Folha de S. Paulo


Ex-motorista diz que transportou dinheiro para presidente do BB

O ex-motorista do Banco do Brasil Sebastião Ferreira da Silva, 69, disse em depoimento ao Ministério Público Federal que fez diversos pagamentos em dinheiro vivo a mando do presidente da instituição, Aldemir Bendine.

Ferreirinha, como é conhecido, disse que em certa ocasião Bendine, após subir de mãos vazias num prédio na região dos Jardins, em São Paulo, saiu com uma sacola repleta de maços de notas de R$ 100. Segundo ele, a sacola foi entregue depois ao empresário Marcos Fernandes Garms, amigo de Bendine.

A Folha telefonou para a casa do empresário e deixou recado na sexta-feira (29), mas ele não ligou de volta.

O depoimento do motorista, ao qual a Folha teve acesso, gerou a abertura de um procedimento de investigação contra Bendine, em junho, por suspeita de lavagem de dinheiro. É uma etapa preliminar do trabalho do Ministério Público, quando os procuradores buscam provas para embasar um eventual processo.

Nada garante que Bendine venha a ser denunciado por causa das declarações de Ferreirinha. Denúncia anônima com teor semelhante ao depoimento do motorista foi arquivada pelo Ministério Público Estadual de São Paulo e por 11 órgãos do governo federal, incluindo a Comissão de Ética Pública da Presidência.

O presidente do banco nega as acusações, classificadas por ele de absurdas'.

Luiz Carlos Murauskas/Folhapress
O motorista Sebastião Ferreira da Silva, o Ferreirinha, em Guarulhos (SP), onde mora
O motorista Sebastião Ferreira da Silva, o Ferreirinha, em Guarulhos (SP), onde mora

DINHEIRO VIVO

Na quarta-feira, a Folha revelou que Bendine pagou multa de R$ 122 mil ao Fisco para se livrar de questionamentos sobre a evolução de seu patrimônio pessoal. Ele foi autuado por não comprovar a origem de aproximadamente R$ 280 mil informados em sua declaração anual de ajuste do Imposto de Renda.

Bendine entrou no radar da Receita em 2010, após comprar no interior paulista um apartamento avaliado em R$ 200 mil, pago em dinheiro vivo. Como ele pagou o auto de infração, o caso foi arquivado em janeiro deste ano. O procedimento aberto pelo Ministério Público é uma nova frente de investigação.

Bendine afirma que a autuação da Receita ocorreu devido a um erro no preenchimento de sua declaração de Imposto de Renda e que não houve ilegalidade em seu ato. O presidente do BB diz que todas as acusações feitas por seu ex-motorista são mentirosas.

Ferreirinha tem um histórico de anos de serviços prestados ao PT e ao Banco do Brasil. Em 2002, foi contratado para a campanha presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva. No ano seguinte, passou a trabalhar para a Presidência da República em São Paulo, cujo escritório ocupa o terceiro andar de um prédio do BB na avenida Paulista.

O motorista trabalhou para a Presidência até 2007, quando foi desligado do quadro de motoristas após ter se desentendido com a então chefe do gabinete da Presidência Rosemary Noronha, amiga de Lula demitida em 2012 por suspeitas de que fazia tráfico de influência em várias agências do governo.

Nesse período, Ferreirinha dirigiu sobretudo para Gilberto Carvalho, então chefe de gabinete de Lula, hoje chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República no governo Dilma Rousseff (PT).

GESTO

Num gesto para se aproximar do PT, Bendine contratou Ferreirinha em setembro de 2007, quando ainda era vice-presidente do BB. Foram quase seis anos dirigindo para Bendine, até agosto de 2013.

Segundo Bendine, Ferreirinha foi demitido por ter entrado com um processo trabalhista contra a empresa terceirizada pela qual fora contratado. Ferreirinha diz que Bendine queria transferi-lo para uma empresa ligada ao banco. O motorista afirma que não aceitou a proposta e que pediu para ser demitido.

No depoimento, Ferreirinha contou que levava Bendine com frequência a um endereço no bairro dos Jardins, em São Paulo, onde funcionam diversas empresas, entre elas algumas ligadas à rede Record, como uma corretora de seguros e um escritório de advocacia que presta serviços ao grupo que controla a TV do bispo Edir Macedo.

