Folha de S. Paulo


Operação de Santana reforça suspeita de caixa 2 em reeleição de Dilma

A empresa do marqueteiro João Santana recebeu recursos em dinheiro vivo, no caixa dois, da empreiteira Odebrecht e fez pagamentos, igualmente em espécie, a fornecedores da campanha da reeleição de Dilma Rousseff contratados por ela.

O roteiro identificado pela Folha sugere o caminho do dinheiro da construtora para prestadores de serviço do PT que trabalharam para a Pólis, empresa de Santana, mas isso ainda é objeto de investigações da Polícia Federal.

Segundo a reportagem apurou, a PF vê indícios de que Mônica Moura, mulher e sócia do marqueteiro, fez esses pagamentos entre 2014 e 2015 com recursos ilegais recebidos da Odebrecht.

Estes gastos seriam de deslocamentos das equipes de Santana, serviços de internet e produção de programas do PT com Dilma como estrela.

Até aqui, a construtora Andrade Gutierrez havia confirmado ter pago ilegalmente a fornecedores de Dilma, mas na campanha de 2010 —o que poderia ter efeitos para investigação criminal, mas dificilmente afetaria a situação eleitoral da petista.

Já as contas de 2014 são alvos de inquérito no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que podem resultar na cassação da chapa da reeleição, atingindo tanto Dilma como seu vice, Michel Temer (PMDB).

A Folha cruzou dados de planilhas apreendidas pela Polícia Federal com depoimentos sigilosos da secretária da Odebrecht Maria Lúcia Tavares, uma das principais colaboradoras da Lava Jato.

O resultado mostra que a construtora levantou dinheiro vivo com doleiros, em São Paulo e Salvador, para repassar à empresa Pólis, de Santana e Mônica. Ao todo, a operação identificou pagamentos nos sete meses seguintes ao segundo turno da eleição.

Sob a condição de não serem identificados, dois prestadores de serviços da campanha de 2014 disseram que a Pólis fazia pagamento de serviços da área de comunicação, como produtoras de vídeo, em dinheiro vivo.

Um deles contou à reportagem que este tipo de pagamento em "cash" era feito pela própria Mônica.

O casal está preso em Curitiba, e a empresária foi interpelada sobre os pagamentos em sua negociação preliminar para fazer uma eventual delação premiada com o Ministério Público Federal. Segundo relatos, ela falaria sobre os pagamentos no caixa dois em 2014.

Em depoimento à Polícia Federal no dia 2 de março, que está em segredo de Justiça, a secretária Maria Lúcia contou que cuidou dos repasses ao marqueteiro do PT por dois anos. Os contatos eram sempre feitos com Mônica.

Segundo ela, as entregas ocorriam, na maioria das vezes, em São Paulo, em endereços diferentes e com emissários diversos.

Uma planilha chamada "Paulistinha", apreendida na casa da secretária, traz 41 pagamentos a "Feira" [codinome da equipe de Santana], num total de R$ 21,5 milhões.

A primeira entrega de R$ 500 mil ocorreu no dia 30 de outubro de 2014, apenas quatro dias depois do segundo turno. A última, também de R$ 500 mil, foi entregue em 22 de maio de 2015, no mês anterior à prisão de Marcelo Odebrecht e da cúpula do grupo.

A "Paulistinha", explicou Maria Lúcia, referia-se a entregas de dinheiro vivo na cidade de São Paulo. O "cash" era levantado com Alberto Novis, da Hoya Corretora de Valores e Câmbio —alvo da fase Xepa da Operação Lava Jato, o desdobramento da Lava Jato baseado nos depoimentos da secretária.

Heuler Andrey/Folhapress
CURITIBA,PR, BRASIL, 23.02.2016 - CHEGADA DE JOAO SANTANA NO PR: Monica Moura, esposa de Joao Santana preso na 23 fase da Operacao Lava-Jato denominada de Acaraje chega no IML em Curitiba-PR para realizar exame do corpo de delito. Foto: Heuler Andrey/FolhaPress PODER ***Exclusivo*** - Mônica Moura
Mônica Moura e o marqueteiro João Santana em fevereiro, quando foram detidos na Lava Jato

O dinheiro "gerado" por Hoya no Rio foi registrado em outra planilha, a "Carioquinha". Em outro arquivo eletrônico, com referência a pagamentos a "Feira" na "Paulistinha", o responsável por autorizar os pagamentos é identificado pela sigla MBO –Marcelo Bahia Odebrecht, para os investigadores.

No caso de Mônica, oficialmente nem os procuradores nem os seus advogados confirmam as negociações.

Nas conversas preliminares com autoridades, Mônica repetiu a versão isentando o marido, sustentando que era ela que cuidava de toda a parte operacional da empresa, cabendo a ele somente a concepção das campanhas.

A investigação sobre os pagamentos da Odebrecht a Santana foi remetida ao STF. A defesa da empreiteira ressalta que isso deveria ter acontecido antes, já que há citação à campanha de 2014.

OUTRO LADO

O ministro Edinho Silva (Comunicação Social), tesoureiro da campanha de Dilma à reeleição, disse à Folha que todos os pagamentos à Pólis, empresa de João Santana, foram feitos por meio de transferências bancárias, registrados na contabilidade e informados à Justiça Eleitoral.

Segundo ele, a campanha tinha contrato de R$ 70 milhões com a Pólis, sendo R$ 50 milhões no primeiro turno e R$ 20 milhões no segundo. Edinho afirmou que nada foi pago ao marqueteiro pela campanha além destes recursos.

Sobre pagamentos em dinheiro vivo, na forma de caixa dois, a prestadores de serviços da Pólis, o ministro disse que a campanha não fez este tipo de operação e tudo o que foi pago está registrado oficialmente. Segundo ele, a campanha só se responsabiliza pela própria contabilidade feita no período.

As defesas do publicitário João Santana e da mulher dele, Mônica Moura, não se manifestaram até a conclusão desta edição.

Segundo a assessoria de imprensa da Pólis, empresa dos dois, Fábio Tofic Simantob, que defende o marqueteiro, estava em viagem nesta quarta (30) e não poderia comentar as alegações de que a empresa recebeu em dinheiro vivo da Odebrecht e que também houve repasse, em "cash", a prestadores de serviço da campanha.

O advogado Juliano Prestes, que assumiu a defesa de Mônica Moura para negociar uma delação premiada, não foi localizado.

Citada como fonte de pagamentos clandestinos de R$ 21,5 milhões ao marqueteiro, a construtora Odebrecht não quis se manifestar.

Dinheiro vivo


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