Folha de S. Paulo


Homens tidos como desaparecidos foram mortos na ditadura, diz comissão

Na véspera de publicar seu relatório final, a Comissão Nacional da Verdade informou nesta terça-feira (9) ter concluído que dois homem tidos até agora como desaparecidos foram na verdade mortos pela ditadura militar (1964-1985). Até agora, o grupo havia identificado a morte de apenas um outro desaparecido.

O primeiro novo caso é de Joel Vasconcelos Santos, militante do PC do B, desaparecido em março de 1971, foi de fato morto pelo regime.

Por meio de um laudo papiloscópico, terminado na segunda (8), a comissão concluiu que as digitais de Santos coincidem com as digitais de um homem que deu entrada no IML do Rio de Janeiro no mesmo dia dias após a prisão de Santos. Essas digitais constam de um grupo de fichas de digitais localizado pela comissão.

Laudo necroscópico da época indicou que o homem morrera por "contusão de tórax e abdome com fratura de costelas, ruptura de pulmão esquerdo e fígado, hemorragia interna e anemia aguda". Esse homem, indicam documentos, dera entrada como suposta vítima de atropelamento, e terminou sepultado como indigente.

"Diante das circunstâncias das investigações realizadas, conclui-se que Joel Vasconcelos Santos foi submetido a prisão, tortura e desaparecimento nas dependências do DOI-CODI, no Rio de Janeiro, em um contexto de sistemáticas violações aos direitos humanos". É feita a recomendação para que sua certidão de óbito seja alterada.

O segundo novo caso é de Paulo Torres Gonçalves, que não era militante político e desapareceu em março de 1969, antes ir para o colégio. O Grupo Tortura Nunca Mais achou documentos mostrando que ele tinha sido de fato preso por militares.

Assim como no caso de Joel, a comissão identificou suas digitais numa ficha de uma pessoa enterrado como indigente no cemitério da Cacuia, na Ilha do Governador (RJ).

Nos dois casos, as ossadas ainda têm de ser localizadas.

STUART ANGEL

A comissão anunciou também novos dados do caso Stuart Edgar Angel Jones, filho da estilista Zuzu Angel, membro do MR-8 e sequestrado em maio de 1971. Ele é um dos mais famosos casos de desaparecidos durante o regime.

Seguindo dicas recebidas de militares sobre a prisão de Angel na Base Aérea de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, peritos da comissão fizeram pesquisa no acervo fotográfico da Polícia Civil do Rio e acharam uma imagem de 1976 na qual há um crânio achado num canteiro de obras no centro do Rio, mas da mesma empresa que fez uma reforma na Base Aérea. A possibilidade é que o corpo tenha sido levado de um local para o outro.

Uma análise cranofacial feito recentemente por uma universidade inglesa, a pedido da comissão, indicou que há uma "clara correspondência morfológica" entre o crânio da imagem e o rosto de Angel.

A comissão ainda não achou a ossada da foto para fazer outros testes.

CONTINUIDADE

Os três casos continuarão a ser investigados. "Esperamos que haja essa continuidade", disse Pedro Dallari. Isso poderá ser feito, por exemplo, pela Comissão da Verdade do Rio, que ainda tem um ano de funcionamento.

"O sentimento é de missão cumprida. Fizemos o que era humanamente possível fazer. Fizemos o que era possível fazer", Jose Paulo Cavalcanti.

CETICISMO

Questionado, Dallari reafirmou que as Forças Armadas não colaboraram com os trabalhos da comissão, e que é cético em relação à versão, dada por militares, de que os documentos foram destruídos.


Endereço da página:

Links no texto: