Sem avisar Dilma Rousseff, o presidente do Senado, Renan Calheiros (AL), surpreendeu o governo nesta segunda (2) ao cancelar sua participação no jantar oferecido pela petista à cúpula do PMDB duas horas antes do evento.
A recusa expõe mais um capítulo de desgaste da turbulenta relação do Palácio do Planalto com o maior partido aliado ao PT.
Segundo a Folha apurou, a anfitriã soube da notícia somente após o senador ter divulgado uma seca nota oficial à imprensa. Foram avisados por um telefonema de Renan na tarde desta segunda o vice-presidente, Michel Temer (PMDB-SP), e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
"Decidi abster-me do jantar entre o PMDB, a presidente da República e ministros, em que se discutirá a coalizão. O presidente do Congresso Nacional deve colocar a instituição acima da condição partidária. Considero o encontro como aprimoramento da democracia", diz o texto da nota.
Pedro Ladeira - 26.fev.2014/Folhapress | ||
Ao lado de Renan Calheiros (à esquerda), Lula deixa reunião com senadores do PMDB na quinta (26) |
Essa justificativa, entretanto, não foi usada por Renan nas inúmeras vezes em que ele compareceu ao Planalto para discutir termos da aliança e não necessariamente os interesses do Senado.
O gesto foi visto por peemedebistas como sinal de que o aliado reage a uma série de interesses não atendidos, como o de uma reunião exclusiva com Dilma, a perda de controle do Ministério do Turismo, onde um aliado seu será trocado, e a perda do "direito" de indicar um novo nome para a Transpetro, outro reduto de sua influência.
Outro motivo de insatisfação de Renan com o governo, segundo seus colegas, foi o envio da medida provisória que revisa a desoneração das folhas de pagamento ao Congresso na sexta-feira (27).
Para eles, Dilma voltou a adotar, como já fizera com o ajuste fiscal, a estratégia de tomar uma medida impopular e esperar que os parlamentares segurem as reações negativas no Congresso.
Já para o Planalto, a razão da ausência de Renan ao jantar é uma reação do PMDB à Operação Lava Jato.
Segundo relatos de interlocutores, Renan recebeu sinais nos últimos dias de que pode integrar a lista de políticos citados nas delações premiadas da operação.
Como a operação é conduzida pela Polícia Federal, subordinada ao governo, há entre governistas a leitura de que Renan pode estar demonstrando que vai culpar o Planalto se acabar envolvido na investigação.
A Procuradoria-Geral da República encaminha relação de nomes a serem investigados ao STF (Supremo Tribunal Federal) nesta terça.
O Planalto perdeu o controle que exercia sobre a Câmara com a eleição de cunha, que já causou diversas derrotas a Dilma em seu primeiro mês na presidência da Casa.
Renan, nos cálculos de aliados, serviria como um contrapeso a Cunha, mas agora parece num caminho de afastamento.
Na semana passada, Renan já havia afirmado que a coalizão em torno de Dilma estava "capenga". O ex-presidente Lula precisou vir a Brasília para reunir-se com a cúpula peemedebista, visando acalmar os aliados.
Os desgastes políticos se avolumaram nas últimas semanas, ampliando a insegurança do mercado sobre a capacidade de o Planalto aprovar no Congresso medidas para arrumar as contas da União.