Folha de S. Paulo


Encontro Folha de Jornalismo discute desafios da profissão

Abertura

Os desafios do jornalismo em meio às transformações tecnológicas foram tema do primeiro dia do Encontro Folha de Jornalismo, que celebra os 95 anos do jornal.

"O jornalismo vive um profundo paradoxo. Nunca se leu tanta notícia como hoje", disse o diretor de Redação da Folha, Otavio Frias Filho, na abertura. "Por outro lado, os pilares de sustentação econômica do jornalismo foram abalados pela transformação tecnológica."

NOVAS FORMAS DE INFORMAR

No primeiro painel, mediado pelo editor-executivo, Sérgio Dávila, Eugênio Bucci, professor de jornalismo da ECA-USP, e Leão Serva, colunista da Folha, deram perspectiva histórica para a crise do modelo de negócios baseado em receita publicitaria. "A imprensa no inicio não era um negócio", disse Bucci.

"A redução do tamanho dos jornais cria a sensação da morte do jornalismo", disse Serva. "Vamos assistir novo ciclo na relação da sociedade com o jornalismo que talvez não se baseie mais no modelo dos jornais de massa."

Vera Brandimarte, diretora de redação do "Valor Econômico", ressaltou que assinaturas digitais já representam um terço do total e em dois anos devem passar de 50%. Porém, a publicidade on-line não chega a 5% do total. "Mesmo com números tão expressivos no digital, quando a gente vê o que aconteceu com receita publicitaria, é de chorar."

QUANDO A IMPRENSA É VISTA COMO OPOSIÇÃO

Os desafios ao jornalismo por pressões políticas foram tema do segundo painel.

O venezuelano Eugenio Martinez expôs a conflituosa relação entre os meios de comunicação e o governo desde o início do chavismo, em 1998. "Aquilo que passou a ser aceito como jornalismo na Venezuela é, na verdade, relações públicas do governo."

O argentino Hugo Alconada Mon, secretário-assistente de Redação do jornal "La Nación", contou que o governo chegou a enquadrá-lo no crime de traidor da pátria por sua investigação sobre rede hoteleira da família da ex-presidente Cristina Kirchner.

O brasileiro Lúcio Flávio Pinto, criador do "Jornal Pessoal", de Belém (PA), falou sobre liberdade de investigação e o enfrentamento com a política paraense. "Fui processado uma vez durante a ditadura militar e fui absolvido. Na democracia brasileira, já coleciono 33 processos, quatro condenações e inúmeras ameaças de morte."

ERRAMOS

EX-OMBUDSMANS DISCUTEM O DIREITO DE DEFESA

No terceiro painel, a discussão foi sobre direito de resposta e as dificuldades em reconhecer erros. A ombudsman da Folha, Vera Guimarães Martins, lamentou o fato de a seção "Erramos", criada há 25 anos, não ter sido adotada pela imprensa (exceto o cearense "O Povo").

Na opinião dos ex-ombudsman da Folha Caio Túlio Costa e Júnia Nogueira de Sá, a criação do cargo e da seção Erramos "não resolveu muita coisa". Para Costa, os veículos brasileiros deveriam ter se antecipado na elaboração de forma efetiva de garantir direito de resposta.

A ombudsman de "O Povo", Tania Alves, acredita que a nova lei do direito de resposta não traz tantos desafios, especialmente para jornais de menor porte.

CRÔNICA

Na última mesa do dia, os escritores Fernanda Torres, Ruy Castro e Luis Fernando Verissimo discorreram sobre os desafios de fazer crônicas. "Crônica é conversa fiada! Mas fico constrangido de escrever abobrinha a semana inteira", disse Castro, que procura equilibrar assuntos leves com crônicas que digam respeito ao noticiário.

A atriz Fernanda Torres, que escreve na "Ilustrada", afirmou: "Tento falar mais de arte, que é o que conheço melhor, mas a realidade é impressionante. Não dá para concorrer." Para Verissimo, que assina colunas em "O Estado de S. Paulo" e "O Globo", crônica "é tudo que você disser que é crônica". " Você pode fazer ficção, comentar política ou futebol."

O evento, que tem patrocínio da Odebrecht e da Fiesp, termina nesta sexta (19).

Nesta quinta, o editor-executivo, Sérgio Dávila, respondeu a pergunta da plateia que questionou o patrocínio por uma empresa investigada na Operação Lava Jato: "A gente gosta de lembrar a divisão Igreja-Estado. O interesse comercial não deve se imiscuir nas prioridades das editorias. E as prioridades da Redação não devem interferir nas do comercial".


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