Folha de S. Paulo


Em reação à oposição, governistas organizam frente contra 'golpismo'

Pedro Ladeira/Folhapress
A presidente Dilma Rousseff durante encontro com líderes da base aliada, em Brasília
A presidente Dilma Rousseff durante encontro com líderes da base aliada, em Brasília

Cinco dias depois de os principais partidos de oposição lançarem um movimento pelo impeachment da presidente Dilma Roussseff, seis legendas governistas organizaram um café da manhã nesta terça-feira (15), na Câmara dos Deputados, em defesa do mandato da petista.

Participaram os presidentes do PT, Rui Falcão, do PSD, o ministro Gilberto Kassab (Cidades), do PC do B, Luciana Santos, do Pros, Moacir Bicalho, além do líder da bancada do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), do líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), e do senador Valdir Raupp (PMDB-RO).

No ato, organizado pelo PC do B, a oposição foi acusada de adotar práticas radicais e golpistas. Também esteve presente o deputado Agnaldo Ribeiro (PP-PB). Ao final, aprovou-se um manifesto, entregue a Dilma nesta terça.

"Existe a vontade do eleitor, que se manifesta através das eleições, o governo faz o que pode para melhorar a condições do país, vivemos uma conjuntura econômica difícil, mas não podemos de forma alguma macular o fortalecimento da democracia com ações que não estão compatíveis com a legalidade e o perfeito funcionamento das instituições. Não é por que alguém acha que o governo não vai bem que tem o direito de tirar o mandato à força", disse Kassab.

O líder da bancada do PMDB afirmou acreditar que Dilma está "100% firme no cargo" e também se posicionou claramente contra a proposta de impeachment.

"O PMDB tem longa tradição democrática. Nos momentos mais duros da vida nacional, abrigou todos aqueles que defendiam a liberdade, as garantias individuais, o estado de direito. O PMDB é guardião da Constituição, das garantias individuais, e sobretudo do mandato. Eu tenho a percepção, que é a corrente do PMDB, que eleição se disputa até as 17h do dia do pleito, após isso tem que se respeitar o resultado das urnas. Tem que respeitar o mandato legitimamente advindo do voto popular", disse Leonardo Picciani.

A posição do deputado difere da do também peemedebista Eduardo Cunha (RJ), presidente da Câmara, que nos bastidores sinaliza estar alinhado com a oposição na tentativa de dar curso a um processo de impeachment.

"Esse é um ato de extrema importância porque é de defesa da democracia, um valor conquistado a duras penas pelo povo brasileiro. Mais do que os partidos, tenho certeza de que a maioria do povo brasileiro se manifesta contra todo tipo de golpismo, venha de onde vier", afirmou o presidente do PT, Rui Falcão.

Segundo pesquisa do Datafolha de agosto, porém, 66% da população acha que o Congresso deveria abrir um processo de impeachment contra Dilma.

MANIFESTO

No ato desta terça, os governistas aprovaram um manifesto que foi entregue em mãos a Dilma na reunião que a presidente fez no Palácio do Planalto com os congressistas aliados. O objetivo da presidente neste encontro foi apelar pela aprovação no Congresso do pacote de ajuste fiscal anunciado nesta segunda (14).

O manifesto acusa a oposição de patrocinar uma nova forma de golpismo, abusando "de mecanismos solertes da mentira, dos factóides e das tentativas canhestras de manobras pseudo-jurídicas".

Nos bastidores do Planalto, Dilma ouviu reclamação de falta de diálogo. A avaliação é a de que está difícil resolver a crise com a base. "Vamos trabalhar pelo menos para amenizar", disse um ministro.

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Leia, abaixo, a íntegra do manifesto entregue pelas legendas governistas a Dilma.

Declaração em Defesa da Democracia e do Mandato Popular

Nós, representantes dos partidos que dão sustentação ao governo legítimo e democrático da presidenta Dilma Rousseff,

CONSIDERANDO que a presidenta Dilma Rousseff tomou posse, há pouco mais de oito meses, para um mandato de quatro anos, após vencer um pleito democrático, limpo e livre;

ASSINALANDO que é dever cívico, constitucional e democrático da presidenta da República honrar o mandato a ela concedido pelo povo brasileiro até o seu final;

ENFATIZANDO que o cumprimento do mandato obtido legitimamente nas urnas significa, sobretudo, respeito ao voto popular, base de qualquer democracia digna desse nome;

