Folha de S. Paulo


Manifestantes são denunciados antes de perícia em explosivos

O Ministério Público denunciou dois manifestantes acusados de comandar protestos violentos em São Paulo sem que supostos artefatos explosivos que, segundo a polícia, foram achados com eles fossem submetidos à perícia.

Os objetos estão entre as provas relacionadas pela polícia para indiciar Fábio Hideki Harano, 27, e Rafael Marques Lusvarghi, 26, presos durante protesto contra a Copa do Mundo, em 23 de junho.

Mesmo sem a análise que comprovaria o potencial incendiário ou explosivo dos dois artefatos que estariam com Hideki e Lusvarghi, a Justiça aceitou a denúncia do Ministério Público contra eles.

Fabio Braga - 23.jun.2014/Folhapress
Rafael Marques Lusvarghi, preso em ato contra a realização da Copa no Brasil
Rafael Marques Lusvarghi, preso em ato contra a realização da Copa no Brasil

Hideki, que é funcionário da USP, e Lusvarghi, ex-PM, negam que fossem os donos dos artefatos apresentados por policiais civis do Deic (Departamento de Investigações Criminais), que investigou e prendeu a dupla.

Desde segunda-feira (21), eles são considerados réus em processo, por associação criminosa, pela posse de "artefato explosivo ou incendiário, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar", entre outros delitos. A pena de reclusão para a posse de bomba é de três a seis anos.

Os objetos foram enviados ao Instituto de Criminalística. No dia 1º de julho, porém, eles foram devolvidos porque a análise do material deveria ser feita pelo Gate (grupo antibombas da Polícia Militar).

Procurada pela Folha, a Secretaria de Segurança Pública disse na tarde de sexta-feira (25) que a análise do material "está sendo feita", mas não deu prazos de quando deverá ficar pronta.

A Promotoria diz que para a denúncia são necessários apenas indícios (leia abaixo).

De acordo com a denúncia oferecida pelo Ministério Público no último dia 11, os promotores dizem que o objeto encontrado com Lusvarghi se trata de uma "garrafa de iogurte com forte odor de gasolina". Os promotores dizem ser "um artefato caseiro com funcionalidade similar à de um coquetel molotov".

A polícia diz que o agora réu tentava jogar fora o artefato quando foi detido.

Especialistas ouvidos pela Folha dizem que não é comum a utilização de frascos plásticos na confecção de um coquetel molotov, até porque o vasilhame precisa se estilhaçar para que o combustível se espalhe na superfície.

Além disso, seria necessário um "pavio" para a explosão. Isso não foi apreendido.

Desde a prisão dos ativistas, a reportagem questiona se existem fotos dos artefatos, porém, sem resposta.

A Folha teve acesso ao processo e não localizou imagens dos itens apreendidos.

Já com Hideki, na denúncia, o Ministério Público diz ter sido encontrado um "artefato explosivo", sem dar detalhes (tamanho ou formato).

No processo, a polícia trata o mesmo objeto de "artefato incendiário de fabricação rudimentar".

Procurada, a polícia não deu detalhes dos explosivos.

Já o Ministério Público disse, em resposta à Folha, que o item apreendido com Hideki seria do "tamanho de uma cápsula, provavelmente com material combustível em seu interior ". Para a polícia, ambos tinham voz de comando entre manifestantes e deram ordens para depredações e agressões a policiais.

OUTRO LADO

A Secretaria de Segurança Pública disse em nota que "parte do material apreendido com Fábio Hideki Harano" está sendo analisado pelo Gate. O texto não menciona o objeto achado com Lusvarghi.

"As investigações são legais e realizadas sob o controle do Ministério Público e do Poder Judiciário que, em momento algum, se manifestaram contrariamente aos trabalhos", diz a nota.

Os promotores responsáveis pela denúncia disseram à Folha que o laudo pericial poderá ser anexado posteriormente ao processo.

"Os indícios de que o material apreendido em poder dos denunciados era explosivo já são suficientes para o oferecimento e recebimento da denúncia. A prova cabal só é necessária no momento da prolação da sentença pelo juiz", diz nota. O Tribunal de Justiça informou que juízes não comentam processos.


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