Folha de S. Paulo


Chamada de 'milícia' por governador, PM vira foco de embate político no CE

Acusações de uso político da Polícia Militar no Ceará jogaram a corporação no centro da disputa eleitoral no Estado.

O governador Cid Gomes (Pros), fiador da campanha de Camilo Santana (PT), diz que um setor da PM age como "milícia organizada" para "fins politiqueiros".

Já um grupo de PMs se diz vítima de retaliação pelo apoio ao deputado estadual eleito capitão Wagner (PR) e a Eunício Oliveira (PMDB), candidato ao governo.

Segundo esse grupo, 14 PMs e seis bombeiros perderam cargos gratificados ou estão respondendo a inquérito interno em razão do apoio.

Eleito com 194 mil votos, maior votação no Ceará para o cargo, Wagner liderou uma greve da PM em 2011 e é desafeto de Cid desde então.

Na véspera do primeiro turno, ele gravou um vídeo conclamando a categoria a ter "tolerância zero" contra crimes de boca de urna.

Ze Rosa/Divulgação
Candidato ao governo do Ceará, Eunício Oliveira (à dir.) participa do evento em livraria
Candidato ao governo do Ceará, Eunício Oliveira (à dir.) participa do evento em livraria

No dia da eleição, a PM fez 59 detenções por suspeitas de crimes eleitorais -48 praticados pela coligação de Camilo, e 11, pela de Eunício.

Um vereador da base de Cid foi detido em Sobral, e reduto político dos Gomes. O governador foi à delegacia e bateu boca com os policiais. Na saída, disse que a detenção era reflexo da "milícia que começa a tomar posse do aparelho de segurança do Ceará".

Cid tem dito que a PM tem um "comando duplo" orquestrado para prejudicar Camilo. Irmão de Cid e secretário da Saúde do Estado, Ciro Gomes (Pros) reiterou a acusação e disse, em referência a supostos maus policiais: "Não vai ficar nenhum".

Wagner negou as acusações da família Gomes. "Apenas gravei vídeo estimulando a polícia a cumprir seu dever. No dia da eleição minha assessora teve o carro revistado e não fiz drama", disse.

Segundo ele, PMs e delegados que apoiam Camilo não sofreram punição. "Isso é perseguição política", disse.

O acirramento levou a Justiça Eleitoral a pedir reforço de tropas federais no Estado no segundo turno, já autorizado para Fortaleza e quatro cidades da região.

Camilo e Eunício estão em empate técnico na preferência do eleitor, segundo o Datafolha: o petista tem 53% e o peemedebista, 47%.

Divulgação - 03.out.14
Camilo Santana (PT) durante campanha no CE, com Cid Gomes (Pros) ao volante
Camilo Santana (PT) durante campanha no CE, com Cid Gomes (Pros) ao volante

A segurança também foi o tema principal de debate entre os candidatos no último domingo (19). Eunício acusou o governo Cid de ter "desintegrado" a polícia, e Camilo disse que não se pode tratar o assunto com "demagogia".

'PERSEGUIÇÃO'

Sob condição de anonimato, o grupo de PMs que aponta perseguição pela gestão Cid diz que o governo agiu para dificultar a fiscalização de crimes eleitorais. Citou mudanças de escala para aquartelar oficiais e uso de tecnologia por satélite para travar veículos que investigavam denúncias de crimes eleitorais.

Eles reconheceram ainda ter montado ações para contornar essas supostas dificuldades. Com carros particulares e à paisana, PMs circularam atrás de atividades suspeitas. Quando detectavam algo, enviavam mensagens por telefone a policiais escalados, que faziam as prisões.

A Secretaria de Segurança Pública negou ter criado obstáculos para a ação da PM na eleição. Disse que a manutenção de carros em pontos integra "estratégia de policiamento" e que há recursos tecnológicos para paralisar os veículos quando esses ultrapassam áreas delimitadas.

Sobre as exonerações, o comando da PM orientou a Folha a procurar a controladoria de disciplina da corporação, que não respondeu.


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