Folha de S. Paulo


Padre vermelho e padre azul colorem disputa eleitoral em Itaquera

Em Itaquera, na zona leste de São Paulo, dois padres ocupam o papel de lideranças comunitárias do bairro, mas têm posições opostas na política: um é próximo ao PT e o outro tem laços históricos com o PSDB.

Ligados a movimentos sociais, Paulo Bezerra e Rosalvino Viñayo são referências em discussões públicas, atraem políticos às suas igrejas e podem influenciar na decisão do eleitorado católico da região.

Há 32 anos no bairro, Paulo Bezerra é o pároco da igreja Nossa Senhora do Carmo, no centro de Itaquera, bairro que possui ao todo mais de 500 mil habitantes. Comprometido com a Teologia da Libertação, Bezerra promove atividades e debates, inclusive durante a novena, maior evento realizado pela paróquia. "Trazemos pessoas influentes para falar de temas da atualidade e, geralmente, polêmicos, durante as celebrações", comenta.

Vinicius Pereira - 2.ago.2013/Folhapress
Padre Paulo Bezerra, da igreja Nossa Senhora do Carmo, em Itaquera
Padre Paulo Bezerra, da igreja Nossa Senhora do Carmo, em Itaquera

Neste ano, em julho, o tema da novena foi uma frase do papa Francisco ("Devemos encaminhar processos mais do que ocupar espaços"). Entre os convidados esteve o filósofo e colunista da Folha Vladimir Safatle, o deputado estadual Adriano Diogo (PT), presidente da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo, e Guilherme Boulos, coordenador do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e colunista da Folha.

A CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) orienta os sacerdotes a não declarar os seus votos aos fiéis.

Mesmo promovendo atos políticos, padre Paulo não acredita que possa influenciar diretamente os eleitores. "Parece-me que, na sua maioria, o povo já tem suas opções. Recebemos todos os candidatos com critérios: visão política mais à esquerda, atuação no bairro, pessoas presentes e apoiadoras das lutas populares", comenta em relação ao interesse dos candidatos em visitar a comunidade.

"Como cidadão ele é livre ao dizer quem apoia, mas acaba sendo uma sugestão para as pessoas escolherem de forma independente", acredita o educador social Alexandre Moreira, 40, que participa da pastoral dos Grupos de Rua, da paróquia Nossa Senhora do Carmo, que reúne até 600 pessoas nas missas aos domingos.

A opção pelos pobres fez com que padre Paulo se tornasse solidário com os que não têm moradia, em uma região na qual o valor dos imóveis aumentou 40% nos últimos anos. O pároco participou da mobilização pela permanência das famílias na ocupação Copa do Povo, realizada perto do Itaquerão durante o Mundial de futebol.

Gustavo Epifanio/Folhapress
Padre Rosalvino Moran Viñayo, na igreja Nossa Senhora Aparecida, em Itaquera
Padre Rosalvino Moran Viñayo, na igreja Nossa Senhora Aparecida, em Itaquera

AMIGOS TUCANOS

Ligado ao governador Mário Covas (1930-2001) durante muitos anos, o padre Rosalvino Viñayo preferiu não atender muitas das solicitações de visita dos candidatos neste ano. Pároco da igreja Nossa Senhora Aparecida, ele é o fundador da Obra Social Dom Bosco, organização social de Itaquera que atende mais de 5.000 pessoas com serviços de assistência social, educação infantil, artística, esportiva e cursos profissionalizantes.

Nascido na Espanha, Rosalvino cresceu em um orfanato administrado por padres, onde encontrou sua vocação religiosa e o interesse em trabalhar com crianças e jovens.

Figura de destaque nas lutas dos movimentos sociais que reivindicavam melhorias para a zona leste nos anos 1980, Rosalvino se aproximou de Covas, com quem estabeleceu uma forte amizade. Após a morte do amigo, então governador, em 2001, manteve boas relações com o sucessor ao cargo, Geraldo Alckmin (PSDB), que busca novo mandato. "O Geraldo é uma figura política, educado, atencioso e religioso também."

Apesar da simpatia por Alckmin, Rosalvino não se considera aliado do PSDB. "O pessoal que acaba confundindo a gente: ah, o padre é tucano! Mas eu não vejo com bons olhos partido político nenhum. Figuras sim, algumas valem a gente dizer para o povo que merece uma chance, vai contribuir."

A técnica administrativa Rossênia Kelly Félix, 34, frequentadora da paróquia, relata que os candidatos pedem autorização a Rosalvino para participar das missas, pedindo que sejam apresentados à comunidade durante o encontro.

"Ele não precisa dos políticos, mas a Dom Bosco precisa de parcerias", diz Rossênia, que acredita que a maioria dos fieis escolhem os candidatos mais próximos de Rosalvino. "O povo apoia os que vêm sempre, participam dos nossos eventos, e não aqueles que só ajudam na eleição."


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