara foram as mais diversas. Nos Jardins, houve apoio ao impeachment, mas com certa resistência. Em Paraisópolis, uma família foi dividida entre "coxinhas" e "petistas". Já na Vila Madalena houve quem preferisse acompanhar o futebol.

Com o resultado, buzinas e comemorações foram ouvidas em Higienópolis. Na praça Roosevelt, reduto da esquerda, o clima foi de desalento.

Confira abaixo como São Paulo acompanhou e reagiu à votação que autorizou a abertura formal do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.

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JARDINS EM CLIMA DE OSCAR

Ze Carlos Barretta/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL, 17-04-2016, 19h00: Publico comemora a votacao a favor do impeachment no restaurante Spot. (Foto: Ze Carlos Barretta/Folhapress FOTO)
Público comemora a votação a favor do impeachment no restaurante Spot, nos Jardins

Uma mistura de premiação de Oscar com final de Copa, regado a vinho rosé e Aperol spritz (bebida amarga de laranja com espumante), tomou conta de bares e restaurantes na tarde quente deste domingo (17), na região nobre dos Jardins.

Gente uniformizada com a camisa da seleção, munida de apetrechos, como bandeiras e vuvuzelas, acompanhou a votação pelo processo de impeachment em telões e aparelhos de TV instalados dentro e até na calçada dos estabelecimentos.

A arquiteta Marina Albuquerque, 38, chegou ao restaurante Spot, às 14h, especialmente para acompanhar a votação. "Recusei convite para ir ao Guarujá porque este é um momento histórico", disse ela. "Queria estar aqui para participar. É um instante de esperança."

Seu marido, o economista João Miguel, 44, afirmou que é inegável que o Brasil piorou muito nos últimos anos. "Tenho amigos que estudaram nas melhores instituições do mundo, mas estão desempregados. Triste."

A cada "sim", gritos e aplausos. O "não" vinha com vaias e palavrões.

Alguém destoava em meio à clientela: era Alejandra Sampaio, 37, atriz e garçonete do Spot. "Estão subestimando minha inteligência com o Cunha à frente desse processo contra uma mulher que não teve enriquecimento ilícito."

Para Sergio Kalil, 53, sócio-proprietário do restaurante, o Spot é um espaço apartidário que respeita opiniões. "Os telões são ligados em noite do Oscar e nos jogos da seleção, assim como serão nas Olimpíadas."

O administrador de empresas Renato Perrotti, 52, não esperou pelo fim da votação. "Não aguento mais: beijo para pai, mãe, filho e até para papagaio", disse. Passava das 23h quando a frase "Tchau, querida" virou bordão da comemoração.


(ROBERTO DE OLIVEIRA)

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BOLO E 'SAI DILMA' NO MORUMBI

Rodrigo Dionisio/Folhapress
São Paulo - SP - 17/04/2016 - A socialite Alessandra Campiglia reúne amigos em sua casa, no Morumbi, na tarde de domingo (17/04), para acompanhar a votação da admissibilidade do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff, na Cãmara dos deputados em Brasília. Foto: Rodrigo Dionisio/Folhapress
A socialite Alessandra Campiglia reúne amigos em sua casa, no Morumbi, para acompanhar a votação

"Meu presente de aniver é: Dilma, tchau!", diz André Furini, 40 anos completados neste domingo (17). "O que posto no Face? Dilma volta pro Sul?", pergunta o sócio da grife Marcelo Quadros, enquanto procura uma música para substituir "People Are Strange", do The Doors.

O "parabéns" acaba de rolar com bolo de churros e limão siciliano, e Furini e os amigos deixam a mesa para ver a votação do impeachment, na casa da empresária Alessandra Campiglia, 48, no Morumbi (zona oeste).

A sessão na Câmara está em andamento com a TV sem som. "O que um deputado do Amapá vai falar que me interesse? É só blábláblá", fala o designer de interiores Alexandre Zanini, 45.

A arquiteta Marcella Manfrinatti Reis, 30, une as mãos em forma de oração: "Vamos ganhar, pelo amor de Deus!", diz, com um olho na TV e outro no grupo "Muda Brasil", no WhatsApp. Para ela, que promete ir a Curitiba quando Sergio Moro prender Lula, "é absurdo" alguém ser contra o impedimento da mandatária, "com tanta corrupção".

