Folha de S. Paulo


'Se eu perder, estou fora do baralho', diz Dilma a quatro dias de votação

Alan Marques/Folhapress
A presidente Dilma Rousseff dá entrevista em seu gabinete no Palácio do Planalto
A presidente Dilma Rousseff dá entrevista em seu gabinete no Palácio do Planalto

A quatro dias da votação do pedido de impeachment e com risco de derrota, a presidente Dilma Rousseff reuniu dez jornalistas para dizer que, se ganhar a votação do impeachment, seu "primeiro ato" será fazer uma proposta de "pacto e diálogo" sem "vencidos nem vencedores".

Manteve, porém, durante toda a conversa o tom de ataques a seus adversários dizendo que "há um estado de golpe sendo conspirado" e repetiu que seus autores são o vice Michel Temer (PMDB-SP) e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Na entrevista desta quarta (13), que durou mais de duas horas, a petista falou em alguns momentos como se o impeachment pudesse ser aprovado e disse, ao ser questionada sobre participar de um pacto em caso de derrota, que, "se eu perder, estou fora do baralho".

Sobre medidas para sair da crise, admitiu que será preciso aumentar tributos.

PACTO
Sempre criticada pela falta de abertura às negociações, até com sua base aliada, Dilma buscou passar a imagem de que, vencida a batalha do impeachment, terá um comportamento pacificador no dia seguinte.

"O meu primeiro ato pós-votação na Câmara é a proposta de um pacto, de uma nova repactuação sem vencidos nem vencedores. Seja pós-Câmara, mas também pós-Senado sobretudo, que será mais efetivo", afirmou.

VENCIDOS E VENCEDORES
Dilma disse que sua proposta será para "todas as forças políticas", até a oposição. Insistindo na proposta de uma pacificação do país após a votação do impeachment, que a oposição e o PMDB consideram que vão ganhar, a presidente disse: "Eu vou oferecer um processo de diálogo" e vou respeitar não só os "meus 54 milhões de votos" mas também "os dos outros".

GOLPISTAS
Durante a entrevista, a presidente voltou a afirmar que todos aqueles que defendem seu impeachment sem crime de responsabilidade são golpistas. "Não há dúvida." Em um dos trechos em que acabou falando num tom em que considera a hipótese de derrota, a presidente disse que a aprovação de um impeachment sem provas "marcará profundamente, indelevelmente, a história do presidencialismo no Brasil, marcará!".

DENÚNCIA
Elevando o tom de voz, a presidente afirmou que, como presidente, tinha de falar algo. "Estou fazendo uma denúncia. Tem um estado de golpe sendo conspirado no Brasil. Tem tanto aqueles que agem a favor abertamente como os que agem ocultamente e os que se omitem, todos serão responsáveis pelo fato de que não se pode supor que certos atos políticos são sem consequências."

EMPRESÁRIOS
Questionada sobre classificar de golpistas os empresários que estão programando fechar shoppings no domingo (17), dia da votação na Câmara, a presidente afirmou que não faria distinção, que coloca todos no mesmo papel caso defendam seu afastamento sem prova, inclusive "um pedreiro, um professor ou um empresário".

TEMER E CUNHA
Dilma fez questão de voltar a atacar duramente tanto Temer como Cunha. "São associados, um não age sem o outro." Questionada sobre falar também de questões financeiras, disse que não se tratava disso, mas de política.

LUTAR ATÉ O FIM
"Nós lutaremos até o fim contra esse impeachment. Acreditamos que, no dia de domingo, temos todas as chances de barrar o impeachment. Esse é o recado principal." Em seguida, a presidente afirmou que seu "segundo recado é que, logo depois, temos que fazer um pacto no Brasil". Lembrada que o clima piorou para ela nos últimos dias, depois que o PP decidiu sair do governo, ela diz que "na reta final, vamos sofrer uma guerra psicológica".

FORA DO BARALHO
Questionada sobre o que vai fazer caso perca a batalha e sofra o impeachment, a presidente respondeu que não teria condições de participar de um pacto: "Se eu perder, eu estou fora do baralho. Mas não estou falando só da Câmara, estou falando lá no fim, mais ou menos lá para maio [pós-Senado]".

SEM-TETO
Os jornalistas perguntaram também sobre o que Dilma faria caso fosse afastada por 180 dias, até o processo ser julgado no Senado. "Isso ninguém sabe." Ao ouvir a explicação de que o Palácio da Alvorada poderia continuar à sua disposição, respondeu, aos risos, "bom saber, não serei uma sem-teto".

AUMENTO DE TRIBUTO
Falando num cenário de vitória na votação do impeachment e, nesse caso, em medidas que estuda para tirar o país da recessão, afirmou que será preciso "aumentar tributo, nenhum país sai de crise sem aumentar tributo".

A petista disse que não estava falando apenas da recriação da CPMF, que está em tramitação no Congresso, mas também de outros tributos. Ela não quis, porém, detalhar quais.

ENSAIO
"A gente deveria ter duas vidas: uma para ensaiar e outra para viver. Eu tinha que ter ensaiado, mas fui obrigada a viver." Dilma Rousseff preferiu citar Vittorio Gassman, ator e diretor italiano, no lugar de dizer o que não repetiria como presidente.

Na conversa com jornalistas, a presidente estava bem-humorada. Afirmou que "de uma certa forma" é feliz como presidente e admitiu que fica nervosa "algumas vezes", mas negou desequilíbrio e medicamentos.

"É contra todas as evidências dizer [isso] de alguém que anda de bicicleta no mínimo 50 minutos [por dia], às vezes ando por 1h10, faço musculação..."

A presidente assumiu sua dificuldade de falar em público. "Eu sei escrever, não sei falar... sou uma 'escrivinhadora'. Só consigo entender quando escrevo."

Colaborou MARINA DIAS, de Brasília


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