Folha de S. Paulo


Comissão pedirá para afastar delegado apontado como torturador

Luiz Carlos Murauskas/Folhapress
O delegado Dirceu Gravina, que atuou no DOI-Codi, deixa a Câmara paulistana
O delegado Dirceu Gravina, que atuou no DOI-Codi, deixa a Câmara paulistana

A Comissão Municipal da Verdade de São Paulo anunciou nesta terça-feira (25) que pedirá ao governo paulista o afastamento imediato do delegado Dirceu Gravina da Polícia Civil em Presidente Prudente (SP).

O agente público, apontado por militantes de esquerda como autor de torturas durante a ditadura militar, desistiu nesta manhã de prestar depoimento à Comissão Municipal da Verdade de São Paulo.

O delegado da Polícia Civil chegou a ir à sede da Câmara Municipal de São Paulo, mas mudou de ideia quando deparou-se com a imprensa no local. Ele atuou no DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações de Defesa Interna) entre 1971 e 1972. Segundo militantes de esquerda, ele é a verdadeira identidade de um dos chefes da tortura do destacamento militar, cujo codinome era "JC", de "Jesus Cristo".

Em conversa com membros da Comissão da Verdade, acompanhada pela Folha, Dirceu Gravina afirmou que pensou que o convite era na verdade uma convocação e disse que não esperava a presença da imprensa. O agente público negou a prática de torturas e disse ter sido vítima tanto da esquerda como da direita durante a ditadura militar. Segundo militantes de esquerda, "Jesus Cristo" usava cabelos compridos, colares e uma medalha com uma cruz, com a inscrição "JC".

"Jesus Cristo era nome genérico. Eles, da esquerda, que me puseram 'JC', que eu usava um medalhão pirografado na época, que eu era meio hippie e que tinha uma cruz, que era da minha igreja. E que tinha 'JC'. E eles criaram", justificou o delegado da Polícia Civil.

'SADISMO'

A Comissão Municipal da Verdade ouviu nesta terça-feira o depoimento de duas ex-militantes de esquerda que dizem ter sido torturadas em 1971, no DOI-Codi, por "JC". Segundo elas, além de comandar sessões, o agente da ditadura praticava pessoalmente torturas.

Segundo a advogada Rita Sipahi, ex-militante do PRT (Partido Revolucionário dos Trabalhadores), foi "JC" quem a recebeu no DOI-Codi, em maio daquele ano, e era ele quem aplicava choques durante as sessões de torturas. Ela disse ainda que ouviu relato na época de militantes de esquerda que o chefe da tortura chegou a simular uma espécie de "procissão" com presos políticos.

"As pessoas foram colocadas nuas, com velas nas mãos, para cantar a música Jesus Cristo, do Roberto Carlos, como se fosse uma procissão na sede da Oban [Operação Bandeirante]", relatou.

A socióloga Lenira Machado, que também militava PRT, disse que, nos 45 dias que ficou presa no DOI-Codi, foi torturada por "JC" com eletrochoques no chamado "pau de arara". Ela conta que ele tentou também afogá-la, derramando água em seu nariz, e que jogava sal em sua boca, o que lhe causou uma erupção no corpo por causa do salgamento.

"A equipe do 'JC' não se limitava a torturar. O componente de sadismo daquela equipe, de ver o outro sofrer, sempre foi muito forte", afirmou.


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