Folha de S. Paulo


Planalto segura rebelião na base, e pacote fiscal avança na Câmara

Beto Barata/Folhapress
Deputados recolhem as notas de 'petrodólares' atiradas no plenário por integrantes da Força Sindical
Deputados recolhem as notas de 'petrodólares' atiradas no plenário por integrantes da Força Sindical

Após superar ameaças generalizadas de rebelião em sua base de apoio, principalmente no PT e no PMDB, o governo Dilma Rousseff conseguiu aprovar na noite desta quarta-feira (6), em uma tumultuada sessão no plenário da Câmara dos Deputados, o texto principal do primeiro item do seu pacote de ajuste fiscal.

Por margem apertada, 252 votos a 227, os deputados federais aprovaram a medida provisória 665, que traz como principal medida o aumento do tempo de trabalho para que a pessoa requeira pela primeira vez o seguro-desemprego: de seis para 12 meses –o governo queria originalmente 18 meses, mas foi obrigado a recuar.

Após o anúncio do resultado, a oposição cantou nos microfones: "O PT pagou com traição a quem sempre lhe deu a mão". Depois, promoveu um panelaço no plenário.

Ainda há emendas, que podem alterar completamente o texto, a serem votadas na tarde desta quinta-feira (7).

As medidas de equilíbrio das contas públicas, elaboradas sob a chefia do ministro Joaquim Levy (Fazenda), tinham o objetivo de, ao todo, cortar R$ 18 bilhões em gastos, mas mudanças patrocinadas pelos Congressistas já reduziram essa economia prevista em cerca de 20%.

A resistência às propostas que restringem direitos trabalhistas e previdenciários foi impulsionada pelo próprio partido de Dilma, o PT, o que deu a senha ao principal aliado, o PMDB, para também ameaçar uma rebelião.

Segundo relatos obtidos pela Folha, aliados também aproveitaram a votação para exigir do Palácio do Planalto a nomeação de correligionários para cargos federais. O PP, por exemplo, chegou a indicar votação contra o governo durante a sessão, mas depois recuou. Líderes do partido foram recebidos pelo vice-presidente Michel Temer (PMDB), coordenador político do governo, que prometeu destravar o atendimento dos pleitos.

TORTURA

Já os petistas aprovaram o apoio ao projeto após muita resistência interna. Alas do partido mais ligadas à classe trabalhadora queriam evitar o desgaste. Nas fileiras do partido, por exemplo, está o deputado Vicentinho (SP), ex-presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores). Por isso, o partido havia anunciado na terça o apoio, mas não exigia fidelidade.

Irritado, o PMDB cobrou, para continuar apoiando o pacote, o chamado "fechamento de questão" dos petistas, o que prevê punição a eventuais traições. Essa exigência foi feita à liderança da bancada petista pelos principais ministros de Dilma e por Temer (PMDB), em reunião na manhã desta quarta.

Acuado, o PT reuniu novamente sua bancada e aceitou "fechar questão". Nos bastidores, porém, assegurou aos deputados que não haveria punição a eventuais traições.

Realizado em um dos plenários da Câmara, o encontro foi tenso. Do lado de fora era possível ver deputados gesticulando bastante e, em alguns momentos, discursos eram feitos em tom bastante inflamado.

Foi possível, por exemplo, escutar parte da fala do deputado Luiz Couto (PT-PB): "Querem jogar o PT na parede. (...) Querem torturar, depois matar, acabar", discursou. A possível referência é ao PMDB, partido que tem patrocinado rebeliões contra Dilma sob o comando do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

PETRODÓLARES

Na votação no plenário, o PT foi bastante atacado pela oposição. Integrantes da Força Sindical, do deputado Paulo Pereira da Silva (SDD-SP), ocuparam as galerias e exibiam cartazes de petistas com a expressão "procurados".

Antes do final da votação eles foram retirados do plenário após ampliarem os protestos e derrubarem sobre os deputados uma "chuva de petrodólores", réplicas de notas com as fotos de Dilma e do ex-presidente Lula, entre outros, em referência ao escândalo do petrolão.

"A presidente Dilma deveria mandar para esse Congresso uma medida provisória que tivesse em seu primeiro artigo a proibição de que o chefe de Estado minta. Essa é a reforma que o governo Dilma deveria produzir", discursou o deputado Bruno Araújo (PSDB-PE), líder da bancada da oposição. Ele resumiu em sua fala o mote de todos os partidos contrários à petista, o de que Dilma promove um estelionato eleitoral ao, diferentemente do que prometeu na campanha, reduzir direitos dos trabalhadores.

O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), fez a defesa do pacote: "Não estamos votando qualquer coisa para o governo, estamos votando uma matéria em que o que está em jogo é o futuro do Brasil. Queremos sinalizar aos trabalhadores que não estamos tirando direito dos trabalhadores e das trabalhadoras, estamos votando ajustes em nome da responsabilidade pública que a presidente Dilma tem com o Brasil."

AJUSTE

Em meio à crise econômica e política –a gestão federal tem uma das piores avaliações populares da história–, o governo tem no pacote fiscal a sua principal ação legislativa neste início do segundo mandato de Dilma.

As propostas originais, porém, já foram esvaziadas na análise da comissão mista do Congresso, passo anterior à votação no plenário da Câmara.

A MP 665, votada nesta quarta pela Câmara, traz, além da questão do seguro-desemprego, endurecimento da regra para concessão do abono salarial. Até então, a exigência do tempo mínimo trabalhado para ter acesso ao benefício era de um mês. O governo queria ampliar para seis, mas o Congresso reduziu para três.

Sobre o seguro-defeso –benefício concedido a pescadores no período de restrição à pesca–, o governo também queria dificultar o acesso, mas o Congresso não deu sequência à tentativa.

Compõem ainda o pacote de Dilma a MP 664, que restringe direitos previdenciários, e o projeto de lei que revê a política desoneração da folha de pagamento de setores da economia. Nenhuma delas ainda foi votada pelo plenário da Câmara.

Editoria de Arte/Folhapress

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