Folha de S. Paulo


Acadêmicos da USP criticam desmonte de direitos conquistados no Congresso

Revogação no Estatuto do Desarmamento e mudanças no conceito de trabalho escravo. Criação do Estatuto da Família e da lei anti-terrorismo. Rebaixamento da idade penal mínima e punição para a difusão de informações sobre aborto.

Estes e outros projetos propostos pelo Congresso Nacional representam uma ofensiva contra a constitucionalidade brasileira, segundo o coletivo "Em Defesa dos Direitos Conquistados", formado por professores e pesquisadores da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP.

O grupo suprapartidário, lançado nesta quarta (2), reúne notáveis acadêmicos da USP como Paulo Sérgio Pinheiro, Fabio Konder Comparato, Jorge Schwartz, Marilena Chauí, Fernando Limongi, Maria Victoria Benevides e André Singer, também colunista da Folha, entre outros.

"A Faculdade de Filosofia, que sempre foi um local de resistência e não pode estar calada num momento em que se pretende desmontar os direitos políticos, civis e sociais garantidos pela Constituição de 1988", disse Pinheiro, que foi secretário de Estado de Direitos Humanos no governo FHC. "A universidade tem saberes e experiências que podem ajudar a intensificar esse debate."

Grande parte dos projetos criticados pelo grupo surgiram no Congresso Nacional sob a batuta do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), alvo de processo de cassação. Muitos deles foram impulsionados pela chamada bancada BBB na Casa: do boi, da bíblia e da bala.

"Estamos assistindo à apropriação privada de cargos públicos, como no caso de Cunha, acusado, entre outras coisas, de abuso do direito de fiscalizar do parlamentar", disse Joaquim Falcão, professor da FGV Direito Rio, que integrou a Comissão Afonso Arinos, responsável por elaborar o anteprojeto da Constituição de 1988.

Segundo ele, um dos convidados do debate que marcou o lançamento do coletivo, fazem parte dos mecanismos que levaram estes projetos adiante o uso da prerrogativa pública para interesses privados, a interpretação regimental com discricionariedade e um poder sobre a agenda das instituições democráticas, algo que ocorre tanto no Congresso como no Supremo Tribunal Federal.

Para Singer, que também participou do debate, é importante observar não só os ataques a direitos sociais impostos pelos projetos mas também aos direitos políticos e civis, caso dos projetos de desvinculam verbas da educação e da saúde, dos que permitem a terceirização do trabalho, além da tentativa de colocar na Constituição o financiamento empresarial de campanhas, principal motor dos recentes escândalos de corrupção no país.

"O lulismo, que conseguiu barrar o avanço neoliberal, entrou em colapso. Com isso, tudo o que estava represado desde o final dos anos 1990 desabou de uma vez no final de 2014", avaliou o cientista social. "Precisamos retomar uma luta pela cidadania enquanto cidadãos, organizados por baixo e de maneira ampla."

O próximo debate do coletivo está previsto para o dia 11 de abril, na USP, e terá como tema a Lei Antiterrorismo.


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