Folha de S. Paulo


Justiça libera patrimônio do bicheiro João Arcanjo

Uma decisão do TRF (Tribunal Regional Federal) da 1ª Região, em Brasília, reverteu ordem da Justiça Federal de Cuiabá e liberou todo o patrimônio do bicheiro João Arcanjo Ribeiro, 63, que cumpre pena por crimes contra o sistema financeiro, homicídios e porte ilegal de armas.

O Ministério Público Federal estimou em mais de R$ 900 milhões os bens de Arcanjo –que incluem sociedade em um hotel em Orlando (EUA), um jatinho, apartamentos, fazendas e empresas.

Em 2014, Arcanjo foi condenado a 19 anos de prisão pelo assassinato do empresário Sávio Brandão, morto a tiros em 2002 ao sair do seu jornal, "Folha do Estado", (de Cuiabá), que vinha publicando reportagens com denúncias sobre seus negócios.

Em 19 de dezembro, o desembargador do TRF Olindo Menezes cassou uma liminar que ordenava a perda dos bens e determinou que o Ministério Público abrisse possibilidade de explicações ao bicheiro sobre o patrimônio.

"Ninguém (nem mesmo os condenados) será privado de seus bens sem o devido processo legal", escreveu o desembargador, afirmando que a discriminação dos bens "não pode ser feita de forma unilateral pelo MPF e pela União sem a possibilidade de defesa no primeiro grau".

A AGU (Advocacia-Geral da União), que atua no caso junto ao Ministério Público, disse que pedirá "em caráter de urgência" a manutenção do bloqueio, pois a devolução do patrimônio a Arcanjo "poderá ensejar sua dilapidação, uma vez que eles ficariam livres para alienação".

IMPÉRIO

Nascido em Jeroaquara (GO) e ex-policial civil de Campo Grande (MS), Arcanjo chegou a Cuiabá nos anos 80. Em pouco tempo ele conseguiu montar, segundo o Ministério Público, "um verdadeiro império". Ele recebeu da Assembleia Legislativa o título de "comendador" e controlava a banca de jogo do bicho Colibri e um cassino clandestino. Fundou uma série de firmas de "factoring" e criou um esquema de agiotagem.

Segundo os procuradores, o "comendador" tornou-se "reconhecido pela população como o dono do jogo do bicho e chefe do crime organizado" no Estado, além de manter negócios com deputados estaduais e prefeitos.

Em 2002, a Polícia Federal deflagrou a Operação Arca de Noé, com foco no bicheiro, que fugiu para o Uruguai. No ano seguinte, o juiz Julier Sebastião Silva condenou Arcanjo a 37 anos de prisão e decretou a perda de seus bens.

O inquérito apontou que Arcanjo e seu grupo são donos de 65% das cotas de um hotel nos EUA; um jato Cessna de R$ 7,3 milhões; cinco empresas de "factoring"; um shopping em Rondonópolis (MT); um condomínio de 12 prédios em obras em Cuiabá; duas fazendas; três postos de gasolina; lojas, lotes e apartamentos; e US$ 16 milhões (R$ 41,8 milhões) bloqueados em Nova York.

Editoria de Arte/Folhapress

JULGAMENTO

Preso no Uruguai em 2003, Arcanjo foi extraditado ao Brasil em 2006. Ele recorreu ao TRF da 1ª Região, que decidiu, com voto do relator Tourinho Neto, reduzir sua pena de 37 anos para 11 anos e 4 meses de prisão.

O tribunal também se posicionou contra a perda dos bens porque o Ministério Público poderia ingressar com medida própria para discriminá-los.

No início de 2014, o Ministério Público e a AGU entraram com pedido descrevendo os bens, acolhido pelo juiz Paulo Cézar Alves Sodré, que ordenou a perda dos bens.

Na petição acolhida pelo TRF, o advogado de Arcanjo, Zaid Arbid, disse que o acordo de extradição entre Uruguai e Brasil excluía a perda dos bens e que "esse arbitrário procedimento" praticamente decretou a "morte civil" de Arcanjo, que perdeu seus meios de subsistência.


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