A anfitriã Alessandra se diz apartidária. "Não estou feliz nem com Temer nem com Cunha, mas Dilma tem que sair para mostrar que tem lei", fala. "Se me perguntar qual partido deve assumir, não sei. Tem de mudar. No momento, sou 100% Moro."

(LÍGIA MESQUITA)

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VIZINHOS DE TEMER FIZERAM FESTA EM ALTO DE PINHEIROS

Divulgação
O vice-presidente Michel Temer acompanha com satisfacao o andamento da votacao do impeachment na Camara. Divulgacao ***NAO USAR SEM A AUTORIZACAO DA EDITORIA DE PODER*** ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
O vice-presidente Michel Temer acompanha o andamento da votação do impeachment na Câmara

Na votação do impeachment, o clima na vizinhança do vice-presidente Michel Temer (PMDB) era de festa. Um piquenique reunia 40 convidados para celebrar o aniversário de uma moradora da praça onde fica a casa paulistana de Temer, em Alto de Pinheiros, zona oeste.

Os eventos também se estendiam para dentro das casas de alto padrão. A professora de inglês Marita Souza e Silva Adams, 70, acordou às 2h para acompanhar os preparativos para a votação.

"Faz dias que venho acompanhando", disse ela, que recebeu família e amigos para um almoço. Seu marido não participou. Estava compenetrado na frente da televisão, com uma faixa escrita "Fora, Dilma!".

"A Dilma não tem mais ambiente para governar este país", ecoou outro vizinho, o empresário Roberto Achcar. "Com o Temer não vai melhorar nada, mas pelo menos é uma intenção", afirmou, enquanto passeava com seu cão border colie pela praça.

Ainda que o peemedebista estivesse em Brasília, havia um aparato de proteção para salvaguardar a vice-primeira-dama Marcela Temer, 33, e o filho do casal, Michelzinho Temer, 7.

Cinco homens, que se identificaram como agentes da Polícia Federal, passaram o domingo de plantão em frente à casa. Dois carros da PM faziam rondas pela praça.

(CHICO FELITTI)

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FUTEBOL E POLÍTICA NA VILA MADALENA

Clientes de bar na Vila Madalena comemoram resultado da votação na Câmara

As atenções nos bares e restaurantes da Vila Madalena, bairro boêmio na zona oeste de São Paulo, estavam divididas entre votação do impeachment e rodada do futebol na tarde do domingo (17).

O Coutinho, por exemplo, transmitia São Paulo x Audax, pelo Campeonato Paulista. No Porto Madalena passava Bahia x Santa Cruz, pela Copa do Nordeste.

Mais para o fim da votação, as atenções se voltaram para Brasília.

O restaurante O Pasquim, Bar e Prosa foi um dos que decidiu exibir desde o início a sessão da Câmara.

"É um momento importantíssimo para a nossa sociedade, então transmiti-lo em todas as TVs ao vivo, para todos os públicos, contra ou a favor do impeachment, é democrático", afirma um dos sócios do restaurante, Pepito Pellegrino, 48. Ele se disse a favor do impedimento de Dilma.

Nos bares da rua Aspicuelta, a aprovação do impeachment na Câmara foi motivo de muita comemoração. Em alguns pontos, houve buzinaço logo após o anúncio dos 342 votos favoráveis ao afastamento de Dilma.

No restaurante Posto 6, o clima era de final de Copa do Mundo. Para o empresário Alexandre Desidério, 32, o resultado representa esperança. "Espero que desperte no brasileiro uma consciência política diferente", diz.

A arquiteta Tatiana Diniz, 30, também celebrou o resultado: "Senti que o Brasil teve voz. Estou muito feliz. Espero que, no mínimo, haja uma melhora [no governo], porque do jeito que estava, não dava para ficar".

