Folha de S. Paulo


Conta de dono de cervejaria recebeu dinheiro de propina da Petrobras

Luiz Carlos Murauskas - 24.mai.2005/Folhapress
CERVEJARIA PETROPOLIS. SAO PAULO - MAIO 24: O presidente Walter Faria, da Cervejaria Petropolis, na fabrica em Boituva _ SP em 24 maio 2005, a empresa cresce e toma mercado da AmBev (Foto: Luiz Carlos Murauskas/Folha Imagem - 0614 - SP04923-2005,Snapfoto02;13, Dinheiro) ***Especial***
Walter Faria, dono do grupo Petropolis, responsável pela cerveja Itaipava

Uma conta suíça do empresário Walter Faria, 60, dono do Grupo Petropólis, fabricante da cerveja Itaipava, foi utilizada para depósitos de propina do esquema de corrupção descoberto na Operação Lava Jato.

A conta da empresa Headliner Limited recebeu US$ 3 milhões entre 2006 e 2007 da Piemont Investment, do lobista Julio Camargo.

Segundo denúncia do Ministério Público Federal, o número da conta foi indicado pelo lobista Fernando Soares, o Baiano, operador do PMDB no esquema que desviava recursos da Petrobras.

O período dos depósitos coincide com a aproximação do empresário ao PT após suas empresas sofrerem investigação por sonegação fiscal em 2005.

Em nota, a cervejaria Petrópolis disse "desconhecer essas informações". A conta de Faria recebeu quatro depósitos num intervalo de nove meses.

Dos US$ 14,5 milhões depositados em 35 operações feitas por Julio Camargo, a conta da Headliner foi a que mais recebeu (US$ 3 milhões).

Policiais federais tentam descobrir o caminho que este dinheiro seguiu. Uma das suspeitas é de que os recursos eram repassados a envolvidos no esquema.

Como a cervejaria recebe muito dinheiro vivo em seus pontos de venda, teria facilidade para o repasse da propina, suspeitam investigadores.

Documentos obtidos pela Folha mostram que a conta da Headliner era administrada por Maria Elena de Souza, 51, funcionária da distribuidora Praiamar Indústria Ltda., parte do grupo Petrópolis.

Moradora de um apartamento em Itu, Souza leva uma vida de classe média, distante de uma pessoa que movimenta milhões em contas no exterior.

Souza é profissional de confiança de Faria. Ela foi responsável, por exemplo, por coordenar em 2009 a compra de US$ 3 milhões em títulos da Odebrecht Finance, braço da Odebrecht nas Ilhas Cayman que negocia títulos da dívida brasileira no exterior.

Documentos obtidos pela reportagem que detalham operações financeiras da conta suíça da Headliner a vinculam a Faria.

APROXIMAÇÃO

Walter Faria foi preso em 2005 pela Polícia Federal, na operação Cevada, sob suspeita de sonegação fiscal e formação de quadrilha. Na ocasião, a PF investigou sonegação de impostos de R$ 1 bilhão da empresa. Após os dez dias que passou na carceragem da PF Faria iniciou uma aproximação com o governo do PT.

Em fevereiro de 2006, o empresário convidou o publicitário Marcos Valério para trabalhar na empresa. À época, ele ameaçava contar detalhes sobre o caso do mensalão.

Em outubro de 2008, Valério foi preso e denunciado pelo Ministério Público Federal na operação Avalanche. Segundo as investigações, ele liderou um grupo para tentar livrar a cervejaria de uma autuação de R$ 104 milhões por sonegação de impostos.

Para isso, se utilizou de delegados e policiais e forjou um inquérito contra os dois fiscais da Receita Federal. Propinas também seriam repassadas a políticos. O caso corre na Justiça Federal.

Com a saída do publicitário da empresa, o contato com os políticos do PT passou a ser feito por Faria.

Desde 2013, o ex-presidente Lula fez três palestras em empresas do grupo. O Instituto Lula disse que "todas as atividades legítimas, legais, contabilizadas, realizadas e com os devidos impostos pagos".

O grupo Petrópolis foi o quarto maior doador da campanha de reeleição de Dilma Rousseff em 2014 –doou R$ 17,5 milhões.

OUTRO LADO

O grupo Petrópolis disse em nota desconhecer os depósitos feitos nas contas suíças do empresário.

A Folha enviou perguntas ao empresário sobre as movimentações financeiras da Headliner, bem como o depósito feito por Julio Camargo.

"O grupo Petrópolis desconhece estas informações", disse a companhia, em resposta às cinco perguntas feitas pela reportagem.

O advogado Sérgio Riera, que defende o lobista Fernando Soares, o Baiano, afirmou que seu cliente entregará informações sobre todas as contas envolvidas nas investigações da operação Lava Jato que tem conhecimento.

Riera afirmou, contudo, não poder comentar casos específicos porque a delação premiada do lobista está sob sigilo de Justiça.

A Odebrecht diz não controlar as transações dos seus títulos no mercado secundário e nem participar das negociações. "Usualmente, as transações com terceiros são intermediadas pelas instituições financeiras", diz em nota.

Procurado, o advogado de Julio Camargo não foi localizado.

Responsável por administrar a conta da Headliner, Maria Elena de Souza, funcionária da distribuidora Praiamar Indústria, não foi localizada nos telefones em seu nome.


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