Folha de S. Paulo


TCU decide fazer uma fiscalização 'efetiva e direta' nas contas da Itaipu

Caio Coronel/Divulgação
Turistas observam o vertedouro da usina de Itaipu, que fica na fronteira entre Brasil e Paraguai
Turistas observam o vertedouro da usina de Itaipu, que fica na fronteira entre Brasil e Paraguai

Acuado pelo escândalo da Petrobras, o governo tem pela frente outro foco de preocupação. Pela primeira vez desde que a usina hidrelétrica foi inaugurada, em 1982, o Tribunal de Contas da União decidiu iniciar uma fiscalização "efetiva e direta" sobre as contas da Itaipu Binacional.

Em janeiro, os ministros do TCU aprovaram a realização de um levantamento "in loco" em Itaipu, em Foz do Iguaçu (PR). A portaria que deve autorizar a atividade, contudo, ainda não foi publicada. Sem ela, os auditores não podem começar a agir.

Até a decisão, o tribunal se limitava a cobrar esclarecimentos pontuais por meio da controladora da usina, a Eletrobras. Os auditores não podem entrar no prédio de Itaipu para se envolver diretamente na fiscalização, ao contrário do que é feito em quase toda a máquina pública federal.

Com a nova decisão, o TCU tem 90 dias para, em um primeiro levantamento, determinar as áreas prioritárias para uma apuração mais aprofundada, a ser feita por meio de uma auditoria.

O levantamento inclui encontros pessoais com representantes da empresa e recolhimento de informações preliminares para estabelecer um plano de trabalho.

O TCU já apontou dúvidas sobre a fiscalização da Eletrobras; viu "ausência de análise efetiva" das demonstrações financeiras e relatório anual da empresa. Para o TCU, o papel da Eletrobras é "predominantemente homologatório, de mera aprovação formal dos documentos enviados por Itaipu".

Sobre a composição do conselho de administração de Itaipu, o TCU apontou o "não exercício do direito de indicação da Eletrobras" e "ausência de fluxo definido de informações entre conselheiros de administração da Itaipu e Eletrobras".

CAIXA PRETA

Detalhes dos gastos e da gestão da usina são uma caixa preta para o TCU. O comando da empresa há mais de 12 anos é um reduto do PT. Nesse período, a empresa teve como diretor-geral brasileiro a mesma pessoa, Jorge Samek, ex-deputado federal eleito pelo PT em 2002 e amigo do ex-presidente Lula.

O tesoureiro nacional do PT, João Vaccari Neto –tornado réu em uma das ações penais derivadas da Operação Lava Jato, ocupou por quase 11 anos o cargo de conselheiro de Itaipu. Só foi exonerado em janeiro, após ter sido alvo de denúncias no escândalo da Petrobras.

O ex-gerente de engenharia da petroleira Pedro José Barusco Filho estimou que Vaccari recebeu, em benefício do PT, de US$ 150 milhões a US$ 200 milhões em propinas pagas pelas empreiteiras envolvidas no esquema.

Na declaração de voto na sessão do TCU, o ministro-substituto André Luís de Carvalho afirmou que "surge perante o TCU [...] a oportunidade de se dar um decisivo passo adiante, com vistas a promover uma efetiva atividade de fiscalização sobre as contas nacionais de Itaipu".

O ministro afirmou que há notícias de que, ao contrário do Brasil, o lado paraguaio da usina já "se submete à fiscalização financeira" pelo governo do Paraguai.

Carvalho propôs a tese de máxima eficácia para o cumprimento da Constituição, na ausência de uma proibição específica do Tratado Binacional quanto à impossibilidade de fiscalização da usina pelo TCU. Ele disse que "a eventual ausência de critérios para a fiscalização, no âmbito desse tratado, também não pode resultar no afastamento da aludida competência constitucional fiscalizadora".

A proposta de Carvalho, aprovada por unanimidade pelos seus colegas, incluiu "uma ação fiscalizadora efetiva e direta, inicialmente na modalidade de levantamento, sobre as contas nacionais da empresa". Em acórdão, os ministros decidiram que a Secretaria de Controle Externo irá promover "fiscalização na modalidade levantamento, sobre as contas nacionais da empresa Itaipu Binacional".

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Vista aérea mostra da usina hidrelétrica de Itaipu, em Foz do Iguaçu (PR)
Vista aérea mostra da usina hidrelétrica de Itaipu, em Foz do Iguaçu (PR)

OUTRO LADO

A assessoria de Itaipu informou que a empresa não se opõe a um controle externo de suas contas, mas frisou que há 40 anos o modelo empregado é amparado na Constituição e no Tratado de Itaipu Brasil-Paraguai. A empresa informou ter sido notificada oficialmente da nova medida do TCU, mas ainda não decidiu se adotará alguma medida jurídica contra a decisão.

"Note-se que Itaipu já tem mecanismos de controle interno e externo, frutos dos necessários entendimentos entre os dois países, Brasil e Paraguai, sócios no empreendimento. Por outro lado, a Itaipu tem entre suas políticas e diretrizes fundamentais a responsabilidade e prestação de contas às sociedades brasileira e paraguaia e o respeito aos valores éticos", afirmou a empresa em nota.

A assessoria informou ainda que uma auditoria interna da Itaipu, subordinada diretamente ao Conselho de Administração, "atua conforme planejamento e demandas definidos conjuntamente por nacionais dos dois países, e mediante equipes de auditores mistas, sempre compostas por brasileiros e paraguaios".

O TCU afirmou que o tribunal já comunicou a decisão aos ministros da Casa Civil, de Minas e Energia e das Relações Exteriores, mas a data de início da fiscalização e a equipe que fará o trabalho ainda não foram definidas.

A assessoria da Eletrobras informou que ainda não foi comunicada sobre a decisão do TCU, mas que a empresa "já realiza os trabalhos referentes à Itaipu Binacional conforme previsto no Tratado da Binacional". A empresa disse ainda que "não discute" as decisões do TCU.


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