(JÚLIA ZAREMBA)

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FORRÓ E FAMÍLIA DIVIDIDA EM PARAISÓPOLIS

Luiz Carlos Murauskas/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL, 17-04-2016 07h43: A cumunidade de Paraisopolis acompanha a votacao na Camara se abre processo de Impeachment de Dilma. * Na casa da familia Nascimento dotres sao a favor e os outros a favor do nao.( Foto: Luiz Carlos Murauskas/Folhapress, COTIDIANO ) ***RESTRICAO***
Família Nascimento se reúne em Paraisópolis para acompanhar votação

A família Nascimento, de Paraisópolis, favela na zona sul de São Paulo, estava dividida. No sofá esquerdo, os "petistas". No direito, os "coxinhas". A TV de 40 polegadas, no meio, mostrava a votação do impeachment na Câmara.

"Sou corintiana e petista", diz a professora Maria do Nascimento, 41. "Eu sou são-paulina e coxinha", retruca a desempregada Emiliana Nascimento, 29.

A família Nascimento foi exceção. A votação passou quase despercebida em Paraisópolis. As ruas estreitas estavam agitadas, mas com funk, pagode e músicas de oração das igrejas.

Numa ladeira, cerca de 400 pessoas aguardavam o início do forró. A dona da festa, Maria Aparecida Prudêncio, 28, disse que o povo até se interessava pela votação do impeachment, mas queria mesmo é diversão.

"O nome já diz: somos desfavorecidos. A população pobre quer curtir o domingo, ir dormir às 23h e amanhã ir trabalhar. Ou procurar emprego."

(LEANDRO MACHADO E VAGNER DE ALENCAR)

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RESIGNAÇÃO NA PRAÇA ROOSEVELT

Philipe Watanabe/Folhapress
Roosevelt
Bar vazio neste domingo (17) na praça Roosevelt

Na praça Roosevelt, no centro de São Paulo, muitos associaram a falta de clientes ao medo de confrontos na região. O dono de um bar disse temer que, após a votação, a praça virasse palco de balbúrdia.

Para Amanda Teixeira, 31, do bar Amigos do Zé, há outra explicação. "As pessoas que frequentam a praça costumam ser contra o impeachment. Devem estar no Anhangabaú [local de concentração de manifestantes pró-Dilma]".

Mesmo antes do resultado final, só alguns se concentravam na televisão. Os votos contrários à abertura do processo eram recebidos com aplausos.

As amigas Bruna Garcia, 30, e Naísa Matos, 36, se definem como "pessoas preocupadas com o processo democrático".

"O PT está enfraquecido. Perdeu o que tinha de ideologia. Mas amanhã, quando eu me levantar, vai ser um tapa", diz.

Naísa, que esteve no mesmo bar em 2014, quando comemorou a vitória de Dilma nas eleições, disse que "a democracia está sendo jogada no ralo".

"Mais um 7x1", resumiu Bruna.

(PHILLIPPE WATANABE)

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CALMARIA EM HIGIENÓPOLIS

Bruno Soraggi/Folhapress
Clientes assistem votação em Higienópolis
Clientes assistem à votação em Higienópolis

No bairro de Higienópolis, centro de São Paulo, o clima foi de domingão sabático. "Ficou todo mundo em casa, é?", brincou o arquiteto Antônio Neto, 63.

O restaurante Via Castelli, no qual ele acompanhava a votação, e a cantina vizinha, Jardim de Nápoli, estavam quase vazios na noite de ontem. O movimento foi 40% menor que a média, de acordo com o gerente da casa Ailton Mella, 65.

Com o resultado da votação, o bairro ganhou movimento. Foram ouvidos buzinas e fogos de artifício. Alguns moradores foram às janelas piscar luzes, bater panelas, soprar cornetas e gritar palavras de ordem contra o governo Dilma.

No cruzamento da av. Higienópolis com a av. Angélica, muitos carros passaram buzinando e piscando faróis. A comoção, porém, durou pouco. Cerca de dez minutos depois do fim da votação,o clima de silêncio dominical voltou a tomar conta do bairro.

(BRUNO SORAGGI)

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IBIRAPUERA 'RALOU' CUNHA

Divulgação
coletivo
Mural do coletivo A Revolta da Lâmpada, no vão do MAM, no Ibirapuera.

"Vai ralando o Cunha até o chão", cantavam participantes de um evento realizado pelo coletivo A Revolta da Lâmpada, no vão do MAM, no parque do Ibirapuera. O evento "Bate papo com a militância" reuniu cerca de 50 jovens em uma conversa informal sobre identidade de gênero.

