Folha de S. Paulo


TCU rebate ministério sobre Bolsa Família: 'não se conhece a efetividade'

O relator do processo do TCU (Tribunal de Contas da União) sobre os programas de assistência social do governo federal, ministro Augusto Sherman, rebateu nesta quinta-feira as acusações do Ministério do Desenvolvimento Social de que o trabalho do órgão de controle foi "político", "errado" e "preconceituoso" em relação ao Bolsa Família.

Conforme a Folha mostrou na quarta-feira, auditoria do TCU apontou que os programas sociais do governo têm falhas e que a linha que define a pobreza e a extrema pobreza no país estão defasadas, concluindo que o "alívio da pobreza pode estar distorcido no país". O Ministério do Desenvolvimento Social respondeu desqualificando o trabalho.

A presidente Dilma Rousseff tem usado em seus discursos como candidata à reeleição a informação de que tirou 36 milhões de pessoas da pobreza.

Sherman diz que a desatualização do valor que define a linha de pobreza é um dado objetivo já que a correção do número não acompanhou os critérios internacionais. Segundo ele, isso prejudica a avaliação sobre o BolsaFamília.

"A desatualização distorce indicadores do MDS (Ministério do Desenvolvimento Social) que se utilizam desse parâmetro, tais como a 'Taxa de atendimento às famílias pobres' e 'Percentual de famílias atendidas que ultrapassaram a linha de pobreza', e, portanto, prejudicam a transparência do Programa em pontos importantes como os resultados de superação de pobreza", diz o ministro em nota lembrando que não defende mudanças nas regras de entrada do programa.

O ministro do TCU manteve a crítica a outro aspecto do programa, a chamada 'porta de saída', dizendo que a preocupação do tribunal é com a sustentabilidade do Bolsa Família e com um dos seus objetivos, acabar com o "ciclo intergeracional da pobreza" (quando várias gerações de uma mesma família permanecem na pobreza).

"O relatório apontou a ausência de indicadores para esse objetivo [porta de saída], de maneira que não se conhece adequadamente a efetividade das ações governamentais no seu cumprimento", diz o texto.

Sherman relembra os elogios que fez ao programa no próprio relatório, reiterando que o TCU reconhece que essas ações trouxeram benefícios à sociedade e que em nenhum momento se "questionou aumento dos gastos do programa. Ao contrário, foi reconhecido o bom trabalho realizado pelo MDS na ampliação de beneficiários e de valores até 2013, tendo em vista a real necessidade dos beneficiários".

Sherman também negou que a informação sobre quais são os projetos de lei que tramitam no Congresso sobre o tema sejam com viés político, como sugeriu o Ministério do Desenvolvimento Social ao dizer que os projetos selecionados eram do candidato à presidência pelo PSDB, senador Aécio Neves.

MINISTÉRIO

Em resposta a questionamentos específicos da Folha sobre o que considerou no relatório do TCU "político" "errado" ou "preconceituoso", o Ministério do Desenvolvimento Social não respondeu diretamente às perguntas e adotou um tom mais cauteloso para criticar o trabalho do órgão de controle.

O texto informa que o TCU inaugurou uma nova metodologia para analisar o sistema de assistência social do governo e que, por isso, ela apresenta algumas inconsistências que não foram corrigidas pelo TCU "mesmo com considerações enviadas pelo ministério" antes da divulgação do relatório.

A principal reclamação do MDS é que o tribunal não considerou a linha de pobreza instituída oficialmente pelo governo brasileiro em 2011, que adotou como parâmetro um valor internacional de US$ 1,25 por dia per capita. Esse valor, para o ministério, seria na época de R$ 70 considerando uma medida internacional denominada Paridade do Poder de Compra.

O relatório do TCU criticou justamente o fato de que a linha não foi reajustada pela Paridade do Poder de Compra o que a elevaria, hoje, para um valor perto de R$ 100. A elevação feita em maio de 2014 deixou a linha em R$ 77. Com isso, uma família de cinco pessoas em que a renda seja de R$ 400 por mês, por exemplo, não é considerada "extremamente pobre" pelo governo. Para o TCU, ela deveria estar nesta classificação.

Outra crítica do Ministério ao relatório é que sete ações implementadas para melhorar o Bolsa Família entre 2010 e 2014 não foram consideras pelos auditores.

"Os investimentos sustentáveis e responsáveis realizados nos programas sociais ao longos dos últimos anos, com ampliação expressiva dos recursos investidos, voltados a pessoas mais pobres e em algum grau mais vulneráveis, expressam uma decisão de gestão de atendimento aos que mais necessitam", diz o texto reiterando que estudos do Ipea e do Banco Mundial apontaram que o país conseguiu reduzir a extrema pobreza para níveis semelhantes, 3,6% e 3,75%, o que é próximo da meta para 2030 que é deixar este número em 3%.


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