Folha de S. Paulo


Vaccari 'operacionalizou' propinas ao PT, diz força-tarefa da procuradoria

Em representação protocolada na Operação Lava Jato, o Ministério Público Federal afirmou que o tesoureiro nacional do PT, João Vaccari Neto, "foi responsável por operacionalizar o repasse de propinas ao Partido dos Trabalhadores, decorrentes de contratos firmados no âmbito da Petrobras".

Ainda segundo os procuradores, Vaccari integrou um grupo de onze "operadores financeiros" que "movimentaram em seu nome e lavaram centenas de milhões de reais em detrimento da Petrobras".

A partir do documento, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal conseguiram ordem judicial do juiz federal Sergio Moro para desencadear nesta quinta-feira (5) a nona fase da Lava Jato, denominada My Way. Um dos principais elementos para a deflagração da operação foram os depoimentos prestados pelo ex-gerente da área de engenharia da Petrobras Pedro José Barusco Filho.

Mas os procuradores também citaram os depoimentos do doleiro Alberto Youssef e do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, segundo os quais Vaccari "era o operador responsável por viabilizar, no interesse do Partido dos Trabalhadores, o repasse de propinas decorrentes de contratos firmados pela Petrobras nos quais havia a participação da Diretoria de Serviços".

No despacho que autorizou buscas e apreensões e prisões cautelares, Sergio Moro afirmou: "A palavra de criminosos colaboradores deve ser vista com cuidado. Entretanto, no presente caso, reuniu o Ministério Público Federal um número significativo de documentos que amparam as afirmações acima, a maior parte consistente em documentos e extratos fornecidos pelos criminosos colaboradores".

Segundo o Ministério Público Federal, em peça subscrita por nove procuradores da República que integram a força-tarefa da Lava Jato, dez "operadores" representavam interesses de empreiteiras diversas, enquanto Vaccari atuava em favor do PT.

Os "operadores", segundo os procuradores, ajudaram a financiar Vaccari e o PT, o ex-gerente Pedro Barusco, o ex-diretor de Serviços Renato Duque e o ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa, dentre outros. Vários desses suspeitos, incluindo Vaccari, foram encaminhados coercitivamente na quinta-feira pela Polícia Federal para prestar depoimento nos autos da My Way.

Para os procuradores, as atividades desse grupo revelam "crimes de cartel, corrupção passiva e ativa, fraude em licitações, contra o sistema financeiro nacional, lavagem de dinheiro, falsidade ideológica e/ou documental e organização criminosa".

Alguns dos principais "operadores" apontados pelos procuradores são:

  • Zwi Skornicki era o "representante oficial" dos estaleiros Keppel Fels e da Floatec, segundo os procuradores, "bem como operador do pagamento de vantagens indevidas no âmbito do estaleiro" de 2003 a 2013. Ele também teria sido "o responsável pela transferência de valores a Barusco, em conta no Banco Delta, na Suíça, bem como ao Partido dos Trabalhadores, mormente por meio de João Vaccari". Segundo o depoimento de Barusco, o pagamento de propina nos contratos da Kepell Fels com a Petrobras atingiu US$ 14 milhões, dos quais US$ 12 milhões "foram transferidos por Zwi Skornicki para conta mantida pelo ex-diretor Renato Duque no Banco Delta". Barusco teria recebido "valores de US$ 4 milhões e US$ 2 milhões, em suas contas 'K' e 'T', no banco Lombard Odier" e no Delta.
  • Milton Pascowitch, segundo o Ministério Público, atuou como o "operador financeiro da empresa Engevix e do Estaleiro Rio Grande", fazendo transferências de uma empresa offshore MJP International Group, no banco UBS AG, nos Estados Unidos, para a conta da offshore Aquarius Partners Inc., mantido por Barusco no banco Pictet & Cie. Segundo o Ministério Público Federal, também fez depósitos por meio de contas da offshore Faralon Investing para a offshore Natiras Investments, de Barusco.
  • Shinko Nakandakari, de acordo com os procuradores, "atuou em favor das empresas Galvão Engenharia, EIT Engenharia e da Contreiras na operacionalização do pagamento de propinas decorrentes de contratos firmados com a Petrobras". Além disso, segundo depoimento do empreiteiro Erton Fonseca, da Galvão Engenharia, Nakandakari recebeu pagamentos "a título de propina a agentes públicos ligados à Petrobras". Erton anexou ao processo notas fiscais e ordens de pagamento para uma empresa controlada por Nakandakari, a LSFN, registrada em nome de seus filhos, num valor total de R$ 8,8 milhões. Erton disse que Nakandakari falava em nome do ex-diretor Renato Duque.
  • Mario Frederico Mendonça Góis, conforme os procuradores, "atuou como operador financeiro em nome de várias empresas e/ou consórcios de empresas contratadas pela Petrobras, notadamente em favor da Andrade Gutierrez, da Mendes Júnior, da Carioca, da Bueno Engenharia, da MPE/EBE, da OAS, da Schahin, da Setal e da UTC". Goes "tratava diretamente" com Pedro Barusco "o pagamento de propinas oriundas de contratos firmados entre a Petrobras e as referidas empresas". Ele entregava a Barusco "mochilas com grandes valores de propina em espécie", que variavam entre R$ 300 mil e R$ 400 mil. Porém, a "maior parte dos valores operacionalizados por Mario Góis se deu mediante transferências para contas bancárias no exterior, principalmente para as contas Maranelle e PHAD", mantidas por Gois no Banco Safra na Suíça, e Daydream, Backspin e Doletech Inc., sob controle de Barusco, "totalizando em operações mais de US$ 7,5 milhões".
  • Atan de Azevedo Barbosa, segundo o Ministério Público Federal, era "empregado de carreira aposentado da Petrobras, atuou no interesse da empresa Iesa Óleo e Gás como operador financeiro para o pagamento de propinas referentes aos contratos por ela firmados com a estatal". Contudo, de acordo com os procuradores, seu modo de atuação foi diferente do mantido por outros "operadores". Entre outubro de 2008 e abril de 2013, Barusco recebeu de Barbosa um pagamento mensal de US$ 29 mil "em decorrência dos contratos firmados pela Iesa com a Petrobras. Tais pagamentos foram efetuados na conta da offshore Reha Comercial Inc., no banco Safra, na Suíça, a partir da conta da offshore Heatherley Business Ltd., mantida por Atan Barbosa no banco Clariden Leu AG, na Suíça, totalizando aproximadamente US$ 1,97 milhão".
  • Bernardo Schiller Freiburghaus, segundo os procuradores, "auxiliou Barusco a remeter às suas contas na Suíça" aproximadamente US$ 2 milhões após a deflagração da Operação Lava Jato. Segundo o Ministério Público Federal, Freiburghaus "representava os bancos PBK, Royal Bank, Pictec e HSBC em um escritório no Brasil, tendo, inclusive, auxiliado Paulo Roberto Costa a abrir contas no exterior".

Outros "operadores" citados pelos procuradores são Cesar Roberto Santos Oliveira, dono da empresa GDK, Guilherme Esteves de Jesus, ligado ao estaleiro Jurong, Luis Eduardo Campos Barbosa da Silva, que atuava pela Alusa, Rolls Royce e SBM, e Augusto Amorim Costa, que, segundo o Ministério Público Federal, "atuou como operador financeiro no interesse de repasse de propinas pela Queiroz Galvão".

Em depoimento à PF e em notas à imprensa, Vaccari tem negado qualquer envolvimento com irregularidades e desvios de recursos da Petrobras.

Os depoimentos prestados pelos diversos "operadores" à Polícia Federal nesta quinta-feira ainda não vieram a público. Procurados pela Folha desde ontem, não foram localizados para falar sobre o assunto. Em novembro, os advogados de Nakandakari disseram que seu cliente não cometeu irregularidades.

O PT nega as acusações e diz que só recebeu doações legais.


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