Folha de S. Paulo


Comício da Central do Brasil selou guinada de Jango à esquerda

A cronologia do golpe militar de 31 de março de 1964 provavelmente teria sido outra sem o Comício da Central do Brasil, no Rio de Janeiro. Realizado há exatos 50 anos, o ato consolidou a guinada à esquerda do então presidente João Goulart -e desatou a contagem regressiva para a derrocada do seu governo.

"O comício da Central significou que Goulart selou a aliança com as esquerdas e com o movimento sindical e que formaria um governo exclusivo das esquerdas", afirma o historiador Jorge Ferreira, da Universidade Federal Fluminense (UFF).

"É a partir daí que as direitas partem para o golpe. O comício é a senha para derrubar o governo", diz.

O dia 13 de março não foi importante apenas pelos discursos inflamados. Horas antes do evento, Jango (1919-76) assinara dois decretos. O primeiro permitia a desapropriação de terras numa faixa de dez quilômetros às margens de rodovias, ferrovias e barragens.

Editoria de Arte/Folhapress

O outro decreto transferia para o governo o controle de cinco refinarias de combustíveis que operavam no país. As medidas foram ressaltadas no comício, que reuniu 82 mil pessoas, segundo estimativa do Instituto Datafolha a partir de fotos da época.

"O povo quer que se amplie a democracia e que se ponha fim aos privilégios de uma minoria; que a propriedade da terra seja acessível a todos", discursou Jango, que propôs uma revisão constitucional.

O ambiente do comício foi tenso. Sem o apoio da polícia do governo da Guanabara, comandado pelo oposicionista Carlos Lacerda, coube ao Exército fazer a segurança. Três tanques e seis metralhadoras foram postados nas imediações do comício. Presente no palanque, o ex-governador paulista José Serra lembra que o sindicalista Oswaldo Pacheco passou todo o comício grudado em Jango para protegê-lo de um eventual atentado a tiro.

Serra discursou como presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE). Prestes a completar 22 anos na época, é o único orador do comício ainda vivo.
"A questão básica do meu discurso era a mobilização antigolpe, que tínhamos de nos mobilizar", disse, em entrevista anteontem à Folha.


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