Folha de S. Paulo


Liga de futebol americano prospera com filho de Lula no negócio

João Sal - 5.mai.08/Folhapress
Luís Cláudio Lula da Silva, filho do presidente da República e assistente de preparação do Palmeiras, na festa de premiação dos melhores do Campeonato Paulista, no HSBC Brasil, em São Paulo (SP). (São Paulo (SP), 05.05.2008. Foto de João Sal/Folhapress)
Luís Cláudio Lula da Silva, filho do ex-presidente Lula, em foto de 2008

No domingo, 3 de outubro, o Vasco da Gama Patriotas enfrentou o T-Rex no Rio. A disputa atraiu pouco mais de 300 pessoas que pagaram R$ 10 para assistir à partida do Torneio Touchdown, organizado por Luis Cláudio Lula da Silva, 30 anos, filho caçula do ex-presidente Lula.

A despeito do público escasso de um esporte que engatinha no Brasil, a liga ostenta patrocinadores cobiçados, como a cerveja Budweiser e o energético TNT. Os valores das cotas são sigilosos.

"O site é amador, o público pequeno, o evento e os jogos não são transmitidos na tevê, por isso o retorno para patrocinadores é baixo", avalia o especialista em marketing esportivo Amir Somoggi.

"Mas o mercado de futebol americano pode ser o futuro e a NFL, liga norte-americana, é uma das mais valiosas do mundo, chegando a faturar US$ 50 milhões só com ingresso da final", pondera.

É com números como esses que Luis Cláudio justifica sua entrada no torneio, que viu a prosperidade chegar com ele, em 2011. A quantidade de times saltou de 7 em 2010 para 20 em 2014 e hoje está na marca dos 16.

Duas temporadas –de 2012 e 2013– foram televisionadas. Os clubes passaram a receber uma ajuda de custo anual de R$ 20 mil e dinheiro para confecção de uniformes.

No e-mail em que comunicou a fãs da modalidade a sociedade com Luis Cláudio, o criador do Touchdouwn André Adler, morto em 2012, disse que ele vinha para "elevar o potencial de captação".

Na mensagem também comemorou o fruto da parceria, a final da temporada de 2011 no estádio do Ibirapuera, em São Paulo. Na plateia do jogo estava Lula. Em entrevistas, o petista disse que, da mesma forma que o Brasil trabalhou para que o futebol brasileiro desse certo nos EUA, acreditava que o americano poderia vingar no Brasil.

Menos de dois anos depois o campeonato contava com sete patrocinadores. Além dos atuais TNT e Budweiser, investiam no Touchdown Tigre, Sustenta Energia, do grupo JHSF, Qualicorp e GOL.

Outra patrocinadora nos anos 2012 e 2013 foi a Caoa Hyundai, que segundo o jornal "Estado de S. Paulo" contratou o escritório de lobby Marcondes & Mautoni, investigado pela Polícia Federal e pela CPI do Carf, para obter a extensão da desoneração fiscal por meio de uma medida provisória que teria sido comprada por lobistas.

O escritório M&M também teve relações com Luis Cláudio. Em 2014, a M&M contratou a LFT Marketing Esportivo, a outra empresa do filho do ex-presidente, por R$ 2,4 milhões. Segundo Mauro Marcondes, sócio do escritório, um dos serviços prestados se referia a um projeto de um ônibus que circularia pelo Brasil durante a Copa do Mundo divulgando uma patrocinadora do mundial.

Os planos não saíram do papel. Outro trabalho foi a assessoria a um projeto para integrar modalidades esportivas em um centro de exposições que está sendo planejado no interior de São Paulo. "Considerei o valor caro, mas fiquei satisfeito com o resultado que ele me apresentou", afirmou Marcondes.

A realidade do Touchdown é bem diferente da vivida pela CBFA (Confederação Brasileira de Futebol Americano), entidade oficial do esporte que organiza desde 2012 um campeonato nacional paralelo ao do filho de Lula. Nas suas quatro temporadas realizadas, ela nunca angariou um patrocínio anual.

