Folha de S. Paulo


Babá de foto polêmica diz ser a favor da manifestação

Mauro Pimentel/Folhapress
RIO DE JANEIRO, RJ, 15.03.2016: BABA DO PROTESTO RJ/MARIA ANGÉLICA LIMA - Uma fotografia de Maria Angelica Lima carregando o carrinho dos bebes do seus patrões durante o protesto do ultimo domingo na praia de Copacabana, zona sul do Rio de Janeiro, viralizou pela internet. Ela conversou com a reportagem da Folha de S.Paulo na tarde dessa terça-feira sobre a repercussão da imagem. Maria Angelica concedeu a entrevista acompanhada da sua filha menor, Laura Maria, de dois anos. (Foto: Mauro Pimentel/Folhapress, FSP-FOTO) ***EXCLUSIVO FOLHA***
A babá Maria Angélica Lima e sua filha Laura Maria, de dois anos

Dentre todas as fotos dos protestos contra o governo no domingo (13), a que mais gerou discussão em redes sociais mostrava a babá Maria Angélica Lima, 45, negra, vestindo seu uniforme branco enquanto empurrava o carrinho com os filhos de um casal branco, vestido com as cores da bandeira.

Registrada no Rio, a imagem foi interpretada como um símbolo do perfil elitista daqueles que foram para as ruas naquele dia e um retrato das relações entre as classes no Brasil.

Procurada pela Folha, Maria Angélica disse que foi ao protesto porque estava trabalhando e tinha que acompanhar a família, mas afirmou que apoia as manifestações contra o governo porque se diz "cansada de roubalheira".

"Eu estava de branco porque é meu uniforme de trabalho, não porque sou contra a manifestação. Não preciso estar de verde e amarelo para apoiar meu país. O que vale é minha consciência. Foi bom [ter havido a manifestação] para o povo acordar", disse Maria Angélica.

Moradora de Nova Iguaçu, município da Baixada Fluminense onde vive com o marido e duas filhas, a babá afirmou que a distância de sua casa para o local da manifestação carioca –a praia de Copacabana, a cerca de 48 km– seria o único empecilho para sua participação caso estivesse de folga.

Lima estava presente quando a família ficou sabendo da divulgação da foto. Segunda ela, Pracownik não pediu que ele defendesse publicamente a posição da família. "Eles me disseram que havia acontecido uma coisa chata que iria causar muita repercussão. E disseram para eu me proteger, tentar não me expor tanto", diz Lima.

Ela diverge de boa parte dos manifestantes de domingo por se opor ao impeachment da presidente. "Se for para tirar ela e botar o vice [Michel Temer], é melhor ela ficar. [A corrupção] será igual ou pior", diz ela, que defende a cassação da chapa Dilma-Temer no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e a convocação de novas eleições.

Mas o que ela quer mesmo, diz, é uma "limpeza geral". "Tem que tirar muita gente. Fazer uma limpeza na casa, no Congresso. O presidente não lidera sozinho."

Além de não apoiar o impeachment, Maria Angélica discorda dos manifestantes que veem o juiz Sergio Moro como salvador da pátria. "Ele está fazendo um trabalho bem direcionado, mas não é meu ídolo. Esse será quem vai mudar o meu país, nos dar educação e saúde."

Eleitora de Aécio Neves (PSDB) em 2014, diz que escolheu o tucano porque achava que o país precisava de uma mudança. "Lula não foi o presidente que todos esperavam. Dilma, muito menos. Tinha que apostar numa coisa nova. Estava cansada de ver tanta mentira, roubo."

Professora de formação, chegou a dar aula em creches, mas parou cedo e passou a trabalhar como babá nos finais de semana.

Desde junho passado, trabalha para a família de Claudio Pracownik, advogado, vice-presidente de finanças do Flamengo e ex-CFO (diretor financeiro) da Brasif.

A empresa voltou ao noticiário em fevereiro, depois que a jornalista Mirian Dutra disse à Folha que o então presidente Fernando Henrique Cardoso usava a Brasif para enviar ao exterior recursos para o filho que teria tido com ela, Tomás Dutra, fruto de um relacionamento extraconjugal nos anos 1980 e 1990.

Ainda na tarde de domingo (13), Pracownik se pronunciou em seu perfil numa rede social. Disse que pagava seus impostos e não dava nem recebia propina. Afirmou ainda se orgulhar de poder empregar quatro pessoas na sua casa com carteira assinada. Para ele, a divulgação da foto fez parte de uma tática diversionista.

Joao Valadares/CB/D.A Press
13/03/2016- Manifestacao contra Dilma e o PT em Ipanema, Rio de Janeiro. (Foto: Joao Valadares/CB/D.A Press. ) *** APENAS ONLINE*** ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Imagem de Claudio Pracownik que foi divulgada nas redes sociais

Lima diz que não concorda com as críticas feitas a Pracownik e sua mulher nas redes sociais.

"Não entendi qual era o problema [da foto]. Eu estava fazendo meu trabalho. Infelizmente, o Brasil é assim, tem o rico e tem o pobre. Vai fazer o quê? Essa classe não está dividida de agora, mas de décadas atrás. Meu patrão tem boa condição porque estudou e trabalhou para isso. Tem gente aí que tira do nosso [dinheiro]. E eu sou sua funcionária, não trabalho de graça."

Diz ver no Brasil de hoje um problema de desigualdade social. "Sempre houve. É chato falar isso, mas é verdade. Se você é pobre, é pobre, se é rico, é rico. Pobre tem que esperar no calor. Rico, quando chega, é cafezinho, água gelada, ar condicionado. Infelizmente."

Para ela, o governo do PT não mudou esse quadro. "Minha vida muda porque eu mudo ela. Se eu ficar esperando de político, não vai acontecer nada."

Elogia, no entanto, a lei dos trabalhadores domésticos, que garantiu direitos como pagamento de horas extras e férias, sancionada em 2015 pela presidente Dilma Rousseff.

Maria Angélica reclama da crise econômica e diz estar sentindo no dia a dia o efeito da inflação.

"O dinheiro só dá para pagar as contas do mês, não conseguimos juntar. No mercado, só dá para comprar o grosso, a metade do que comprava antigamente."


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