Folha de S. Paulo


'Me sinto acuada', diz testemunha na Zelotes confrontada por advogados

Testemunha da Operação Zelotes por ter sido uma das autoras de relatório que descreveu atividades dos lobistas acusados de compra de medidas provisórias para o setor automotivo, Patrícia Pullen Parente, servidora da Corregedoria do Ministério da Fazenda em Brasília, se disse "acuada" durante depoimento na manhã desta quarta-feira (17) na 10ª Vara Federal do Distrito Federal.

Patrícia, que atua na Corregedoria do Ministério da Fazenda, prestou depoimento como testemunha arrolada pelo juiz federal Vallisney de Souza Oliveira. O relatório produzido pela Corregedoria é citado diversas vezes na denúncia do Ministério Público Federal contra 16 pessoas, das quais 15 são hoje rés no processo –seis estão presas.

Baseado na análise de e-mails e documentos apreendidos pela PF e em dados tributários, o relatório apontou indícios de que um grupo de lobistas atuou para obter as MPs por meio de pagamentos a agentes públicos.

Na audiência, Patrícia foi duramente confrontada por Marcelo Leal, advogado do lobista Alexandre Paes dos Santos. Leal indagou a ela se na Corregedoria do Ministério da Fazenda havia algum código de ética que, a exemplo do dos advogados, pudesse impedir ao servidor "distorcer" dados ou declarações para "iludir o juiz".

Indagada pelo juiz se estava confortável com as perguntas, Patrícia respondeu: "Estou me sentindo acuada, ele está sugerindo que eu cometi algum [desvio ético]... As perguntas estão sugerindo. Meu relatório é técnico".

Ela manifestou contrariedade por ter ouvido um advogado na plateia dizer que as acusações no relatório da Corregedoria do Ministério da Fazenda "são feitas de forma irresponsável".

"Não foge à minha pergunta", disse Leal. Em outro ponto do depoimento, ele afirmou: "Vocês manipularam esses documentos [apreendidos]".

O advogado também argumentou diversas vezes que o grupo da Corregedoria do Ministério da Fazenda usou, para a produção do relatório, "a técnica do recorta e cola, do control C+control V".

EDUCAÇÃO

O juiz determinou a Leal que "baixasse a voz, seja educado", mas orientou Patrícia a responder às dúvidas. Dirigindo-se à servidora, disse: "Ele está confrontando o seu relatório. Não vejo nenhuma pergunta [indevida]. A senhora tem que enfrentá-lo. A senhora tem que responder às perguntas do seu relatório. É o momento de explicar, a denúncia fez referência a seu relatório várias vezes".

O advogado de Alexandre Paes dos Santos passou a ler diversos trechos do relatório e a indagar como o grupo da Receita e ela teriam chegado às conclusões de que houve crime na atividade dos lobistas. Patrícia defendeu o trabalho da Receita.

"É um relatório de análise, baseado em fatos, documentos. Está clara a utilização das mensagens e dos repasses financeiros", disse Patrícia.

A servidora afirmou que as investigações demonstraram que o grupo atuou em diversas frentes, incluindo o Carf, conselho vinculado ao Ministério da Fazenda que julga recursos protocolados por empresas contra multas aplicadas pela Receita.

"Havia aquelas [pessoas] que faziam a captação dos clientes e havia os que tinham trânsito –'posso chegar até eles'. O grupo se reúne para poder definir 'com quem podemos atuar'. Depois um segundo grupo, que podem ser as mesmas pessoas, fazia a cooptação e contratação. Se aproximava da empresa [cliente]. Um terceiro grupo se responsabiliza pela manipulação dos julgamentos [no Carf], como se conduzia os julgamentos no Carf para que o julgamento fosse favorável. E, enfim os pagamentos e a lavagem de dinheiro", disse Patrícia.

Leal protestou contra o fato de o relatório da Receita ter apontado que Alexandre Paes dos Santos é sócio de outro lobista, José Ricardo da Silva, na empresa SGR, uma das principais investigadas na suposta corrupção de membros do Carf.

Patrícia afirmou que a sociedade era "informal" e que há indícios sobre isso no processo, como um e-mail em que Santos fala de atividades empresariais do grupo de lobistas. "A sociedade informal está bastante clara", afirmou Patrícia.

"Nós destruímos o relatório. A imprensa tem que mostrar que o relatório foi baseado em suposições", disse Leal à Folha, no intervalo da sessão.

A audiência na 10ª Vara Federal do Distrito Federal foi suspensa por volta das 12h00, mas deverá ouvir mais três testemunhas nesta quarta-feira (17).


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