Folha de S. Paulo


Para ONGs, falta de marco regulatório barra convênios com o governo

A ONG Casa da Arte de Educar, voltada para a área da educação, firmou parcerias com o MEC (Ministério da Educação) por oito anos, auxiliando na implementação de políticas públicas do setor. Desde 2011, porém, os convênios públicos, que representavam 50% do orçamento da entidade, foram interrompidos.

"Fiz convênios por oito anos, de mais de 10 mil tipos, com todas as contas aprovadas, tenho a ficha limpa. Hoje, não estou com nenhum convênio com o governo federal", afirma Sueli Lima, coordenadora da ONG e parte da Rede Folha de Empreendedores Socioambientais.

A situação é confirmada pela assessoria do MEC, que reconhece que a pasta tem firmado menos convênios. Porém, o ministério não respondeu, até a publicação da repotagem, qual seria o motivo para o fim das parcerias.

A descoberta, em 2011, de irregularidades em convênios do ex-ministro Orlando Silva (Esporte), que levaram a sua posterior queda, foi o que determinou, para a diretora-executiva da Associação Brasileira de ONGs (Abong), Vera Masagão, o corte de parcerias do governo com as organizações.

Renato Stockler - 26.set.2010/Na Lata
Sueli Lima, coordenadora da ONG Casa da Arte de Educar
Sueli Lima, coordenadora da ONG Casa da Arte de Educar

"Foi um grande choque. A Dilma, quando se elegeu, prometeu um marco regulatório. [Depois do episódio com Orlando Silva, em 2011] um projeto de lei elaborado por dezenas de servidores públicos e membros da sociedade civil foi engavetado pelo governo", diz a diretora. "Todas as entidades foram punidas por uma situação que aconteceu em um ministério."

Para Vera Masagão, a situação negativa para as entidades poderia ser revertida com a aprovação de uma lei que determinasse regras mais claras e transparência nos convênios com o poder público – o chamado marco regulatório das organizações da sociedade civil. Esse projeto de lei foi aprovado no Senado e enviado à Câmara dos Deputados no final de 2013.

REGULAMENTAÇÃO

O projeto de lei determina que todas as transferências de recursos do poder público às organizações da sociedade civil sejam feitas após seleção em chamada pública. Para participar, é preciso que a entidade tenha pelo menos três anos de existência, não seja dirigida por parente de agentes públicos e que suas contas estejam regulares nos últimos oito anos.

Outro avanço é criar um instrumento jurídico específico para as ONGs. Atualmente, o modelo utilizado é o do convênio, o mesmo sistema utilizado para repasses do governo federal aos Estados e municípios.

"A lógica é diferente, a maioria das regras não se aplica. Tem que haver um termo próprio para as organizações. Isso impede que cada ministério invente sua regra, o que torna a vida das entidades muito difícil", explica a diretora da Abong.

Masagão afirma, porém, que o poder executivo ainda não deu sinais de que apoiará projetos relacionados às ONGs esse ano.

"Apesar de termos segmentos no governo que têm trabalhado para superar essa situação, como a Secretaria-Geral, ministérios, nós não temos do governo e da presidente nenhum sinal de empenho", diz. Para ela, mesmo que a tramitação transcorra sem percalços no legislativo, é preciso que o executivo se manifeste. "Uma atitude imediata, a gente considera importante", afirma a diretora.

Procurada pela Folha, a Casa Civil delegou a responsabilidade de se pronunciar sobre o assunto à Secretaria-Geral da Presidência. Esta, por sua vez, não quis conceder entrevista.


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