Folha de S. Paulo


'Trust' como o de Cunha costuma esconder corrupção, diz ONG

O modelo de contrato que o deputado Eduardo Cunha admite ter com um "trust" é um típico caso de esconder dinheiro da corrupção, diz relatório da Transparência Internacional, respeitada ONG global, sem citar nominalmente o presidente da Câmara.

O documento lamenta que o Brasil não tenha adotado até agora uma definição legal de "beneficial ownership" (propriedade beneficiária), exatamente o rótulo dos contratos entre Cunha e o "trust" e que, segundo a Transparência, é o termo técnico usado para descrever a pessoa ou pessoas realmente no controle dos fundos.

O texto é contudente: "Pegue qualquer grande escândalo de corrupção na história recente –Petrobras, Fifa e Viktor Yanukovych da Ucrânia– e você encontrará uma companhia secreta que foi usada para pagar subornos, desviar e esconder dinheiro roubado ou comprar imóveis de luxo em lugares como Londres ou Nova York".

Não por acaso, dois dos três escândalos citados envolvem o Brasil e/ou brasileiros, caso por exemplo, de José Maria Marin, o ex-presidente da CBF, proprietário, também não por acaso, de um imóvel de luxo em Nova York.

Para a Transparência, cerca de US$ 2 trilhões (R$ 7,5 trilhões) são lavados anualmente, a maior parte deles por meio de companhias cujo proprietário está escondido. É mais do que o PIB do Brasil, estancado em US$ 1,5 trilhão.

O documento foi divulgado na antevéspera da reunião de cúpula do G20, o grupo das 20 maiores economias do planeta, exatamente para criticar a inércia no enfrentamento do problema. Começa domingo, dia 15, em Antalya, no Mediterrâneo turco.

Na cúpula anterior, há um ano, os países do G20 se comprometeram a "desmantelar a estrutura legal que permite às sociedades, trusts e outras entidades legais anônimas (...) transferir e dissimular o dinheiro, frequentemente roubado", lembra a ONG.

Um ano depois, "os países estão atrasados nos aspectos mais essenciais que permitiriam saber quem está verdadeiramente por trás de uma sociedade".

Paradoxalmente, o Brasil, tão mal situado no relatório da Transparência, é o autor de proposta de combate à corrupção para ser incluída no comunicado final do G20 deste ano. Acompanha o Brasil a Itália, que também não goza de boa fama no capítulo corrupção.

A proposta ítalo-brasileira inclui compromissos com transparência, mecanismos adequados de queixas, instâncias de apelação administrativa e redução da burocracia nas concorrências públicas. São exatamente as concorrências públicas as fontes da maior parte dos desvios já descobertos na Petrobras.

Como as decisões do G20 não têm caráter vinculante, é razoável supor que os compromissos serão encampados pelos demais países. Resta saber se, na cúpula seguinte (China, 2016), a Transparência Internacional não vai, outra vez, denunciar o incumprimento das metas.


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