DIRETOR-GERAL

É de um escritório em um prédio comercial nos Jardins, em São Paulo, que Luis Cláudio gerencia suas duas empresas voltadas para o ramo esportivo: a Touchdown Promoções e Eventos Esportivos, que administra a liga de futebol americano, e a LFT Marketing Esportivo, dedicada a projetos para outras empresas.

Clientes relatam que o espaço tem três cômodos, poucos funcionários e o irmão Fábio Luis, o Lulinha, entre os vizinhos. O apelido é o mesmo que Luis Cláudio carrega nos gramados, apesar de rechaçá-lo.

Nos documentos da Touchdown, a empresa criada para gerenciar o torneio, Luis Cláudio aparece como "diretor-geral". Segundo donos dos times que participam da competição, é ele o responsável pelas principais atividades, como definição de locais onde acontecerão as partidas e prospecção de verbas. O valor captado não é partilhado com os times.

"Não sabemos quanto Luis Cláudio capta, mas parte disso é direcionado para nós", conta o presidente da equipe do Flamengo no torneio, Rogério Pimentel.

Formado em educação física, Luis Cláudio passou pelos principais clubes de futebol de São Paulo trabalhando como auxiliar de preparadores físicos.

O São Paulo foi o primeiro a abrir as portas para o filho do ex-presidente da República, que trabalhou ali por cerca de três meses. Luis Cláudio também atuou no Palmeiras quando Vanderlei Luxemburgo era técnico do time, em 2008. Em 2009, quando ingressou no Corinthians, ganhou mais visibilidade na imprensa com ajuda do clube.

Ricardo Stuckert - 11.dez.2001/Instituto Lula
Lula vai a evento esportivo em São Paulo promovido por um de seus filhos, em 2011
Lula vai a evento esportivo em São Paulo promovido por um de seus filhos, em 2011

EXPERTISE

O advogado de Luis Cláudio Lula da Silva, Cristiano Zanin Martins, afirmou que a atuação de seu cliente no Torneio Touchdown é "natural" por ele "ser um entusiasta do futebol americano" e isso se somar ao "potencial do esporte no Brasil".

Segundo o advogado, por Luis Cláudio ser formado em educação física e ter passagem pelos "maiores" clubes de futebol de São Paulo, "é evidente que ele tem uma visão do setor esportivo e que possa trabalhar com ela fazendo negócios como análises setoriais, projetos, prospecções, entre outros".

Sobre a captação de patrocínio para o campeonato, o advogado afirma que "em hipótese alguma o ex-presidente Lula chegou a se envolver na área" mesmo tendo um dos filhos como proprietário.

Martins também afirmou que a empresa Touchdown não abre valores e validade dos contratos por se tratar de uma atividade privada. "A relação (com os patrocinadores) é direta e compatível com a relação que as marcas têm com outros esportes de contato e esportes radicais", diz.

"O questionamento que a reportagem faz decorre mais de um preconceito de uma incapacidade dos filhos do ex-presidente de realizarem uma atividade empresarial concreta do que de um questionamento real", diz o advogado.

Procuradas, as empresas citadas na reportagem confirmaram que patrocinaram o Touchdown, mas se recusaram a informar os valores dos contratos. Elas também não responderam se o parentesco entre Luis Cláudio e Lula influenciou a decisão de fazer o investimento.

Questionada sobre o patrocínio ao Torneio Touchdown, a Caoa Hyundai confirmou que investiu nas temporadas 2012 e 2013 "da mesma forma que patrocina outros diversos eventos esportivos".

A Budweiser afirmou que é patrocinadora oficial da competição desde 2013 e que também investe em futebol americano em diversos países, "inclusive é a cerveja oficial da NFL, liga americana da modalidade".

A Qualicorp disse que patrocinou o Touchdown em 2013 como "parte de suas estratégias de marketing".

A Tigre confirmou o patrocínio nas temporadas de 2012 e 2013 "como parte do projeto de expansão de mercado e internacionalização da marca" devido ao futebol americano ser tradicional nos Estados Unidos, onde o grupo tem unidade.

As empresas Sustenta Energia, do grupo JHSF, e TNT, da Cervejaria Petrópolis, não responderam às perguntas enviadas pela Folha.


Endereço da página: