Folha de S. Paulo


Manuscrito de lobista reforça suspeita de propina paga a senadores

Um manuscrito do lobista Alexandre Paes dos Santos, o APS, reforça suspeita de pagamento de propina ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ao senador Romero Jucá (PMDB-RR) e a Gim Argelo (PTB), ex-senador pelo Distrito Federal.

O material foi encontrado durante busca e apreensão da Operação Zelotes, que apura um suposto esquema de compra de medidas provisórias que concederam benefícios fiscais a montadoras de automóveis.

Na folha de papel, lê-se o número "45" e, ao lado, as seguintes anotações: "15 - GA"; "15 - RC"; e "15 - RJ". Um laudo anexado ao inquérito atesta que o conteúdo foi escrito pelo lobista, que está preso.

Os números e as iniciais coincidem com a versão apresentada pelo ex-auditor da Receita Federal João Gruginski, também investigado na operação.

Em depoimento à PF em dezembro, ele contou ter ouvido de APS que Renan, Jucá e Argello pediram R$ 45 milhões de suborno para trabalharem pela aprovação de emenda de interesse do setor automotivo, conforme o "Painel" informou em janeiro.

De acordo com Gruginski, que transcreveu diálogos da reunião em um diário pessoal, APS "comentou abertamente" que os senadores solicitaram a quantia, "R$ 15 milhões para cada".

Reiteradamente, a defesa de APS sustenta que ele prestou serviço de lobby às montadoras Caoa e MMC Automotores, representante da Mitsubishi no Brasil. Nega, porém, que tenha participado de negociações ilegais.

No mesmo papel recolhido entre os pertences do lobista é possível identificar ainda anotações com as siglas "Caoa" e "MMC", ambas relacionados a números, além de "MP 512". A Caoa e a MMC também estão na mira da Zelotes, assim como a medida provisória 512 de 2010.

Gim Argello é o autor de uma das emendas da MP. Ouvido pela PF, ele disse que jamais recebeu qualquer tipo de vantagem.

Procurador responsável pela Zelotes, Frederico Paiva diz que as anotações de APS serão úteis. "Assim como outras informações, essa anotação é importante. Será devidamente analisada e confrontada com outros elementos de prova", afirmou ele.

Pedro Ladeira - 17.mar.2015/Folhapress
BRASILIA, DF, BRASIL, 17-03-2015, 20h00: O senador Romero Jucá, relator do orçamento da União, durante sessão do Congresso Nacional durante sua votação, em Brasília (DF). (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)
O senador Romero Jucá (PMDB-RR), um dos citados na Zelotes

SUPREMO

A Operação Zelotes deu origem a uma ação penal na 10ª Vara da Justiça Federal em Brasília. O manuscrito do lobista deverá reacender um pleito dos advogados que atuam no processo.

Eles defendem que, após o depoimento do ex-servidor da Receita, o caso deveria ter passado à responsabilidade do STF (Supremo Tribunal Federal), sob argumento de que só a Corte pode julgar processos envolvendo membros do Congresso.

"A interpretação de que os dados indicam participação de parlamentares só foi possível após dezembro de 2015, com o depoimento do Gruginski. Nesta data, a ação penal já havia sido protocolada", disse Paiva.

O procurador acrescentou que o ex-servidor da Receita prestou esclarecimentos num outro inquérito da Zelotes, que seguiu para a Procuradoria-Geral da República, a quem cabe analisar a participação de detentores de foro privilegiado.

OUTRO LADO

A Caoa informou que não contratou nem pagou pessoas ou empresas para intercederem junto a órgãos públicos por edição de medidas provisórias. Diz ainda que não pleiteou benefícios que não estejam na legislação e que jamais teve contato com João Batista Gruginski.

O ex-senador Gim Argello afirmou que a menção a seu nome é uma "ilação absurda" e que a "repudia veementemente". Em depoimento à PF, disse que propôs medidas que beneficiaram montadoras de Goiás visando benefícios indiretos a Brasília.

O presidente do Senado, Renan Calheiros, informou que não teve envolvimento com os fatos investigados na Zelotes. Diz saber quem é Alexandre Paes dos Santos, mas que não conhece João Gruginski e que jamais teve relação com eles.

A assessoria de Romero Jucá não conseguiu localizá-lo.

Procuradas, as defesas de Alexandre Paes dos Santos e da MMC Automotores não quiseram se pronunciar.


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