Folha de S. Paulo


Barbosa nega pedido de trabalho externo a José Dirceu

O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Joaquim Barbosa, negou na tarde desta sexta-feira (9) o pedido de trabalho externo feito pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu para trabalhar em um escritório de advocacia.

Em sua decisão, Barbosa considerou o pedido "absolutamente contrário aos fins da pena aplicada e às regras que disciplinam a execução penal em nosso ordenamento jurídico". Ele afirmou que a oferta de trabalho em uma empresa privada, como é o caso do escritório de advocacia de José Gerardo Grossi, de Brasília, que ofereceu trabalho ao petista em sua biblioteca, é "incompatível com a execução de uma sentença penal".

O ministro afirmou que a oferta de emprego representou um arranjo entre amigos. "O exercício da advocacia é atividade nobre, revestida de inúmeras prerrogativas. Não se presta a arranjos visivelmente voltados a contornar a necessidade e o dever de observância estrita das leis e das decisões da Justiça", escreveu.

Alex Argozino/Editoria de Arte/Folhapress

Afirmou ainda que "no caso sob exame, é lícito vislumbrar na oferta de trabalho em causa uma mera action de compaisance entre copains [complacência entre amigos]', absolutamente incompatível com uma sentença penal".

Barbosa lembrou ainda que no Brasil os escritórios de advocacia gozam, em princípio, da prerrogativa da inviolabilidade, "que não se harmoniza com o exercício, pelo Estado, da fiscalização do cumprimento da pena. É de indagar: o direito de punir indivíduos definitivamente condenados pela prática de crimes, que é uma prerrogativa típica de Estado, compatibiliza-se com esse inaceitável 'trade-off' entre proprietários de escritórios de advocacia criminal? Harmoniza-se tudo isso com o interesse público, com o direito da sociedade de ver os condenados cumprirem regularmente as penas que lhes foram impostas?"

Segue o ministro: "É nos próprios autos, aliás, que se colhem evidências claras da natureza inapropriada do trabalho proposto ao condenado [Dirceu]. É que o proponente do emprego, por ser advogado, não permanece no interior do escritório durante todo o período de trabalho que deverá ser executado pelo condenado, o que evidentemente inviabiliza a fiscalização do cumprimento das normas, que é da essência do cumprimento de uma sentença criminal."

Barbosa julgou preciso ainda salientar que, "para fins de reeducação, o apenado já vem executando atividade similar dentro do sistema prisional". O ministro invocou ainda o mesmo princípio que aplicou ontem a outros presos do caso do mensalão: o de que é necessário o cumprimento de um sexto da pena para que o detento possa gozar do benefício do trabalho externo.

Condenado no processo do mensalão a 7 anos e 11 meses de prisão, Dirceu está preso desde novembro no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília, e havia solicitado trabalhar no escritório de advocacia de José Gerardo Grossi, com previsão salarial de R$ 2,1 mil.

Por ter a pena inferior a 8 anos, Dirceu tem direito a cumprir pena no regime semiaberto, que é quando o preso sai para trabalhar durante o dia e retorna à noite para a cadeia, desde que autorizado pela Justiça. Contudo, Barbosa justificou que a autorização para o trabalho externo do petista só pode ser solicitada após ele cumprir um sexto da pena, como determina a Lei de Execução Penal.

Ontem, Barbosa utilizou o mesmo argumento para revogar a liberação para trabalhar em uma empresa do ex-deputado Romeu Queiroz e do advogado Rogério Tolentino. Outros oito condenados do mensalão estão na mesma situação e devem ter os trabalhos suspensos.

Segundo o ministro, Dirceu só poderá deixar o presídio para trabalhar em março, quando terá cumprido 1 ano, 3 meses e 25 dias de prisão. Ele afirmou ainda que não é possível conceder o benefício para que o petista trabalhe em um escritório de advocacia porque a fiscalização fica inviabilizada porque "o proponente do emprego, por ser advogado, não permanece no interior do escritório durante todo o período de trabalho que deverá ser executado pelo condenado".

No ano passado, Grossi disse à Folha que é amigo de Dirceu há quase 30 anos e que nunca lhe fez, nem recebeu, pedidos de favor. O presidente do STF disse que Dirceu já realiza medidas de reeducação dentro da Papuda, como tarefas de limpeza do pátio e auxiliando na biblioteca.

"Não há, assim, motivo para autorizar a saída de preso para executar serviços de mesma natureza do que já vem executando atualmente, considerada a finalidade do trabalho do condenado".


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