Folha de S. Paulo


Cunha 'queimou etapas' em análise de impeachment de Temer, diz Marco Aurélio

Na decisão que determinou que a Câmara dê início ao processo de impeachment do vice-presidente Michel Temer (PMDB), o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Marco Aurélio Mello afirmou que o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), não "respeitou o figurino legal" ao rejeitar o pedido de afastamento do correligionário.

Para o ministro, Cunha extrapolou suas atribuições e analisou o mérito da acusação contra o vice-presidente, o que caberia a uma comissão especial a ser criada pela Câmara para discutir o recebimento ou não da denúncia.

Marco Aurélio disse que o deputado "queimou etapas". "Cabe ao Presidente a análise formal da denúncia-requerimento. A ele não incumbe, substituindo-se ao Colegiado, o exame de fundo. Entender-se em sentido contrário implica validar nefasta concentração de poder, em prejuízo do papel do colegiado, formado por agremiações políticas diversas", argumentou o ministro.

"Não se pode desconsiderar a ênfase dada pela Constituição Federal aos partidos políticos, a refletir na composição da Comissão Especial", completou.

De acordo com o Regimento da Câmara, cabe ao presidente da Casa receber a denúncia contra presidente, vice-presidente e ministros por crimes de responsabilidade. A norma fala que deverá ser verificada a existência de requisitos como "documentos que a comprovem" a denúncia e que, se preenchidos, o processo deve ser lido em plenário e enviado para uma comissão especial.

Segundo Marco Aurélio, é possível "concluir pelo desrespeito aos parâmetros relativos à atuação do Presidente da Casa, pois, embora tenha reconhecido, de maneira expressa, a regularidade formal da denúncia, procedeu a verdadeiro julgamento singular de mérito, no que consignou a ausência de crime de responsabilidade praticado pelo vice-presidente da República, desbordando, até mesmo, de simples apreciação de justa causa".

Marco Aurélio diz que não está avaliando eventuais indícios contra Temer. "Não se está a emitir qualquer compreensão quanto à conduta do vice-presidente da República, revelada na edição dos decretos mencionados na petição inicial e no acervo probatório que a acompanha. No caso, a controvérsia envolve controle procedimental de atividade atípica do Poder Legislativo".

Cabe recurso da Câmara contra decisão de Marco Aurélio ao plenário do STF. O pedido de impeachment de Temer foi pedido pelo advogado Mariel Márley Marra e chegou ao STF porque foi arquivado por Cunha sob a justificativa de que não existiam elementos de que o vice cometeu crime de responsabilidade.

Marra pediu uma liminar para paralisar o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff em discussão na Câmara até que o plenário do STF decida se Temer deve ser processado conjuntamente com a petista, o que foi rejeitado por Marco Aurélio.

"A paralisação do processo de Dilma descabe agasalhar o pedido de paralisação do processo de impedimento da presidente da República, cuja tramitação conta, a esta altura, com atos de instrução formalizados."

O pedido do advogado argumentou que o vice-presidente cometeu crime de responsabilidade e teria atentado contra a lei orçamentária ao assinar decretos autorizando a abertura de crédito suplementar sem autorização do Congresso. As irregularidades são as mesmas que motivam o atual pedido de impeachment da petista.

Temer não comentou o pedido de impeachment feito por Marra.

VAZAMENTO

Marco Aurélio enviou ofício ao presidente do STF pedindo para apurar o vazamento da minuta da decisão sobre o impeachment de Temer, que chegou a ser divulgada na semana passada, por engano. O texto ainda está em elaboração.

O presidente do STF, Ricardo Lewandowski, respondeu que serão feitas mudanças na Secretaria Judiciária para a padronização dos processos, evitando novas falhas de comunicação.

A decisão e a minuta do texto divulgada são praticamente iguais, com alguns ajustes. Marco Aurélio trocou a expressão "juízo de valor" por "compreensão" sobre eventuais indícios contra Temer no processo.

O ministro ainda inseriu em seu despacho considerações sobre manifestação feita pela Câmara nesta segunda (4) afirmando que o STF jamais poderia obrigado a Câmara a analisar um pedido de impeachment, mas não rebateu a acusação de interferência.

Temer no alvo


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