Procurada pela Folha, a Record informou por meio de sua assessoria que não tem nenhum departamento no endereço citado pelo motorista e não se manifesta por outras empresas do grupo.

Num determinado dia, disse Ferreirinha, Bendine voltou desse edifício com uma sacola nas mãos e a depositou atrás do banco do carona. De lá, foram a um outro local em Moema. À noite, por fim, dirigiram-se para a casa do empresário Marcos Garms.

Depois do jantar, disse Ferreirinha em seu depoimento, Bendine pegou a sacola no carro, mas deixou escapar uma das alças. Foi quando Ferreirinha afirma ter visto o dinheiro dentro da sacola.

INFÂNCIA

O presidente do Banco do Brasil e Garms são amigos de infância. Quando está em São Paulo, Bendine costuma circular num Range Rover Evoque, de custo estimado em R$ 180 mil. O automóvel está registrado em nome de uma das empresas das quais Garms é um dos proprietários.

OUTRO LADO

O presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendine, afirmou à reportagem desconhecer o teor do depoimento prestado pelo motorista Sebastião Ferreira da Silva, conhecido como Ferreirinha, ao Ministério Público Federal.

De acordo com Bendine, Silva era um motorista terceirizado, que trabalhava para uma empresa que presta serviços de transporte para a instituição financeira.

Bendine diz que o Banco do Brasil já tentou obter informações sobre o depoimento e mesmo se há um processo em curso no Ministério Público Federal, mas não obteve resposta do órgão.

"Só tenho conhecimento disso [depoimento] porque tenho sido abordado por alguns veículos de imprensa para falar desse depoimento, que tem declarações caluniosas e contraditórias", disse.

O presidente do Banco do Brasil afirma que Silva moveu uma ação trabalhista contra a empresa prestadora de serviço e que, no processo judicial, incluiu o banco como co-réu. Segundo ele, o processo não prosperou, e o motorista foi demitido.

"Parece ser uma pessoa não muito equilibrada emocionalmente", disse.

De acordo com Bendine, denúncia anônima com teor semelhante ao depoimento do motorista foi arquivada pelo Ministério Público Estadual de São Paulo e por 11 órgãos do governo federal.

AGENDA CHEIA

Ele negou que tenha pedido ao motorista para fazer pagamentos em seu nome em valores em dinheiro. Disse ainda desconhecer um dos endereços citados pelo motorista, na rua São Carlos do Pinhal, em São Paulo.

Afirmou que sua agenda como presidente do banco é muito cheia e que, portanto, poderia ter ido ao local em alguma ocasião.

Sobre o empresário Marcos Fernando Garms, o presidente do Banco do Brasil disse que ele é seu amigo há mais de 45 anos. Bendine nega ter entregue dinheiro a ele diante do motorista. "É um absurdo, uma calúnia", afirmou.

Bendine disse que já dirigiu o Range Rover de Garms e considera o ato normal.

"Ele é meu amigo de infância, ando com o carro, passeei com ele em fins de semana. Neste [carro] e em outros. Não vejo problema em fazer um passeio num carro de um amigo", afirmou.

O presidente do Banco do Brasil foi procurado novamente na sexta-feira (29) pela reportagem. Mas ele informou, por meio de sua assessoria, que não tinha mais informações a serem prestadas sobre esse caso.

A Folha telefonou para a casa do empresário Marcos Fernando Garms e deixou recado na sexta-feira (29), mas ele não ligou de volta.

Procurada pela Folha, a Rede Record informou por meio de sua assessoria que não tem nenhum departamento no endereço citado pelo motorista e que não se manifesta por outras empresas do grupo.

Conforme revelou a Folha na última semana, Bendine pagou multa de R$ 122 mil à Receita Federal para se livrar de questionamentos sobre a evolução de seu patrimônio e um apartamento pago com dinheiro vivo em 2010.

Ele disse que sua autuação foi provocada por um erro cometido no preenchimento da declaração de Imposto de Renda. Bendine disse que, ao pagar a multa, houve o reconhecimento do erro, mas não a admissão de qualquer tipo de ilegalidade.


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