Folha de S. Paulo


'Sou o perdedor nacional', diz dono de frigorífico que faliu à CPI do BNDES

Presidente do frigorífico Independência, que entrou em recuperação judicial em fevereiro de 2009, três meses após receber aporte de R$ 250 milhões do BNDES, Roberto Russo disse que a entrada do governo no setor desequilibrou o mercado, quebrou a maior parte dos frigoríficos e beneficiou o JBS, que virou o maior grupo do mundo.

"Na política de campeão nacional, eu sou o perdedor nacional", afirmou Russo, na CPI do BNDES, nesta quinta (24). "Quando se faz uma política de campeão nacional e o governo arbitra, automaticamente cria-se uma política de perdedores", completou, ao ler uma lista de 17 frigoríficos que quebraram em 2008 e 2009, mesmo período em que JBS e Marfrig cresceram.

Campeões nacionais é como foram apelidados os grandes grupos que se tornaram líderes internamente e ganharam espaço no mercado externo com o apoio do governo petista. Segundo diretores do BNDES, essa foi uma política aplicada para vencer a crise financeira internacional de 2008 e 2009 e manter o crescimento no país.

Os deputados que compõem a CPI convocaram o presidente do frigorífico Independência para depor porque queriam investigar como e por qual razão o BNDES virou sócio de uma empresa que quebrou três meses depois. Suspeitava-se de alguma relação ilícita entre membros do frigorífico e do banco.

Russo, porém, disse que o Independência faliu justamente porque lhe faltou contatos e influência no BNDES. A sessão da CPI transformou-se, então, numa discussão sobre a eficácia da política intervencionista dos governos do PT.

'DESEQUILÍBRIO'

Segundo o empresário, com a entrada do governo no setor de frigoríficos, principalmente com investimentos no grupo JBS, os concorrentes –inclusive os grandes, como era o caso do Independência– precisaram se endividar muito para competir, criando um "desequilíbrio".

"O banco de desenvolvimento de um país não precisa ter ação de frigorífico. É um mercado equilibrado, que anda sozinho. No nosso caso, nós nos dávamos muito bem no mercado financeiro, com os bancos comerciais."

Russo afirmou que sua empresa também teve de recorrer ao banco estatal, já muito endividada, mas, segundo ele, o BNDES atrasou os investimentos combinados. Com o ambiente de crise, no final de 2008, a empresa não conseguiu suportar.

"O que foi combinado com o BNDES para julho [um investimento de R$ 400 milhões] foi postergado para novembro, e só veio a metade [R$ 250 milhões]. Sim, houve um atraso do banco, e, sim, a companhia já vinha alavancada também", disse Russo, sobre a ruína repentina.

Em recuperação, o Independência foi adquirido pelo grupo JBS em 2013. Consequentemente, disse Russo, o BNDES não teve perdas com o investimento, porque, como sócio do JBS, acabou lucrando muito mais com a aquisição que o campeão nacional fez da planta do Independência.

Questionado por deputados tucanos se a política aplicada pelo BNDES quebrou o setor de frigoríficos, Russo, apesar das queixas contra o governo, disse que queria "colocar a pergunta de outra forma". "E se não houvesse a política de campeões, como estaria o mercado?", disse. Mas ele admitiu que o desemprego no setor aumentou, devido às baixas de vários frigoríficos e a concentração em um só.

Os deputados, que no início da sessão queriam saber por que o banco investiu numa empresa próxima de quebrar, querem, agora, investigar por que o BNDES atrasou o investimento nela, como alegou seu presidente. Insinuaram suspeitar de uma ação premeditada do banco para favorecer o JBS.


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