Folha de S. Paulo


Pressionado, Gim desiste de vaga para ministro do TCU

Condenado pela Justiça por irregularidades na época em que presidiu a Câmara Legislativa do Distrito Federal, o senador Gim Argello (PTB-DF) retirou nesta quarta-feira (9) sua indicação para ocupar o cargo de ministro do TCU (Tribunal de Contas da União). A decisão ocorreu depois de críticas à sua indicação por senadores, servidores do tribunal e pelo próprio presidente do órgão, ministro Augusto Nardes.

Argello já comunicou sua decisão ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Em nota divulgada em seu site, o senador afirma que sua indicação foi usada como "instrumento de disputa política em ano eleitoral", por isso sua opção foi desistir do cargo.

"No momento em que a honrosa indicação do meu nome para o cargo de ministro do Tribunal de Contas da União é usada como instrumento de disputa política em ano eleitoral, entendo que devo abrir mão desta honraria. Agradeço ao governo e às lideranças que me indicaram. Com fé renovada em Deus e com o mesmo desprendimento demonstrado ao longo dos meus vinte anos de vida pública, reafirmo meu compromisso com o povo do Distrito Federal, com a sociedade brasileira, com o Senado da República, com o Partido Trabalhista Brasileiro", afirma Argello na nota.

Pedro Ladeira - 8.abr.2014/Folhapress
O senador Gim Argello (PTB-DF) no plenário da CCJ
O senador Gim Argello (PTB-DF) no plenário da CCJ

O senador diz, ainda, que a sociedade brasileira é testemunha do seu trabalho para "fortalecer o Senado e ajudar na harmonia interna e entre os poderes".

O senador responde a seis inquéritos no STF (Supremo Tribunal Federal) e foi condenado em primeira e segunda instância pela Justiça do Distrito Federal –o que contrasta com a exigência de "reputação ilibada" para o cargo e com a afirmação de que "nunca" houve condenação em "absolutamente nada".

O nome de Argello tinha o apoio da presidente Dilma Rousseff, que negociou sua indicação com o PTB em meio à reforma ministerial divulgada no final de março.

Com a decisão, o Senado terá que indicar outro nome para o TCU. Senadores "independentes" e da oposição apresentaram nesta quarta-feira o nome do técnico Fernando Moutinho para a vaga de ministro do tribunal. Ele é consultor de Orçamento do Senado e foi auditor do TCU entre 1995 e 2006.

Moutinho será sabatinado pela CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado na próxima terça-feira. Se a cúpula da Casa não indicar outro nome para disputar com Moutinho, ele deve ser aprovado pela maioria dos senadores.

Em vídeo gravado na última sexta-feira (4), no próprio gabinete de Gim Argello, o senador pede "tranquilidade" ao presidente da Auditar (União dos Auditores Federais do Controle Externo), Leonel Munhoz. E garante : nunca houve uma condenação.

"Eu respondo a quatro inquéritos. Nunca fui condenado em absolutamente nada. Precisa ter tranquilidade, presidente, não tem nenhuma condenação. Não tem um processo Supremo, tem investigações", diz. "Tenho certeza que vou ganhar", completa.

Ao falar aos auditores que "nunca foi condenado", Gim sabia das condenações na Justiça. Isso porque foi ele que entrou com recurso no STJ (Superior Tribunal de Justiça) em 2012.

Argello disse no vídeo publicado pela Auditar ter uma certidão negativa do TJ-DF. Segundo a assessoria do tribunal, essa certidão não inclui as condenações que estão em fase de recurso, como é o caso de Gim. Só constam os casos em definitivo.

PRESSÃO

O presidente do TCU (Tribunal de Contas da União), Augusto Nardes, afirmou nesta quarta-feira (9) que a condenação em segunda instância de Gim "complica muito" sua situação.

"Isso complica muito a situação dele em termos de poder assumir um cargo no tribunal, porque tem a questão da idoneidade que fica comprometida", disse Nardes, após uma audiência na Câmara dos Deputados.

Nesta quarta, a Auditar apresentou requerimento ao Senado pedindo a suspensão do processo de indicação de Gim Argello. Um dos pontos criticados pela Auditar é justamente a maneira como as indicações são feitas.

O próprio senador trata na reunião como um "segredo" sua indicação. Por isso, mais do que discutir a indicação do senador, a entidade quer o debate sobre novas formas de escolher os ministros do TCU.

"A revisão cuidadosa dos procedimentos é imperativo que se impõe, para que não restem quaisquer dúvidas à sociedade brasileira de que o processo de indicação é capaz de assegurar que os indicados atendam a todos os requisitos constitucionais", diz o requerimento da Auditar.

Argello também é pressionado pelo Sindicato dos Servidores do Poder legislativo e do Tribunal de Contas. Segundo o presidente da entidade, Adriano Campos, o senador não tem condições de assumir o cargo.

"Como sustentar que tem reputação ilibada? Ele não tem condições de assumir o cargo. É concreto: ele foi condenado. Como essa pessoa vai ser fiscal do dinheiro público?", afirmou Campos, que organizou manifestações contra a indicação.

Adriano Campos disse ainda que todos os ministros do TCU receberão os documentos com as condenações de Gim Argello. O nome do senador sofre resistência dentro do próprio TCU.

CONDENAÇÃO

A Folha revelou nesta quarta-feira que o senador foi condenado em primeira e segunda instâncias pela Justiça do Distrito Federal, o que contrasta com a exigência de "reputação ilibada" para o cargo. Argello foi condenado em 2009 pela Quinta Vara da Fazenda Pública do DF por irregularidades na época que presidia a Câmara Legislativa local.

O órgão criou em 2002 quatro cargos comissionados "em moldes artificiais" para, segundo a Justiça, aumentar o salário dos servidores. Os valores foram pagos por quase três anos. O total a ser devolvido ainda será calculado.

A sentença de primeira instância apontou Argello como responsável pela irregularidade. Em 2010 a segunda instância manteve a condenação. "Mantida a responsabilidade do então presidente em razão da lesão operada em desfavor da administração", diz acórdão do Tribunal de Justiça, em decisão unânime.


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