Folha de S. Paulo


Programa de Marina abandona meta de Campos para a inflação

A candidata do PSB à Presidência da República, Marina Silva, abandonou uma das principais promessas de campanha de Eduardo Campos na área econômica ao não se comprometer com a redução da meta de inflação em seu programa de governo, lançado nesta sexta-feira (29).

O documento de 242 páginas trata da recuperação do tripé macroeconômico com "metas de inflação críveis e respeitadas sem recorrer ao controle de preços que possam gerar resultados artificiais". Propõe ainda "criar um cronograma de convergência de inflação para o centro da meta atual".

O texto, porém, não apresenta os valores defendidos por Campos, que era o candidato da chapa até morrer em acidente no dia 13. O ex-governador de Pernambuco se comprometia com a meta de 4,5% em 2015 e com sua redução para 3% até 2019, ao final do eventual mandato.

Ao ser perguntada sobre a ausência dos números, Marina passou a palavra para Maurício Rands, coordenador do programa de governo ao lado de Neca Setúbal, que havia reafirmado o compromisso de reduzir a meta de inflação em entrevista à Folha na última semana. Rands disse que "não há pretensão de que o programa tenha todos os detalhes", mas se comprometeu verbalmente com os dados defendidos por Campos.

"O compromisso assumido nesse programa é trazer a inflação para o centro da meta, que é de 4,5%, sinalizando ao longo do governo chegar a uma meta compatível com a necessidade do governo e também com a de outros países do continente, em torno de 3%, como no Chile e na Colômbia".

O trecho que trata da inflação no programa de Marina afirma ainda que o intervalo de dois pontos percentuais a mais ou a menos em torno de 4,5%, como é atualmente, "já é excepcionalmente largo para padrões internacionais".

Interlocutores de Marina dizem que uma das principais divergências entre a ex-senadora e Campos era o estabelecimento de metas específicas para a economia, inclusive na inflação. Enquanto o pernambucano tinha uma espécie de obsessão com esse tipo de dado, a agora candidata costumava dizer que o importante era a qualidade de vida das pessoas e não chegar a números estabelecidos previamente por equipes de economistas.

Os compromissos para a estabilidade econômica também aparecem no programa com a manutenção da taxa de câmbio livre, sem intervenção do Banco Central. Assim como defendia Campos, o programa de Marina se compromete com a independência do BC de forma institucional, com regras acordadas por lei e estabelecimento de mandato fixo para o presidente, além de normas para sua nomeação e a de diretores.

Marina se recusou a dar qualquer indicação de quem seria seu ministro da Fazenda, ao contrário de seu adversário Aécio Neves (PSDB), que nomeou o economista Armínio Fraga para o cargo em um eventual mandato tucano.

"Não há necessidade de nomear ministro da Fazenda antes de ser eleito", afirmou a pessebista. Os economistas Eduardo Gianetti e André Lara Resende são os principais consultores econômicos da campanha de Marina e contribuíram, inclusive, com o programa de governo.

Marina afirmou ainda que a alta das bolsas de valores após pesquisas de intenção de voto que mostram sua vitória sobre a presidente Dilma Rousseff (PT) em um eventual segundo turno é uma "sinalização de credibilidade". "Os investidores percebem nas nossas propostas a credibilidade para que possam voltar a investir".

REFORMAS

O programa de Marina traz a defesa de uma reforma política, com a unificação do calendário geral das eleições, fim da reeleição, mandato de cinco anos e a inscrição de candidaturas avulsas para cargos proporcionais, entre outras medidas.

A reforma agrária, administrativa e tributária, com objetivo de ser aprovada já no primeiro semestre de 2015 e com aplicação fatiada, também aparecem no documento.

A falta de governabilidade de um eventual governo Marina é uma das principais críticas dos adversários. Levanta-se a questão sobre como reformas de base e outras medidas propostas por ela passariam pelo Congresso Nacional sem o apoio da maioria dos parlamentares. Marina diz que irá conversar "com os melhores de cada partido".

"Pretendemos sim conversar com Lula e com Fernando Henrique Cardoso, e pode ter certeza que vai ser mais fácil do que conversar com [José] Sarney e Antônio Carlos Magalhães ou ficar refém do PMDB", declarou a candidata.

Antes da entrevista coletiva a jornalistas, Marina fez um discurso de 40 minutos com algumas críticas à propaganda do governo federal na TV. Segundo ela, o que o PT retrata é "um mundo de faz de conta em que os problemas não existem".

Ex-ministra do Meio Ambiente do governo Lula, de 2003 a 2008, Marina disse que "o que está bom, vamos manter" e "o que está errado, vamos nos esforçar para corrigir".

O programa se compromete ainda com promessas que foram feitas por Campos nos últimos meses, como o passe livre para estudantes nas escolas públicas, a destinação de 10% da receita bruta da União para a Saúde, a ampliação do repasse aos municípios de 23,5% para 25,5% via FPM, a construção de 4 milhões de casas populares, a manutenção de programas como Bolsa Família e Mais Médicos, bandeiras do governo petista, e a educação em tempo integral.

POLÊMICAS

Marina defendeu o Estado laico e disse que o compromisso de sua candidatura é que "os direitos civis das pessoas sejam respeitados tanto para os que creem como para os que não creem". A candidata se comprometeu assim a apoiar projeto de lei que estabelece o casamento gay no Brasil.

Sobre aborto, disse que manterá o que está em lei e afirmou ainda que a legalização da maconha não aparece em seu programa.

Editoria de Arte/Folhapress

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