Folha de S. Paulo


Presidente do TCU pediu vista em processo que interessava ao filho

Pedro Ladeira - 18.jun.2015/Folhapress
O presidente do TCU, Aroldo Cedraz ao lado do presidente do Senado, Renan Calheiros
O presidente do TCU, Aroldo Cedraz ao lado do presidente do Senado, Renan Calheiros

Investigadores da Operação Lava Jato suspeitam que o presidente do TCU (Tribunal de Contas da União), ministro Aroldo Cedraz, repassou informações sobre um processo de interesse da UTC Engenharia, empresa que teria pago propina a seu filho, o advogado Tiago Cedraz.

Em novembro de 2012, quando ainda não havia assumido a presidência do tribunal, Aroldo pediu vista de um caso envolvendo supostas irregularidades na licitação de uma das unidades da usina de Angra 3. Passados 15 dias, ele devolveu o processo ao plenário e se declarou impedido de julgá-lo.

Embora não tenha participado do julgamento, Aroldo pôde analisar por duas semanas o parecer do relator, ministro Raimundo Carrero, favorável à continuidade do processo licitatório.

O relator, como de praxe, havia liberado previamente seu voto aos outros ministros, de acordo com seu gabinete.

O procedimento de Aroldo é considerado pouco usual no TCU. Na maioria dos casos, ministros anunciam o impedimento assim que o processo entra na pauta, sem participar da tramitação.

O pedido de vista foi revelado pelo jornal "O Globo" na edição desta sexta-feira (17).

O processo em questão interessava diretamente a UTC, construtora líder do consórcio Una 3, um dos responsáveis pelas obras em Angra 3. A licitação discutida no TCU dizia respeito a um contrato de R$ 2 bilhões.

O dono da UTC, Ricardo Pessoa, preso por suspeitas de participação no esquema de corrupção da Petrobras, firmou um acordo de delação com o Ministério Público, em troca de redução das penas.

Em depoimento, o empreiteiro contou ter desembolsado R$ 1 milhão para Tiago, filho de Aroldo, ajudar na liberação do processo licitatório de Angra 3, que estava sendo analisado pelo tribunal.

Procurado pela reportagem, Tiago afirmou por e-mail que foi "consultado" por Ricardo Pessoa, para trabalhar neste caso, mas "sua contratação não foi efetivada".

Conforme a Folha revelou em junho, Pessoa ainda disse que, desde 2012, pagava R$ 50 mil por mês a Tiago para ter acesso a informações privilegiadas de processos do TCU.

SOLIDARIEDADE

Outro fato que chama a atenção dos integrantes da Lava Jato é a ligação de Tiago com o Solidariedade (SD). Ele é secretário de Assuntos Jurídicos do partido. Além disso, de acordo com Ricardo Pessoa, um dos pagamentos a Tiago foi feito por intermédio de Luciano Araújo, tesoureiro do SD.

Segundo os investigadores, Tiago é quem dá as orientações jurídicas da sigla e, por isso, será alvo da apuração.

Na terça-feira (14), a Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão na casa e no escritório de Tiago em Brasília.

Integrantes da Operação Lava Jato têm indícios de que o advogado fazia lobby no TCU em favor de outras empresas, além da UTC.

A suspeita é que, para não aparecer nos processos em que o pai atuava, ele prestava serviços a outros escritórios de advocacia, também vendendo informações sigilosas sobre processos.

OUTRO LADO

O presidente do TCU Aroldo Cedraz, e seu filho, o advogado Tiago, afirmam que não atuaram no processo de Angra 3 envolvendo a empreiteira UTC, de Ricardo Pessoa.

Aroldo Cedraz, em nota, afirmou que se declarou impedido, após o pedido de vista, com base no regimento interno do TCU. A nota cita um artigo que inclui, entre outros motivos para o afastamento em um processo, a parte envolvida ter como advogado algum parente do ministro.

Também em nota, Tiago Cedraz afirmou que seu pai nunca lhe passou informações sobre processos e que seu escritório de advocacia não chegou a atuar no caso de Angra 3, tendo sido apenas consultado por Pessoa.

Tiago afirmou que detalhes do processo são fornecidos aos demais ministros sem necessidade de pedido de vista.

Sobre as acusações de Pessoa, o escritório Cedraz Advogados afirma que nunca atuou para o grupo UTC no TCU. Diz ainda que processará Pessoa "pelas mentiras lançadas no bojo de uma delação premiada forjada para atenuar ilícitos confessados".

Em nota, o Solidariedade disse que "desde já elimina a possibilidade de afastamento do tesoureiro nacional, Luciano Araújo, e do secretário de Assuntos Jurídicos, Tiago Cedraz". A nota, assinada pelo presidente da legenda, Paulinho da Força (SP), diz ainda que a delação de Pessoa é "baseada em mentiras".


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