Folha de S. Paulo


Trajetória de contador é ligada a suspeitos em casos de corrupção

Em meados de junho, José João Appel Mattos foi ouvido pela Polícia Federal como testemunha em um dos inquéritos mais espinhosos que tramitam no STF (Supremo Tribunal Federal) como desdobramento da Operação Lava Jato: o que apura suposto envolvimento do presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), no esquema da Petrobras.

Appel é o homem das correções de declarações de Imposto de Renda e solução de dúvidas contábeis de protagonistas de alguns dos principais escândalos do país nos últimos dez anos.

A presença em casos rumorosos tem sido uma constante na trajetória recente desse contador de 60 anos, nascido em Santa Maria (RS) e com escritórios em Brasília e no Rio Grande do Sul que atendem, segundo seu currículo, mais de 650 clientes, incluindo políticos e empresas.

O contador foi citado no processo do mensalão, em 2005, atuou em defesa de Renan nas investigações sobre as suspeitas de enriquecimento ilícito do senador, em 2007, e, mais recentemente, foi um dos alvos da investigação sobre o relacionamento do governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), com o empresário Benedito Rodrigues, o Bené.

Appel prestou serviço para quatro empresas ligadas a de Bené, incluindo a que registrou o avião turboélice no qual a PF apreendeu dinheiro em espécie nas eleições de 2014.

Por causa dessas ligações, os escritórios de Appel foram vasculhados pela PF quando a Operação Acrônimo, que investiga Pimentel e Bené, que negam irregularidades, foi deflagrada. O material recolhido continua sob análise.

Samuel de Oliveira/CFC
José João Appel (ao centro) em lançamento de livro de livro de sua autoria
José João Appel (ao centro) em lançamento de livro de livro de sua autoria

No inquérito que tramita no STF, Appel foi ouvido como responsável pela contabilidade de um advogado de Brasília, Paulo Baeta Neves, que recebeu R$ 6 milhões de um escritório de advocacia do Rio de Janeiro que havia trabalhado em acordo entre a Petrobras e duas empresas de profissionais que ajudam na chegada de navios a portos. Elas cobravam da estatal cerca de R$ 60 milhões por supostas dívidas.

O acordo saiu depois que o deputado federal Aníbal Gomes (PMDB-CE), aliado de Renan, procurou o então diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa. Um dos atuais delatores da Lava Jato, Costa afirmou ter ouvido de Aníbal que Renan seria um dos beneficiados com o pagamento da dívida.

No depoimento à PF, Appel disse que não sabe o destino dos recursos pagos.

Segundo assessores de Appel, ele atuou nas investigações promovidas em 2007 sobre Renan como "assistente técnico indicado" pela defesa do senador, com o objetivo de refutar as perícias realizadas pelo INC (Instituto Nacional de Criminalística) da PF. O advogado do senador naquele caso, com quem Appel trabalhou, era o mesmo Baeta Neves agora sob o foco da Lava Jato no STF. O advogado ainda não foi ouvido pela PF.

A assessoria de Appel diz que ele nunca foi processado nem condenado pelos casos em que atuou. Sobre a Acrônimo, disse que a relação do contador com Bené era "meramente profissional".

A assessoria disse que Appel é procurado por políticos e empresários por ser "um dos mais capacitados profissionais" de contabilidade.

OUTRO LADO

Nesta segunda-feira (13), Renan rebateu as acusações por meio de uma nota: "O Senador Renan Calheiros reitera que suas relações com todas as empresas públicas e seus diretores nunca ultrapassaram os limites institucionais. Da mesma forma reafirma que jamais autorizou o deputado Aníbal Gomes ou qualquer outra pessoa a falar em seu nome", afirma o texto.

Na nota, o presidente do Senado diz haver ainda uma clara contradição no depoimento de Paulo Roberto Costa, "já que nos depoimentos anteriores o delator sempre negou ter tratado de projetos e valores com o senador Renan Calheiros."


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