De acordo com os integrantes do coletivo, o evento não é pró-governo, mas pró-democracia. Para eles, o governo Dilma não foi muito diferente de outros em relação à luta da comunidade LGBT. "Mas somos contra o Cunha. Esse sim tem várias acusações comprovadas contra ele", disse um dos organizadores.

De seu telefone celular, o artesão peruano Yuri Sobrino também acompanhava a votação no parque.

"Espero que o sim ganhe para que acabe a corrupção."

(EVERTON LOPES)

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CELULAR DOMINA MISSA

Luiza Olmedo/Folhapress
Missa nos Jardins neste domingo 17
Fiéis participam de missa nos Jardins neste domingo (17)

Na paróquia Nossa Senhora do Brasil, no Jardim Paulista, zona oeste, a missa das 18h30 teve 30% menos pessoas do que o normal, disse o padre Miquelino, 50. "Mesmo quem estava aqui, estava no celular, seguindo a votação".

Segundo o padre, as opiniões variam na paróquia. "Conversei com malucos que falam que é golpe, mas que são a favor do impeachment. Tem outros que são contra, outros a favor."

(LUIZA OLMEDO)

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JUIZ MORO TEM FAIXA EM TAIPAS

Luciano Amarante/Folhapress
São Paulo - 17.04.2016 - COTODIANO - Como está o clima na periferia de São Paulo durante a votação, no Plenário da Câmara dos Deputados Federais, sobre a aprovação do precesso de Impeachment da Presidente Dilma.O casal João Lino e Neiva da Silva, moradores de Taipas, colocaram uma faixa em frente à residência. Foto: Luciano Amarante/Folhapress
O casal João Lino e Neiva da Silva, moradores de Taipas, colocaram uma faixa em frente à residência

Em Taipas, na periferia da zona norte, a contrarregra Neiva da Silva, 45, fez uma faixa roxa para homenagear o juiz Sergio Moro e pedir a prisão de Lula e Dilma e a colocou em frente à sua casa, na movimentada avenida Deputado Cantidio Sampaio.

"Fiz há um mês. Estamos envergonhados com tudo. Falam que é golpe, mas golpe é tudo que o PT faz". Invadiram um terreno aqui na frente e um vereador ajudou", diz.

Seu marido, João Lino, 42, caminhoneiro, está sem trabalho há quatro meses.

"Vamos nos mudar para João Pessoa (PB) em breve. Vendemos dois terrenos e estamos vivendo desse dinheiro", conta ele.

André Medeiros, 27, é contrário ao impeachment. Seu pai, Manoel Bezerra, 49, defende a saída de Dilma.

André vai a protestos pró-governo e Manoel já foi sindicalista, próximo ao PT, mas hoje vota no PSDB.

Os dois evitam discussões quando se encontram, mas já tentaram convencer um ao outro a mudar de lado.

Eles moram no Jaraguá, na periferia da zona norte.

(RAFAEL BALAGO)

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CANTINAS VAZIAS NO BIXIGA

Divulgação
Antônio Gonçalves Sobrinho,61, maitre da Villa Tavola no Bixiga
Antônio Gonçalves Sobrinho,61, maitre do restaurante Villa Tavola, no Bixiga

O domingo seria de movimento intenso nas cantinas do Bixiga, no centro de São Paulo, mas havia poucas pessoas na região na tarde deste dia 17.

"Está muito vazio e isso não é normal. Nesse horário, eu estaria trabalhando, mas agora estou só coçando o ombro", afirmou Antônio Gonçalves Sobrinho, 61, maître do restaurante italiano Villa Tavola.

No intervalo entre turnos de trabalho em um bar da rua Rui Barbosa, o músico Josep Kopf, 40, resolveu parar para uma cerveja, mas acompanhou os acontecimentos em Brasília pela TV do celular.

"A gente não pode perder esse momento histórico. Eu vi o do Collor e me lembro até hoje", disse ele, que torcia pelo impedimento da presidente Dilma.

Petista filiado, Segismundo Bruno, 68, resolveu não acompanhar a votação. Dono do café Sabelucha, no Bixiga, há 23 anos, ele exibe fotos de Dilma e Lula ao lado do caixa.

"Não é questão de partido, é porque é outro golpe que eu vejo", disse, em referência a 1964.

(MARIANA FREIRE)


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