Folha de S. Paulo


Petrobras abriu licitações sem ter projeto para obras

Investigação interna da Petrobras sobre o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) mostra que a estatal realizou as licitações do empreendimento antes da conclusão dos projetos básicos que permitiriam estimar os custos iniciais das obras.

No caso de uma das unidades do complexo, o projeto só ficou pronto um ano e meio depois da abertura da concorrência que indicou as empresas encarregadas das obras.

A auditoria da Petrobras foi iniciada em abril, depois que foi deflagrada a Operação Lava Jato da Polícia Federal, que investiga um vasto esquema de corrupção na estatal. O trabalho foi concluído em novembro e a empresa ainda estuda o que fazer para cobrar os prejuízos causados pelas irregularidades encontradas.

A investigação interna indicou que empreiteiras foram favorecidas nas licitações e depois, ao obter reajustes indevidos no valor dos contratos. Empresas que não atendiam critérios técnicos e regras definidas pela própria estatal nas licitações foram contratadas mesmo assim.

O ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, que foi preso no início das investigações e foi solto após aceitar colaborar com a Justiça, disse que as empresas contratadas para o Comperj pagaram propina a políticos e diretores e funcionários da Petrobras.

Ao todo, a auditoria da estatal verificou 30 contratos que somam R$ 21,8 bilhões, o equivalente a 77% dos contratos assinados para a construção do Comperj, um dos principais empreendimentos em execução na empresa.

A construtora Andrade Gutierrez, responsável junto com a Techint pelas obras da unidade que demorou um ano e meio para ter um projeto básico, foi citada por Paulo Roberto Costa como uma das empresas que participou do esquema de corrupção.

A investigação da Petrobras também apontou que, em nove contratos, houve sucessivas revisões de estimativa de preços após a abertura das propostas, feitas com justificativas inconsistentes.

"Tais estimativas, por vezes questionadas pelo responsável por sua elaboração, podem ter criado condições para direcionamento de contratos", dizem os auditores.

De acordo com a investigação, algumas concorrências foram conduzidas por comissões de licitação formadas por "membros sem qualificação e experiência em contratações de grande porte".

A auditoria concluiu ainda que foram estabelecidos "prazos irrealistas" para a construção do Comperj. Isso levou à necessidade de ajuste de prazos e comprometeu a qualidade das licitações e contratos, diz o relatório.

OUTRO LADO

Procurada, a Petrobras declarou, por meio de sua assessoria, que não iria se manifestar sobre o relatório. A reportagem não localizou representantes da Techint.

A Andrade Gutierrez informou que não tem como discutir o resultado da auditoria por não conhecer o relatório.

Por meio de nota, a empreiteira afirmou que "todos os contratos da empresa com a Petrobras foram realizados dentro dos processos legais de contratação e nega qualquer irregularidade".

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A AUDITORIA - O QUE DIZ A ESTATAL

  • A investigação A auditoria teve início em abril e foi concluída em novembro. Envolveu a verificação de 30 contratos no valor de R$ 21,8 bilhões
  • Licitações sem projeto A investigação apontou que as licitações das unidades foram conduzidas bem antes que os projetos básicos tivessem sido concluídos
  • Antecipações A contratação das unidades de processo foi antecipada sem que o modelo de negócio a ser adotado estivesse definido, o que trouxe perdas
  • Aditivos Em 9 processos licitatórios ocorreram sucessivas revisões nas estimativas de preços, mas as justificativas listadas eram inconsistentes
  • Concorrentes Também foram incluídas nas licitações empresas que não atendiam os critérios fixados pela própria estatal. Seis delas venceram os processos
  • Comissões As comissões de licitação foram criadas com membros sem a necessária qualificação

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