LAMENTANDO, contudo, que, desde a apuração dos resultados das urnas, forças políticas radicais, que exibem baixo compromisso com os princípios democráticos, venham se dedicando diuturnamente a contestar e questionar o mandato popular da presidenta Dilma Rousseff, utilizando-se dos mais diversos subterfúgios políticos e jurídicos, que vão desde o absurdo e inédito questionamento da urna eletrônica, lisura do pleito até a tentativa de criminalização de práticas orçamentárias em um contexto de crise fiscal e utilizadas por vários governos no passado, incluindo a contestação intempestiva das contas de campanha previamente aprovadas na justiça eleitoral;

CONSIDERANDO que tal processo se constitui numa clara e nova forma de golpismo, a qual, embora não se utilize mais dos métodos do passado, abusa dos mecanismos solertes das mentiras, dos factóides e das tentativas canhestras de manobras pseudo-jurídicas para afrontar o voto popular e a democracia;

COLOCANDO EM RELEVO que, embora manifestações populares que expressem anseios e insatisfações sejam legítimas, elas não podem servir de escusa torpe e oportunista para que invistam contra o mandato legítimo da presidenta, pois a ordem constitucional brasileira sabiamente impõe processo rigoroso e fundamentos jurídicos muito sólidos para a recepção de contestações de mandatos populares;

SALIENTANDO, ademais, que, num regime presidencialista, a legitimidade do mandato é dada exclusivamente pelas urnas, não podendo ficar ao sabor de pesquisas de opinião que retratam uma conjuntura econômica adversa e impactada pelo crise internacional associada a volatilidade de uma crise política artificialmente cevada por aqueles que se recusam a reconhecer sua derrota na última eleição;

OBSERVANDO, a esse respeito, que o principal entrave ao reequilíbrio das contas públicas e à consequente retomada do crescimento econômico com distribuição de renda, como é o desejo de todos os brasileiros, reside no atual clima político deteriorado, gerado pelo golpismo que tenta se impor sobre a governabilidade e que dissemina sentimentos de insegurança, pessimismo e intolerância política por toda a sociedade;

CONVICTOS de que a presidenta Dilma Rousseff, cidadã incontestavelmente proba, honrada e dedicada, de forma integral, a trabalhar pelo bem do Brasil, fez avanços notáveis em seu governo para promover o combate à corrupção, ao fortalecer as instituições de controle e ampliar a transparência da administração pública, algo que seus críticos nunca fizeram;

CERTOS, do mesmo modo, de que a presidenta Dilma Rousseff, a qual enfrenta, desde o início de seu primeiro mandato, a pior crise mundial desde a Grande Depressão de 1929, esteve e está sinceramente empenhada, como o ex-presidente Lula, na promoção do desenvolvimento econômico com eliminação da pobreza e redução das desigualdades, processo até aqui exitoso, pois resultou na extinção prática da miséria e na ascensão social de 40 milhões de brasileiras e brasileiros, o que demonstra que os acertos desses governos progressistas foram muito superiores aos seus erros; e

CONSIDERANDO, por último, que é chegada a hora de todas forças sociais e políticas efetivamente comprometidas com o Brasil e sua democracia reafirmarem sua inestimável e bem-vinda contribuição para que o país supere suas atuais dificuldades e retome, o mais rapidamente possível, o desenvolvimento econômico e social, num ambiente de paz, reconciliação e respeito incondicional aos princípios democráticos;

DECLARAMOS:

I. Nosso firme e decidido apoio ao mandato legítimo da presidenta Dilma Rousseff, que se extinguirá somente em 31 dezembro de 2018;

II. Nosso mais veemente repúdio a toda forma de retrocesso democrático, que tente deslegitimar e encerrar de forma prematura o mandato popular conquistado, de forma limpa, em pleito democrático;

III. Nosso entendimento de que o Brasil demanda a superação do atual clima político deteriorado, o qual coloca sérios obstáculos à governabilidade e à recuperação econômica, dissemina a insegurança, o pessimismo, a intolerância e o ódio político pela sociedade, bem como envenena a democracia do país, duramente conquistada com a luta incansável de gerações de brasileiros;

IV. Nossa absoluta convicção de que o Brasil e sua democracia são muito maiores que as dificuldades econômicas e políticas que enfrentamos, e que o país superará, em breve, todos os entraves à retomada do desenvolvimento econômico e social, preservando e aprofundando o processo democrático do qual todos os brasileiros se orgulham e se beneficiam;

V. Nosso sincero convite a todas as forças políticas responsáveis do Brasil, que não apostam no "quanto pior melhor" ou não se omitem diante dos incapazes de apresentar propostas, a que dêem sua bem-vinda contribuição para que o país se reencontre no caminho do crescimento econômico, da justiça social, da soberania e do crescente aprofundamento de sua bela e jovem democracia.


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