Folha de S. Paulo


'Cabeças pretas' do PSDB viram estrelas do partido

Na semana passada, o PSDB divulgou um vídeo em que oito jovens deputados, de cara amarrada e afetando indignação, descem a rampa do Congresso recitando mazelas do governo Dilma Rousseff e dizendo que vão para a rua neste domingo (16). Alçados a estrelas da bancada do partido na Câmara, integram o grupo apelidado internamente de "cabeças pretas" do partido, em oposição aos "cabeças brancas" que compõem a cúpula e a bancada do Senado.

São cerca de 15 parlamentares tucanos que têm em comum o fato de terem entre 28 e 40 anos, serem quase todos estreantes na Câmara e virem de famílias de políticos tradicionais –o que mostra que a renovação é, na maioria dos casos, apenas geracional.

O grupo passou a ganhar espaço no partido ao cobrar da cúpula, principalmente do presidente da legenda e ex-presidenciável Aécio Neves (MG), atitudes mais ousadas na oposição e na defesa da interrupção do mandato de Dilma Rousseff.

Muitas das vezes em que Aécio subiu o tom e foi criticado por forças governistas ou por tucanos mais conservadores, o fez premido pelos novatos da Câmara.

O mineiro mantém a nova geração do partido sob sua influência. Designou os jovens para anunciarem o resultado da convenção que o reconduziu ao comando do partido, em julho, os escalou para estrelar a campanha de renovação da Juventude Tucana, engajou a turma na convocação para as manifestações e conta com eles na agenda de viagens que fará pelo país.

O resultado é que a ala nova do PSDB é "aecista", declara apoio ao senador numa já esperada disputa com o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, pela candidatura presidencial em 2018. Mas eles fazem críticas ao estilo do senador: consideram que ele teria de ser ainda mais incisivo na oposição a Dilma e que demora muito para apontar os caminhos.

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Em vídeo, parlamentares tucanos fazem críticas ao governo
Em vídeo, parlamentares da ala jovem do PSDB fazem críticas ao governo

Os cabeças pretas têm três musas: as deputadas Mariana Carvalho (RO), 28 anos, Shéridan Oliveira (RR), 31, e Bruna Furlan (SP), que, aos 32, é a "veterana" do grupo, por estar em segundo mandato. As três chegaram à política graças a laços familiares.

O mesmo currículo levou os "galãs" da turma a Brasília: Pedro Cunha Lima (PB), 27, é filho do senador Cássio Cunha Lima, Pedro Vilela (AL), 30, é herdeiro do ex-governador Teotonio Vilela, Arthur Virgilio Bisneto (AM), 35, é filho do prefeito de Manaus, Arthur Virgílio.

Como toda turma de jovens, os cabeças pretas andam em bando, vão à balada em Brasília, vivem casos amorosos e tiram onda pelo aplicativo WhatsApp.

Shéridan e Arthur Bisneto engataram um namoro depois da posse. Reservadamente, os deputados relatam paqueras malsucedidas –inclusive com investidas dos mais velhos da bancada, devidamente rechaçadas– e brincadeiras que chegam próximas ao "bullying", como a de fotografar uma tatuagem que Bruna Furlan tem no pé e que odeia.

Na semana passada, quatro deles receberam a missão de Aécio de reorganizar a juventude do PSDB. Eles vão tentar "quebrar conceitos atrasados" e "dar uma nova cara" para o grupo.

O senador vê neles uma peça-chave para a campanha de filiação que o partido iniciou na sexta e para a tentativa de aproximar o PSDB dos movimentos da rua. Mariana Carvalho e Pedro Vilela, por exemplo, estavam na primeira fila do evento em Maceió.

A nomeação de Mariana para uma das vice-presidências do PSDB também foi um reconhecimento a isso. O grupo também celebrou a indicação dela para presidir a CPI dos Crimes Cibernéticos, a primeira que o PSDB vai comandar desde o fim dos anos FHC.

Cunha Lima Jr repete o mantra de que o partido só ganha novamente uma eleição se "subir geograficamente e descer socialmente", mas rejeita a ideia de que só a esquerda governa para os pobres. "Fomos os responsáveis pela estabilização", diz.

Os jovens despertam um pouco de ciúmes. Um deputado com quase dez anos de Câmara diz: "São importantes para a gente, mas quando o Aécio quer escutar alguém a sério, mesmo, chama os quatro ou cinco de sempre".

MANIFESTAÇÕES

Os cabeças pretas são radicalmente anti-Dilma e também não aceitam a saída Michel Temer caso a presidente não se sustente. "Não vejo um respiro real do governo na sociedade, é só político. Para a sociedade as coisas estão esgotadas. O universo dos insatisfeitos só aumenta, dos que se percebem enganados. Esse governo vai cair de podre", diz Cunha Lima. 

"Não sei se o Michel Temer seria o melhor caminho, mas qualquer coisa é melhor que Dilma. Como está não pode ficar", diz Mariana Carvalho.

Segue a linha de Aécio de que o ideal seriam novas eleições. "Seria mais democrático, com o reconhecimento e o aval da maioria dos votos". 

Para Cunha Lima, as manifestações, ao se opor a partidos, criam um vácuo de poder que, se não for trabalhado, pode levar ao "caos". É nesse espaço que PSDB precisa aprender a trabalhar.

Mariana rejeita a pecha de golpista. "O partido não pode ficar parado, está dando voz institucional a um sentimento da população".

HÁBITOS

Eles costumam se sentar juntos no plenário, na primeira fila, nas cadeiras mais perto do centro, à direita. Como estudantes, usam o grupo "Jovens Deputados", do WhatsApp -que reúne 94 parlamentares, não só tucanos, e tem pouca política e muita zoeira-para avisar quando começam votações nominais, depoimentos de CPIs etc.

Não raro vão embora juntos, dividindo carros, no estilo das vans que buscam os funcionários da Câmara na chapelaria. Fizeram isso nesta semana, na terça-feira, depois da sessão. Saíram de lá e foram jantar.

Costumam combinar almoços e jantares entre eles. Os restaurantes preferidos são Piantas, Porcão e Rubayat. O bar das baladas é o Dudu Bar, na Asa Sul.

Alguns deles malham juntos na academia. Também vão a festas juntos. Fizeram comboios para o São João de Campina Grande e a festa do Boi de Parintins, à qual Aécio compareceu.

Diante do apelido, Arthur Bisneto não escapa da brincadeira da turma. "Ele é grisalho, né? Não é literalmente cabeça preta, mas pensa igual à gente", diz Cunha Lima.


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