Uma usina a carvão em construção pela Odebrecht na República Dominicana, contestada na Justiça local por superfaturamento e danos ambientais, enfrenta lentidão por atrasos de desembolsos, inclusive do BNDES.
Opositores dizem que a obra é exemplo do tráfico de influência da construtora sobre o governo local.
A Folha esteve no escritório do complexo nesta quarta-feira (24) sem se identificar. Funcionários disseram que o governo vetou visitas à central para evitar contradizer o discurso oficial de que uma das principais obras do país está a todo vapor.
O presidente dominicano, Danilo Medina, era assessorado até a segunda (22) pelo publicitário João Santana –que admitiu ter recebido dinheiro de caixa dois da Odebrecht no exterior.
O marqueteiro se desligou da campanha de Medina à reeleição para cumprir mandado de prisão temporária da Polícia Federal.
Alvo da Lava Jato, o ex-presidente da empreiteira Marcelo Odebrecht e o diretor-presidente da construtora, Benedicto Barbosa da Silva Júnior, estão presos.
A oposição no país cobra explicações sobre o vínculo de Medina com Santana, que também fez sua primeira campanha, em 2012.
O presidente do partido socialista Movimento Caamañista, Narciso Isa Conde, disse em nota, nesta quarta-feira, que Santana é "peça chave no tráfico de influência em favor da Odebrecht" na República Dominicana.
Além da usina de Punta Catalina, a empreiteira brasileira constrói ainda uma rodovia e tem 11 projetos já executados desde que começou as operações no país, em 2002, de acordo com o seu site.
COMPLEXO
O complexo de Punta Catalina, na cidade de Baní, esperava receber no final do ano passado com uma parcela do total de US$ 656 milhões do financiamento aprovado pelo BNDES.
Com previsão de conclusão em 2017, as obras estão em ritmo reduzido, com 1.400 funcionários em atividade, dos até 7.000 necessários. A Odebrecht nega atrasos.
O complexo, de duas usinas com capacidade total de 720 MW, é uma concessão da agência energética estatal da República Dominicana (CDEEE) ao consórcio liderado pela Odebrecht e formado ainda por Tecnimont e Estrella, no intuito de sanar a deficiência energética do país, que sofre frequentes apagões.
A empreiteira venceu a concorrência no final de 2013 com a proposta mais cara, no valor de US$ 2 bilhões. Os competidores questionaram o resultado na Justiça.
Até agora, além de desembolsos do governo, a CDEEE disse ter recebido US$ 200 milhões, em 2015, de um grupo de bancos europeus liderado pelo Deutsche Bank, que também financia o projeto.
Segundo a agência estatal, o pagamento da primeira parcela do total de US$ 632,5 milhões das instituições financeiras atestaria o cumprimento de parâmetros internacionais.
Um grupo de organizações civis e ambientais dominicanas briga na Justiça do país pela suspensão das obras. Eles acusam o consórcio de superfaturar a obra e desrespeitar a legislação ambiental.
"Essas usinas começaram a ser construídas sem licença ambiental, em meio a um escândalo nacional e internacional por enorme sobrevalorização de ao redor de US$ 1 bilhão e a um processo de licitação afetado por graves conflitos de interesse", disseram as organizações.
OUTRO LADO
A Odebrecht nega irregularidades e diz respeitar lei ambiental. Também afirma que "a obra se encontra dentro da estratégia originalmente planejada, com as adequações de ritmo". O BNDES confirmou que nenhum desembolso foi feito até o momento, mas não disse o motivo.
A Presidência da República Dominicana não comentou. A agência estatal do país para energia elétrica afirma que a paralisação motivada por atrasos no financiamento da obra não altera a data de entrega.